Um misto de curiosidade, indignação e indiferença tomou conta das pessoas que passavam nessa sexta-feira pela esquina das ruas Rua Pernambuco e Inconfidentes, na Região Centro-Sul de Belo Horizonte, ao se depararem com seis pombos no chão e quatro em sopro de vida no alto da marquise. Junto a sacos de lixo, uma caixa de papelão com restos de pão e o suposto veneno. “É chumbinho. Conheço. Colocaram para acabar com os bichinhos. Não está certo”, diz o morador que não quer aparecer. Outra voz rouba a cena: “Essa praga só traz doença!”, diz o barbudo. Um depoimento, senhor? “Não. Obrigado. Não quero problema com esse povo protetor de animais”, esquiva-se. Curiosos se juntam ao movimento polêmico em torno dos corpos das aves na calçada.
Um jovem casal participa do debate. Ainda que sem se entender. Ienio Henrique Miranda Albino, de 22 anos, não acha tão absurdo o extermínio dos pombos. “É uma cena difícil, mas sou a favor porque transmitem doenças”, opina. A namorada, também estudante de engenharia, Ana Carolina Bamberg Brandão, de 21, é contra. “Não concordo de jeito nenhum. Deveriam tomar outra medida… Não essa. levá-los para um novo lugar”, disse. Ienio tenta argumentar, mas não encontra brecha para mudar a opinião de Ana Carolina, que entende ser “um absurdo” o envenenamento dos pombos.
Reinaldo Fraga, de 42, pesquisa no celular e mostra o resultado: “Leptospirose. Veja só a calçada… olha a sujeira que eles fazem. Tem uma escola aqui em frente. Isso é muito nocivo para a saúde de crianças e adultos. Quem fez isso, certamente, estava pensando na saúde das pessoas”, diz. De passagem, a cozinheira Conceição Aparecida Gomes, de 49, discorda. “É uma maldade. Quem fez isso não tem coração. Não tenho palavras. É um absurdo”, lamenta. Para Halsenclair Alves Moreira, de 45, trata-se de grande crueldade. “O bichinho não tem nada a ver com isso. É indefeso. Assim, é sacanagem.”
INDIGNAÇÂO “No Brasil, quando não se dá conta, mata”, brada Maria Beatriz Constantino, dona do imóvel de esquina – onde vivem os pombos. A advogada diz que “os assassinos” estão promovendo o extermínio para atingi-la. “É minha única alegria: cuidar dos animais. Sabem o quanto defendo a natureza, o quanto gosto dos bichos”, diz, transtornada. Para a advogada, o aumento do número de pombos na esquina é porque eles se comunicam e sabem que ali são respeitados e bem tratados por ela. “Há uns 10 anos cuido dos pombos e de uns tempos para cá começaram a envenená-los. Isso é um crime”, lamenta.
Não é a primeira vez que Maria Beatriz lida com esse tipo de absurdo no endereço em que nasceu nos anos 1940. Antes dos pombos, a advogada viu seus gatos, “uma a um”, envenenados por “assassinos”. “Mais de 10. Quase todos mortos dessa forma covarde”, emociona-se. Para a advogada, para entender a violência crescente, basta ver o que o homem tem feito com a natureza. “É por isso…” – aponta os pombos mortos na calçada – “… é por isso que hoje temos tantos criminosos. Tantos bandidos que não dão o menor valor à vida. Quem faz isso com os bichos, faz o mesmo com o semelhante. O homem é o lobo do homem”, diz, parafraseando o filósofo inglês Thomas Hobbes.