A realidade na Rua Congonhas, entre as ruas Leopoldina e Santo Antônio do Monte, no Bairro Santo Antônio, Centro-Sul de Belo Horizonte, é bem diferente da que aparece nas cenas do filme O Menino Maluquinho, de 1995, baseado no livro do cartunista Ziraldo e dirigido por Helvécio RattonQuatro das 12 casas que serviram de cenário para o longa estão abandonadas e viraram ponto para usuários e traficantes de drogas e moradores de rua
A invasão começou há quatro meses e desde então pelo menos 10 imóveis ao lado já foram arrombados e pessoas são assaltadas em plena luz do diaAs casas nos números 487 ao 579 são tombadas pelo patrimônio municipal e foram compradas pela construtora Canopus, que adquiriu outros imóveis no quarteirão para erguer um condomínio residencial de grande porte, preservando apenas as fachadasMoradores e comerciantes estão com medo porque os imóveis não foram isolados e estão sendo depredados
Helvécio Ratton lamenta o abandono das casas“Procurei muito no Santo Antônio, Floresta, Santa Tereza e em outros bairros tradicionais um conjunto de casas para rodar um filme de épocaPintamos cada casa e os passeios de uma corCriamos um ambiente de histórias em quadrinhos e depois voltamos com as cores originaisNaquela época, a gente já percebia que se não houvesse o tombamento todas as casas iriam para o chãoLamento porque Belo Horizonte está cada vez mais perdendo sua memória”, disse o cineasta
Ziraldo espera a revitalização das casas: “Fico honrado em saber que a rua ficou famosa pelo filmeVou ficar muito feliz se a construtora restaurar as fachadas e colocar o Menino Maluquinho nas janelas”.
Ontem à tarde, um casal aparentemente drogado ocupava a casa do número 487, onde funcionava a Boate AndaluzO morador de rua Davidson Lopes Martins arrancava a fiação de cobre e disse ter autorização da antiga dona“Eu dormia na varandaDepois, a polícia estourou a porta para prender um cara que arrombou um carro na rua e correu para dentro da casaVirou refúgio de bandidoGosto de fumar crack, maconha, mas não mexo com ninguém”, afirmou.
Dentro do imóvel há lixo, as janelas foram quebradas e paredes e balcões revestidos com espelhos estão reduzidos a cacosO lugar também serve de banheiro e o mau cheiro incomoda a vizinhançaA casa tem passagem para o imóvel ao lado, número 495, também invadidoNo número 503, onde funcionava uma loja de roupas, as vidraças estão quebradas e é possível observar o luxo do seu interior com piso em madeira e janelões antigos.
“As casas ao lado viraram moradia de mendigos, usuários de drogas, banheiro público
EXPULSOS DO CENTRO
O dono do Caçarola, Jair Alves da Cunha, pôs grades por baixo do telhado para impedir a entrada dos ladrões“É tudo crime encomendadoEles só roubam TVs”, disseO proprietário do Revista Viva, Eduardo Pereira, diz que os problemas começaram depois que prefeitura e PM expulsaram moradores de rua e dependentes de drogas do Centro, há quatro meses“Eles se deslocaram para os bairrosSó que os bairros não têm policiamento e fiscalização como no Centro”, disseParte desses “invasores”, segundo ele, vive em barracas montadas nas ruas Viçosa, Leopoldina e Cristina
Dora Damasceno é dona de academia e afirma que alunos e funcionários são constantemente assaltados“Levam tênis, levam tudoRoubaram dois professores recentementeTambém arrombaram minha academia e levaram a TV”, disse
Síndico de prédio recém-inaugurado, Cléber Moreira aponta insegurança também: “Os viciados ficam fumando crack na porta do prédioHá 15 dias, precisei juntar o lixo na porta da casa em frente e botar fogoO cheiro é insuportávelEntram homens e mulheres o tempo todo na casaEles atacam as pessoas em plena luz do dia para roubar, principalmente mulheres”Com medo, ele vai reforçar a iluminação na entrada do prédio
Cinco carros do 22º Batalhão da PM cercaram a casa número 487 na tarde de ontem, onde prenderam Davidson Lopes Martins por furto de cobre
Segundo o sargento Gilsander, o policiamento na região é rotineiro e todas as denúncias dos moradores são atendidasA diretoria do Patrimônio Cultural de BH e a Construtora Canopus foram procurados pela reportagem e não se manifestaram.