Beatriz Coelho idealizou e implantou, nos anos 1970, o Centro de Conservação e Restauração de Bens Culturais Móveis (Cecor), uma unidade da Escola de Belas Artes da UFMG dedicada à pesquisa e à formação de profissionais de conservação e restauração de bens do patrimônio histórico, artístico e cultural do Brasil e do exterior. O Cecor se tornou referência no setor, uma vez que na época de sua criação não havia no país um centro regular de ensino de técnicas de restauração. “O curso atraiu professores e alunos de outros países”, conta Beatriz.
Em 1972, depois de um curso feito na Escola Guignard, Beatriz Lima chegou à Escola de Belas Artes da UFMG indicada por uma de suas professoras, a artista plástica Yara Tupinambá, para ensinar as técnicas de xilogravura. Na sala de aula, José Alberto Nemer, Sandra Bianchi, Geraldo Roberto e outros artistas a caminho da consagração. Três anos depois, Yara assumiu a direção da escola e levou Beatriz como vice. “Um dia, recebi um ofício do então reitor da UFMG Eduardo Cisalpino informando o achado de 13 telas em um depósito no câmpus. Pedia restauração das obras.”
As telas – algumas do pintor Antônio Parreiras – pertenciam à Escola de Música. “Roberto Lacerda, na época diretor do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), enviou um técnico para avaliar as obras. Estavam muito estragadas. Os alunos da Belas Artes não se interessaram muito pelo trabalho, mas eu, Jarbas Juarez e Júlio Espíndola conseguimos restaurá-las. Eu me apaixonei pelo ofício.” As telas voltaram à Escola de Música e em 1977 Beatriz foi convidada a assumir o cargo de diretora da Belas Artes, com a saída de Yara Tupinambá.
O projeto de Beatriz foi então aprovado pela secretaria e pelo Iphan. “Em 1978, montei o curso na Escola de Belas Artes. Vieram alunos e professores de cidades históricas. Como na restauração trabalha-se com produtos químicos, a Escola de Engenharia cuidou dessa parte, inclusive nos ensinando técnicas de proteção.” Mas nem tudo saiu como pretendia. “Projetei o curso para eu aprender a arte da restauração. Mas o Apocalypse perguntou: ‘Quem vai coordenar?’. E essa tarefa coube a mim. Queria ser também aluna e não fui.”
O curso foi idealizado para durar um ano. “Mas começaram a chegar pedidos e gente de outros estados, de outros países. Não havia ensino de restauração em outras universidades. Havia curso para artistas, mas não de restauradores.” O espaço era pequeno: duas salas e um banheiro. Para continuar era preciso ampliá-lo. “Entrei com um projeto no Ministério da Educação.” Beatriz conseguiu aprovar a proposta em 1980 e nasceu o Cecor para dar continuidade ao ensino de restauração e se tornar referência no país e no exterior.
INTERNACIONAL Em 1987, no México, durante curso patrocinado pela Unesco e pelo Instituto Goethe, Beatriz propôs a criação de uma escola internacional de restauração. “E abrimos um curso intensivo de dois meses para a América Latina. E foi só. A Unesco e o Goethe não se interessaram em continuar. Mesmo assim foi ótimo. O curso atraiu professores e especialistas do mundo todo. Uma ótima e proveitosa troca de experiências.” Mas o Cecor sobreviveu para fazer e refazer a história. “Salvamos obras que estavam se perdendo. E ainda a satisfação de passar conhecimento.”
Casada, Beatriz Coelho teve quatro filhos. “Quatro não, cinco. E o Cecor?” Se for por essa linha, são seis. Diante da escultura de ferro que ele mesma fez – aprendeu a arte com Wilde Lacerda –, ela pergunta: “Não vamos falar do Ceib?” O Centro de Estudos da Imaginária Brasileira (Ceib), outra menina dos olhos da professora, foi criado para estimular e favorecer o desenvolvimento de estudos e pesquisas sobre as imagens brasileiras ou as portuguesas conservadas no Brasil.
Promove encontros anuais de pesquisadores da área para apresentação de seus trabalhos, troca de ideias e informações e tratamento de questões específicas relativas ao estudo da imaginária. “Somos 147 associados e já publicamos quatro revistas.” Beatriz tem volumes de trabalhos pesquisados. São reproduções a partir de fotos de registros de detalhes contidos em obras que só um olho crítico e conhecedor pode perceber. E está pronta para divulgá-los. Por tudo isso e em meio às homenagens a Aleijadinho, não há por que negar a cidadania mineira à mestra Beatriz Coelho.