Recentemente, o Cine Pathé, construído em 1948 na Savassi, foi alugado por um shopping popular, causando reações entre urbanistas, comunidade e lojistas. A polêmica da preservação do patrimônio histórico de Belo Horizonte ocorreu também há 30 anos, quando a cidade perdia o Cine Teatro Metrópole, que ficava na esquina das ruas da Bahia e Goiás, no Centro, e tinha projeto arquitetônico assinado por Raffaello Berti. Em maio daquele ano, centenas de estudantes, intelectuais e pessoas ligadas à cultura foram às ruas e fizeram a maior manifestação pela arte na capital. Eles questionavam a compra e demolição do cinema, que acabou dando lugar a um banco. O Metrópole ocupou o lugar onde funcionava antes o Theatro Municipal, de 1906. Tinha estilo art déco, que substituiu o eclético do final dos anos 30.
Os vários protestos de 1983 começaram, segundo historiadores, com a aquisição do espaço que pertencia à empresa Cinemas e Teatros Minas Gerais S.A., do empresário Antônio Luciano, pelo Banco Brasileiro de Descontos –Bradesco, em abril, pelo valor de Cr$ 150 milhões. “Naquela época a empresa entrou com pedido de demolição do cinema na Prefeitura de Belo Horizonte e o Conselho Curador do Instituto Estadual de Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha) foi convocado para deliberar sobre o tombamento”, lembra Carlos Henrique Rangel, historiador do instituto e coautor do livro Metrópole: a trajetória de um espaço cultural, com a historiadora Cristina Pereira Nunes.
O interesse dos novos donos em demolir o prédio, somado ao processo de tombamento, que tentava defender a sobrevivência do espaço, culminou nas manifestações. O contexto da época também ajudou: a crise econômica se agravava no país, com desdobramentos como desemprego, queda no comércio e fome. Entre aqueles que defendiam o cine-teatro estavam estudantes da Escola de Arquitetura da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), representantes da Associação Mineira de Defesa do Ambiente (Amda), do Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB), além de intelectuais. Em 17 de maio daquele ano, cerca de 300 pessoas se reuniram em frente ao Cine Metrópole para s
ensibilizar a população sobre a perda do espaço cultural.
No entanto, Rangel lembra que, apesar das tentativas de mostrar à população o que acontecia, poucos aderiram ao movimento. Os grupos estavam sempre munidos com cartazes e abaixo-assinados para alertar os belo-horizontinos. “Não podemos dizer que o povo de Belo Horizonte saiu às ruas. Era um grupo muito claro que estava à frente das manifestações com reivindicações que iam do passe-livre à conservação do espaço”, lembra o historiador. Em resposta aos atos sociais, em 3 de maio de 1983, o Conselho Curador do Iepha, após exame do processo, aprovou por unanimidade o tombamento provisório do Metrópole.
CONFRONTO Mas a aprovação não foi suficiente para que cessassem as manifestações. Poucos dias depois, um novo protesto em favor do prédio ocorrido em frente ao Cine Metrópole pelos estudantes e demais manifestantes acabou com repressão pela polícia. No dia seguinte, os donos do espaço entraram com recurso contra a decisão do Conselho Curador para demoli-lo. Diante do impasse, uma comissão especial foi criada pelo governo para examinar a situação.
Paralelo às reuniões da comissão e à atuação de instituições envolvidas, como a entrega de uma carta aberta à população pelo IAB e outras 23 entidades, obras internas continuaram sendo feitas no Cine Metrópole, descaracterizando o espaço. A ação fez com que Suzy Mello, presidente do Iepha na época, desistisse do tombamento e a comissão especial criada pelo governo aprovou a proposta. No mesmo dia, ela pediu demissão do cargo. A empresa Cinemas e Teatros Minas Gerais S.A. entrou com pedido de alvará para demolição, aprovado em setembro daquele ano.
Mesmo diante da decisão que levaria o prédio ao chão, uma nova vigília contra a demolição do prédio ocorreu na Praça Alberto Deodato, promovida pelos manifestantes. Em 1º de agosto de 1985, quase dois anos depois do início das manifestações em prol do Metrópole, o projeto do edifício-sede do Bradesco obteve a aprovação inicial e alvará de construção.
... Pathé agora é Xavantes
No dia 15, o espaço do antigo Cine Pathé, na Savassi, reabriu suas portas. No lugar de filmes, o imóvel, de propriedade particular, agora exibe produtos e abriga o shopping popular Xavantes Express. A ocupação do espaço histórico causou reação de urbanistas, moradores e lojistas da região. A Prefeitura de Belo Horizonte, no entanto, informou que, apesar do empreendimento, o projeto de devolver o cinema ao lugar está mantido. A Fundação Municipal de Cultura (FMC), em matéria publicada no Estado de Minas, garantiu que as obras começam no primeiro semestre do ano que vem e, até 2015, haverá um complexo cultural com salas de exibição, café e galeria.
LINHA DO TEMPO
1941 – Adaptação do Theatro Municipal para Cine Teatro Metrópole, feito pelo arquiteto Raffaello Berti
1942 – Inauguração do Cine Teatro Metrópole com o filme “Tudo isto e o céu também”
1948 – Construção do Cine Pathé na Avenida Cristóvão Colombo. Foi erguido inicialmente em 1920 na Avenida Afonso Pena
1961 – A atriz americana Janet Leigh visita o Cine Metrópole
1983 – Em maio, o tombamento do Metrópole foi aprovado. Meses depois, empresa pede alvará para demolição
1983 – Em setembro, começa a destruição e moradores fazem vigília pelo cinema
1999 – Cine Pathé deixa de funcionar e se transforma em igreja evangélica
2000 – Prefeitura tomba a fachada e o hall do Cine Pathé