Antero, Paulo, Reinaldo e Geraldo moram em regiões diferentes de Belo Horizonte, mas convivem com o mesmo drama todo período de chuva. Quando as nuvens começam a ficar carregadas, Reinaldo Gonçalves, de 50 anos, dono de uma fábrica de armários na Avenida Cristiano Machado, no Bairro Primeiro de Maio, Região Norte, já fica preocupado com as inundações. “A galeria que passa debaixo da avenida não suporta o volume do Ribeirão Pampulha e a Cristiano Machado vira um mar. Minha loja e a fábrica foram destruídas pela enchente de 23 de novembro de 2010 e tive prejuízo de R$ 75 mil. Em 14 de dezembro de 2011, tudo ficou debaixo d’água de novo”, conta Reinaldo.
Assim como ele, a projetista Nathália Guedes, de 22, que mora na rua de trás, não consegue esquecer a enchente levando tudo da sua casa, em 2010, quando seu pai, que estava doente, foi resgatado pela janela. “Ele morreu logo depois e um dos motivos da sua piora foi essa enchente”, lamenta a projetista. “Era de madrugada. Móveis, geladeira, fogão, vasilhas, mantimentos, tudo foi levado pela correnteza. Ficamos só com a roupa do corpo”, lamentou.
Paulo Matos, de 51, é dono de restaurante em outro extremo da cidade. Trabalhando na Avenida Francisco Sá com Rua Erê, no Prado, Região Oeste, ele diz que há oito anos as inundações têm época marcada. “A água já desce violenta, invade o bar e chega à minha cintura”, reclama. Preocupado, ele instalou uma câmera do lado de fora e, do balcão, vigia o nível da água pelas imagens. “Quando a enxurrada começa a subir, corro e desligo o relógio de energia para as geladeiras não queimarem. Suspendo móveis e mercadorias. Todo ano faço relatório dos prejuízos, mas a prefeitura nunca me paga.”
Uma fotografia de 1977, com toda a família com água pela cintura e o berço do irmão boiando, ainda é guardada por Antero Luiz Reis Mello, de 48, dono de oficina na Rua Joaquim Murtinho com Avenida Prudente de Moraes, no Cidade Jardim, já na Região Centro-Sul. “Nasci neste local e sempre foi assim quando chove”, contou. O pai dele construiu o segundo andar para morar, por causa das inundações, e no térreo fica a oficina, onde já foi outra empresa de Antero que faliu por causa dos prejuízos causados pelas chuvas. Ele colocou válvulas nas saídas de esgoto, para impedir o retorno de resíduos, e os portões da oficina foram projetados para suportar pressão de cinco toneladas, vedados com borracha, pois antes eram arrancados pela força da água e os carros ficavam boiando.
No Ribeiro de Abreu, Região Nordeste, o serralheiro Geraldo de Souza Filho, de 73, também sabe o que é isso. Ele conta que sua oficina fica debaixo d’água sempre que chove e mostra os alicerces da antiga casa, que foi levada pela correnteza do Córrego do Onça. “Isso aqui era a sala”, apontou. A horta nos fundos da moradia está com os dias contatos, segundo ele. Para garantir a cebolinha verde, ele a planta em bacias com terra e as coloca em locais altos. “Tem muito lixo e entulho no córrego. A água não tem passagem e a tendência é só subir”, reclamou. A última enchente arrancou os fardos de pedras envolvidos em telas de arame, que protegem as encostas, e os sacos de areia não resistem à violência da água. O bairro onde o curso d’água causa estragos é outro que será monitorado pela Defesa Civil de Belo Horizonte.