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Estado de Minas

Ex-dirigente do CRM-MG diz que falta de estrutura compromete programa federal

'Esse programa não mudar nada. Vocês vão ver o tanto de denúncias que vão ocorrer em relação a esses médicos'


postado em 02/10/2013 06:00 / atualizado em 02/10/2013 07:29

Médico, 67 anos, Ex-presidente do Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais (CRM-MG)(foto: João Miranda/esp EM/D.A PRESS )
Médico, 67 anos, Ex-presidente do Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais (CRM-MG) (foto: João Miranda/esp EM/D.A PRESS )
“Foi muito difícil renunciar. Nos dias anteriores, minha pressão subiu, tive diarreia, não dormi direito, perdi o apetite, mas vi que não teria alternativa”, diz o pediatra e anestesista João Batista Gomes Soares, de 67 anos. Na segunda-feira, no último dia do mandato, ele abandonou o cargo de presidente do Conselho Regional de Medicina de Minas (CRM-MG). Cerca de uma hora e meia depois, a entidade recebeu intimação judicial para conceder os registros provisórios aos profissionais com diploma estrangeiro do programa Mais Médicos. “Fomos o conselho que mais resistiu”, avalia. Em entrevista ao EM, ele diz que não adianta médicos irem para o interior porque não terão como trabalhar sem estrutura. E arrisca um prognóstico: “Esse programa não mudar nada. Vocês vão ver o tanto de denúncias que vão ocorrer em relação a esses médicos”.


O senhor estava ocupando a Presidência do CRM-MG pela terceira vez. Foi o primeiro a abandonar o cargo desde a criação da entidade. Foi difícil tomar essa decisão?
Foi muito difícil renunciar. Minha pressão subiu, tive diarreia, não dormi direito, perdi o apetite. Mas vi que não teria alternativa. Decidi renunciar na sexta-feira, quando soube que o oficial de Justiça havia ido ao conselho entregar a intimação. Eu não estava lá e, quando me disseram que ele havia ido, pensei: “Bom, correr dele não vou. Assinar a intimação também não. Mas, se eu não assinar, o conselho vai levar multa diária de R$ 10 mil” (penalidade está prevista na decisão que concedeu antecipação de tutela à Advocacia Geral da União).

O senhor recebeu críticas por ter renunciado?

Só recebi mensagens de apoio, mas eu mesmo me critico. Você é eleito para um cargo, renunciar pode ser uma atitude covarde. Agora, a questão é a situação: eu estava espremido no canto do muro, tinha que pular para algum lado. O Judiciário foi muito tendencioso. Os dois processos caíram na mão do mesmo juiz (em agosto, o juiz João Batista Ribeiro havia negado pedido de antecipação de tutela de ação interposta pelo CRM-MG, que pedia o direito de não emitir os registros provisórios). Ele já tinha decidido um caso semelhante, já estava com o ponto de vista formado. E ele não se ateve a analisar a lei. Falou que era corporativismo, elogiou o programa (em sua decisão, o magistrado classificou o Mais Médicos como “política pública de saúde da maior relevância social” e acusou o conselho de “instaurar uma verdadeira batalha” para conseguir “reserva de mercado”). Ele tinha que ter se limitado ao que é legal ou não. Não tem que dizer se é a favor ou contra o programa. Extrapolou a função dele.

Por que o senhor é contrário ao programa?

Conheço o interior de Minas como a palma da minha mão. Na cidade onde não há médico as condições de trabalho são muito precárias. O médico não tem como pedir exames, tem dificuldade para conseguir medicamento, para encaminhar paciente para consulta especializada ou internação. Se não resolver o problema dessa estrutura, não adianta ter médico. Ele vai atender dor de cabeça, diarreia, verminose, só vai atender bobagem. Há pouco dinheiro federal destinado à saúde. Municípios que vivem de pires na mão não dão conta de bancar. O programa deveria estudar a condição de cada cidade e buscar construir uma estrutura de saúde.

Na decisão de agosto, o juiz Ribeiro afirmou que “ser atendido pelo médico intercambista, cuja revalidação do diploma foi dispensada” é melhor do que “continuar sem assistência alguma”. O senhor concorda?
É claro que é melhor. Se não tem ninguém, ter um é bom. Mas o médico poderia fazer muito mais com uma estrutura adequada. Ele vai gerar despesa e não vai render tudo o que pode. Como um carpinteiro vai trabalhar sem uma oficina? É um programa que não muda quase nada. Isso o tempo vai mostrar, os indicadores não vão melhorar. O governo está fazendo uma coisa irresponsável. Esse programa é puramente eleitoreiro, para conseguir votos da população. Não dura três anos. Vocês vão ver o tanto de denúncias que vão ocorrer em relação a esses médicos.


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