Leonardo Augusto
Enviado Especial
Ipatinga e Santana do Paraíso – Uma incômoda herança une em reclamações e preocupação cidadãos e autoridades de pelo menos três municípios mineiros. Santana do Paraíso (Vale do Rio Doce), Sabará (Grande Belo Horizonte) e Juiz de Fora (Zona da Mata) tiveram parte de seus territórios vendida, com autorização das prefeituras, para receber lixo de outras cidades – e na maior parte dos casos sem qualquer contrapartida financeira. Feitas por gestões anteriores, as negociações envolveram, na ponta exportadora de detritos, importantes municípios do estado, como Belo Horizonte, Governador Valadares e Ipatinga, que mandam diariamente milhares de toneladas de resíduos para cidades vizinhas bem menos desenvolvidas e mais pobres.
O acordo feito à época previa apenas que a Vital não cobraria pelo tratamento do lixo da própria cidade. O secretário de Serviços Urbanos, Obras e Meio Ambiente de Santana do Paraíso, Eri Pimenta da Penha, afirma que, caso a negociação para implantação do aterro sanitário na cidade fosse hoje, as condições para chegada da empresa ao município seriam diferentes. “Seria preciso pensar uma forma de ter ganhos mais significativos como compensação”, diz. A área ocupada pelo aterro em Santana é de 144 hectares, o equivalente a aproximadamente 144 campos de futebol.
A atual administração municipal não mantém bom relacionamento com a empresa. Coincidência ou não, na licitação aberta pelo município para coleta de resíduos com caminhões compactadores do lixo na cidade não houve interesse da Vital, que já trabalha também no transporte do lixo de Ipatinga.
MAIS ‘SÓCIOS’
Para a implantação do aterro em Santana do Paraíso, além da licença ambiental era necessária a emissão de documento chamado Certidão de Conformidade. Na época em que a Vital se instalou na cidade, o prefeito era Raimundo Botelho (PR). “A empresa cumpriu todas as obrigações que entraram em nossa negociação. Além do tratamento do lixo municipal, foi acertado ainda o asfaltamento de algumas estradas. Foi a contrapartida que achamos viável”, afirma. O ex-prefeito, no entanto, afirma não saber que o aterro passou a trabalhar também com outras cidades, além de Ipatinga. “Na época em que fechamos o acordo definitivamente não havia esse compromisso”, diz.
A legislação ambiental em Minas não pune cidades que não tenham aterros sanitários e que por isso precisam enviar lixo para outros municípios. Existe apenas a obrigação de realizar adequadamente o descarte, o que, pela legislação atual, não pode mais ser feito em lixões.
Assim como a administração de Santana do Paraíso, moradores da cidade reclamam da atuação da Vital. “Não contratam gente daqui. Sempre trazem de fora”, reclama Natal da Consolação de Souza, de 43 anos, operador de máquina. “Cada cidade tem que tratar o seu lixo”, entende o irmão dele, José da Consolação de Souza, de 40, encanador. Para o estudante Walyson Moreira, de 19, o ideal seria que outro tipo de empresa se instalasse na cidade. “Trouxeram algo que não é muito recomendável.”
O aterro de Santana do Paraíso tem prazo de uso previsto para 25 anos. A conta, no entanto, levava em consideração apenas o lixo produzido em Ipatinga. Hoje, com a soma de outras cinco cidades, chega à unidade o descarte produzido por uma população equivalente a 765.737 habitantes. “Se o aterro esgotar sua capacidade antes do prazo, a empresa terá que dar conta do descarte do lixo de nossa cidade durante os 25 anos do contrato, contados a partir de 2001”, afirma o atual secretário de Planejamento de Ipatinga, Vicente Costa.
Aterros
Sanitários
São locais preparados para receber lixo de casas, indústrias, hospitais e construções. A maioria do material descartável não é reciclável e, por isso, os terrenos têm uma manta subterrânea de proteção, além de contar com um suspiro para liberação de gases. Essas providências reduzem prejuízos ao meio ambiente, mau cheiro, poluição visual e proliferação de animais. O lixo é compactado, enterrado ou depositado em camadas. É uma alternativa para lidar com os problemas causados pelo excesso de descarte, mas uma solução que ainda custa caro para pequenas cidades. Como a meta do governo federal é erradicar os lixões até 2014, prefeituras têm recorrido a consórcios intermunicipais, em que uma cidade recebe os detritos de outras. Junto com a solução, porém, chegam os impactos para o município receptor.