Se uma cidade pode ser considerada a casa de seus habitantes, uma de suas áreas mais nobres, o Centro, funciona como uma sala de visitasMas ser anfitrião não é tarefa fácil, principalmente quando a casa não está em ordemPrestes a receber cerca de 150 mil turistas estrangeiros e outros 230 mil brasileiros para a Copa do Mundo 2014, em junho, Belo Horizonte está com a sala de estar revirada, com desafios que mancham a imagem de uma sede de MundialÉ o que pensam empresários, moradores ou mesmo quem passa pela região, que hoje exibe calçadas esburacadas, pichação por todos os lados, publicidade irregular, falta de banheiros públicos, excesso de camelôs e uma população imensa de moradores de ruaVai dar tempo de colocar tudo em ordem? Cidadãos e entidades ligadas ao comércio acreditam que esse é um jogo perdido.
A rede hoteleira, que conta com 42 estabelecimentos no Hipercentro e tem apostado em novos empreendimentos, mostra desânimo diante de tantos obstáculosPara o presidente da Federação dos Hotéis, Restaurantes e Bares de Minas Gerais (Fhoremg), Paulo Pedrosa, a situação é crítica“Precisamos de um choque de ordem, de muitas mudançasMas não adianta pensar que com tão pouco tempo para a Copa será possível resolver tudo”, avaliaCom experiência de 40 anos trabalhando na área central, ele diz que a região está perigosa“Quem tem coragem de andar por algumas ruas do hipercentro após as 20h?”, desafiaPedrosa critica o aspecto visual da cidade, que, para ele, está suja, confusa e sem fiscalização suficiente para questões como engenhos de publicidade e trânsito
Acreditando não haver tempo hábil para mudar a imagem da cidade, a entidade optou por alertar os visitantes para as armadilhas espalhadas pelas ruas da região centralO representante do setor hoteleiro adianta que a federação vai produzir cartilhas que serão distribuídas a partir de março aos visitantesO material, em português, inglês e espanhol, trará informações turísticas para os hóspedes, mas sobretudo dicas sobre como se locomover pela cidade“Vamos aconselhá-los de que não é prudente sair a pé à noite e dar dicas sobre como evitar serem lesados.”
Basta uma volta por essa frenética região para descobrir a razão de tantas recomendaçõesA equipe do Estado de Minas percorreu ruas e avenidas do Centro para constatar que cenário seria encontrado pelos turistas, caso o Mundial começasse hojeNo coração da cidade, a Praça Sete, por onde passam diariamente cerca de 400 mil pessoas, os problemas se acumulamÉ nas imediações dela que estão aglomerados camelôs disfarçados de artesãos, ocupando o espaço público com artigos industrializadosMoradores de rua se aproveitam da cobertura das estruturas montadas no quarteirão fechado da Rua Carijós, entre Rua São Paulo e Avenida Afonso Pena, para passar dias e noitesPor ali mesmo improvisam seu “banheiro”, denunciando a falta de sanitários públicos que afeta todos que passam pela região
O aposentado Dirceu Arthur Pereira, que vive com a filha Fátima Aparecida Pereira na calçada da Afonso Pena, na esquina da Rua Tamoios, é um dos que usam a calçada como vaso sanitárioFátima conta que ela e o pai estão na rua desde abril, quando foram despejados de um imóvel em Contagem, na Grande BH“Banho tomamos na rodoviária”, diz a mulher
A falta de banheiros gratuitos no Hipercentro não afeta apenas moradores de ruaPassando pelo Viaduto de Santa Tereza na tarde da última quinta-feira, o almoxarife Sebastião Carlos de Almeida admitiu já ter perdido a conta de quantas vezes precisou encontrar um cantinho escondido na escada que liga a estrutura à Avenida dos Andradas“A cidade deveria não só ter os banheiros gratuitos, mas também mantê-los em boas condições de usoSe não tem até hoje, acredito que nada muda para a Copa”, diz.
PASSEIOS
Andar pela região mais movimentada de Belo Horizonte exige também habilidade para driblar as “pedras no caminho”São buracos, desníveis do passeio, pisos táteis quebrados, rampas para cadeirantes inadequadas, lixo colocado fora do horário e muitos objetos largados por quem passaDe carro ou de moto, motoristas encontram trechos de asfalto em más condições e tampas de bueiro e galerias de água e esgoto fora do nível do pavimentoNa Rua Curitiba, ao lado do Mercado Central, um dos pontos turísticos mais visitados de BH, a caixa de uma concessionária de serviços teve a tampa retirada há cerca de duas semanas, de acordo com o comerciante Divaldo Barbosa Viana, dono da banca de revistas vizinha“Está perigosoMas ninguém da empresa veio consertar, nem a prefeitura passou para constatar o problema”, diz
Ainda na Rua Curitiba, desta vez, próximo à Praça da Rodoviária, um buraco de quase 40 centímetros de profundidade também assusta“Qualquer pessoa que passar aqui está sujeita a torcer o pé ou mesmo quebrar a perna”, afirma o empresário Rogério Moisés, de 47 anos, que há mais de 30 trabalha no CentroAssim como ele, a estudante universitária Lana Lara, de 22, que desvia de um buraco na Curitiba, teme que haja apenas uma “maquiagem” para receber os turistas“Não dá mais tempo para resolver tanta coisaCom a cidade como está hoje, BH vai deixar uma péssima impressão para os turistas”, acredita a jovem.
NÚMEROS DA COPA
380 mil
turistas devem visitar BH
durante a Copa do Mundo 2014
(150 mil estrangeiros e 230 mil brasileiros)
42
hotéis já funcionam no Hipercentro
32
novos hotéis estão sendo construídos na capital: seis novos estabelecimentos foram inaugurados; 17 ficam prontos para a Copa e nove até 2015
16 mil
leitos já existem na capital e outros
10 mil estão sendo criados
5 mil
leitos ficam no Hipercentro, número que deve chegar a 6 mil durante a Copa
Fonte: Fundação Getulio Vargas e Prefeitura de Belo Horizonte