Com a cabeça baixa e sem qualquer expressão no rosto, a mãe que doou o filho de 2 meses a um casal de adolescentes do Rio de Janeiro apareceu ontem em público pela primeira vez depois da sua prisão. Vestida com o uniforme de detenta da Subsecretaria de Administração Prisional (Suap), Renata Soares da Costa, de 19 anos, esteve no Departamento de Operações Especiais (Deoesp) para prestar mais um depoimento à Polícia Civil. Após desvendar o paradeiro da criança, o objetivo da polícia agora é descobrir o motivo que levou Renata a dar o bebê, Arthur Pietro. A depressão pós-parto das duas jovens que negociaram a doação pode ser a chave para a solução do caso, que intriga familiares e investigadores.
A advogada de Renata, Claudineia de Souza Gonçalves de Araújo, disse ontem que sua cliente já revelou a motivação e que está “muito arrependida e desesperada”. Ela não descartou pedir um exame psicológico. A Polícia Civil, no entanto, afirma que o histórico dela não indica distúrbio psicológico, pois ela foi descrita como afetuosa e carinhosa com o bebê. “A investigação mostra que ela deu o filho porque quis”, disse o delegado Vanderson Gomes, chefe do Deoesp.
Um dia depois do reencontro com o filho, Johney Lima Santos Nulhia, de 24, ainda se perguntava o que levou a mulher a tomar a atitude radical. As lágrimas de Renata no fim de semana, quando disse que foi obrigada a entregar a criança a um casal de chineses e a um homem negro perto da rodoviária de BH, foram substituídas pela frieza, segundo o vigilante, que não percebeu alegria ou emoção na jovem ao rever o filho no Deoesp. Ela entrou com a cabeça baixa, amamentou e foi embora sem falar com ninguém.
Apesar da indiferença, Johney acha que ainda há lacunas na história e, por enquanto, não vai abandonar a mulher. “Não posso virar as costas para ela, que pode estar com distúrbio. Não vou julgá-la até porque nem sei o que aconteceu”, disse , com o filho no colo e a aliança de compromisso na mão direita. “É difícil acreditar. O que a polícia disse que ela fez é o oposto do que ela é. Preciso de uma explicação, mas desamparada ela não vai ficar”, completou.
Nenhum familiar disse ter percebido um comportamento anormal em Renata. Vários depoimentos à polícia relatam uma mulher dedicada que daria a própria vida pelo filho. A mãe da jovem, Maria Aparecida Gomes Soares da Costa, chorou ao falar do assunto. Ela lembra que a jovem reclamou algumas vezes de ficar muito tempo sozinha em casa durante a licença-maternidade, mas nada preocupante. “Jamais ia suspeitar de algo assim. Estou chocada, minha filha só pode estar doente. Não é do coração de uma mãe fazer isso. Ela devia ter falado comigo, pedido ajuda. Por que ela fez isso, meu Deus?”, indaga.
Já o pai de Renata, Paulino Ferreira da Costa, disse que ela deve pagar pelo que fez: “Infelizmente, escorregou, tem que pagar pelo fato. É uma coisa que pegou todo mundo de surpresa porque era uma menina responsável, trabalhadora, estudiosa”.
Baseada nesse comportamento, a defesa entrou ontem com pedido de liberdade para a jovem, que foi transferida do Centro de Remanejamento Prisional (Ceresp) Centro-Sul para o Complexo Penitenciário Feminino Estevão Pinto, o que deve facilitar a amamentação. O delegado Wanderson Gomes, chefe do Deoesp, usa esses argumentos para afirmar o contrário: “Pelo histórico, não há indicativo de distúrbio grave emocional. Inclusive, o marido disse que ela era carinhosa com a criança. Mas a defesa pode pedir a perícia”.
Segundo ele, as 97 folhas de e-mails trocados pela mãe com a adolescente que recebeu o menino mostram a clara intenção de Renata em dar o filho. Trechos revelam que ela considerou a decisão “a mais difícil da vida” e que pediu à adolescente para não chamar atenção na rua porque a polícia estava atrás do bebê. Na correspondência, também há provas de que as duas marcaram o encontro na rodoviária e roupas para se identificarem. As negociações começaram em 4 de novembro, quando a mãe demonstrou interesse na doação e criou um e-mail para fazer um contato mais seguro com a interessada.
ADOLESCENTE Para a mãe da adolescente, Ana Roberta Oliveira Gomes, que também mora no Rio, a filha pode ter buscado a criança em Minas por estar com depressão pós-parto. “Ela teve um aborto espontâneo em outubro com seis meses de gravidez, mas queria muito esse filho. O quarto estava arrumado para a criança. Talvez pelo choque emocional ela se envolveu nesse caso”, alega.
Ana Roberta, no entanto, se defende dizendo que não sabia da negociação com Renata, nem do aborto. “Ela mantinha a barriga grande e o namorado dela disse que minha filha tinha dado à luz”, afirmou. Sobre a filha, a mãe disse que a adolescente estava muito chocada.
As investigações apontam que Ana Roberta pagou a corrida do táxi —R$ 1 mil —que trouxe os adolescentes à capital. O delegado Vanderson Gomes disse que a polícia investiga se a menor manipulou o namorado, assim como Renata fez com o Johney, já que terminou o relacionamento de cinco meses assim que recebeu a criança.