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Estado de Minas

Regulamentação da lei que proíbe animais em circo definirá destino de Leão em MG

Circo na cidade de Bonfim aguarda definição para saber o que fazer com Sansão, animal que já está com uma família há sete anos


postado em 01/02/2014 06:00 / atualizado em 01/02/2014 07:49

Sansão, de 7 anos, pesa 300kg e vive em uma jaula, onde come 10kg de carne a cada 48 horas(foto: RAMON LISBOA/EM/D.A PRESS)
Sansão, de 7 anos, pesa 300kg e vive em uma jaula, onde come 10kg de carne a cada 48 horas (foto: RAMON LISBOA/EM/D.A PRESS)

Sansão não sobe ao picadeiro, mas é a principal atração do Circo D’Toros D’La Paz, montado em um antigo campo de futebol no distrito de Santo Antônio da Vargem Alegre, em Bonfim, na Região Central de Minas. Há sete anos, o leão é o xodó da família de Geraldo de Sousa Lima, o Aritana, de 49 anos, que trata o felino como filho e o alimenta com 10 quilos de carne a cada dois dias, além de banho três vezes por dia em época de calor. O “gatinho” de 300 quilos retribui o carinho rolando na jaula de um lado para o outro e põe as patas para cima para receber afagos na barriga. Mas os dias de Sansão no circo podem estar contados.

No dia 17, o governo de Minas sancionou a Lei 4.787/13, que proíbe em todo o estado a manutenção e a apresentação de animais silvestres ou domésticos, nativos ou exóticos, em espetáculos circenses, mas ainda falta regulamentação. Aritana garante que Sansão não participa de nenhuma apresentação no palco, mas pelo fato de ser atração para o público, que tira fotos ao lado da jaula, o animal pode ser apreendido e o circo multado em R$ 26 mil.

Em janeiro de 2010, o prefeito Marcio Lacerda sancionou a Lei 9.830, que tem o mesmo objetivo. Além de ser interditado e perder a licença de funcionamento, o circo que descumprir a lei em BH paga multa de R$ 5 mil por dia de apresentação já realizada com animais, entre outras penalidades.

O projeto de lei original da Assembleia Legislativa é de autoria do deputado Alencar da Silveira Jr. (PDT). “A gente entende que alguns animais são bem cuidados, mas muitos são maltratados. Recebemos vários vídeos na Assembleia mostrando a crueldade com esses bichos . Nada melhor do que fazer uma lei que os preserve.”, disse o parlamentar.

Antes, a proibição a que se referia o projeto de lei não se aplicava a eventos sem fins lucrativos, de natureza científica, educacional ou protecional, bem como a rodeios e exposições agropecuárias ou a eventos voltados para a comercialização de animais, desde que estivessem mantidos em condições adequadas de bem-estar. No entanto, um substitutivo retirou essa exceção e determinou a proibição dos animais exclusivamente nos circos, especificando que a proibição está relacionada aos silvestres ou domésticos, nativos ou exóticos. Minas é o décimo estado a proibir animais em circos (os outros são Alagoas, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Rio de Janeiro, São Paulo, Rio Grande do Sul, Mato Grosso do Sul e Espírito Santo).

A grande dúvida da comunidade circense é o destino dos animais apreendidos. No caso de Sansão, a lei não esclarece se um leão pode ser considerado animal de estimação. Dono de circo pode ter cães, gatos ou outro animal doméstico, desde que eles não façam apresentação para a plateia. A fiscalização nos circos e o destino dos animais apreendidos ainda serão definidos com a regulamentação da lei. “Todos acreditam que os animais serão sacrificados em matadouros das prefeituras”, disse a coordenadora da Rede de Apoio ao Circo e diretora do Departamento do Circo Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculo de Diversões (Sated), Sula Kyriacos Mavrudis, de 56, representante do Conselho Estadual de Política Cultural. “Pelo que a gente já tomou conhecimento, eles usam eletrochoques em algumas prefeituras”, alerta. “Provavelmente, não tem nenhum zoológico com equipamento disponível para adotar mais um animal. A adoção de animais por zoológico é feita somente quando se precisa de um animal e deve ter uma dotação orçamentária para arcar com os custos”, disse Sula.

Em Minas, são 70 circos cadastrados na rede, que é um braço do sindicato. “Muitas famílias circenses nos telefonam para pedir orientação quando têm problemas com prefeituras que não deixam o circo entrar na cidade. Em Minas, segundo ela, há mais circos do que na maioria dos estados brasileiros. São 853 cidades próximas umas das outras. A viagem é curta. As despesas com viagens estão entre as que mais oneraram os circos”, disse Sula.

Segundo ela, os circos são sucesso em Minas desde 1800 e foram responsáveis por todos conhecerem animais exóticos: “Quem é que pode conhecer um elefante, um leão ou rinoceronte no interior? Não é toda cidade que tem um zoológico”. Ela alega que são poucos circos com animais exóticos em Minas. “Se os têm, são de estimação”, garante. Ela reclama de perseguição das ONGs de proteção aos animais e afirma que muitos bichos foram tomados. “A gente tem notado que todos os animais apreendidos de circos, como elefantes, morreram. Começam a sofrer com o medo, depressão, a dieta é outra, perdem a referência do habitat. Ele não vê mais o tratador. Muitos nunca tinham ficado no sereno e morreram de pneumonia”, alega.

Desde 2003, projeto de autoria do senador Alvaro Dias (PSDB-PR) tramita no Congresso Nacional definindo a regulamentação da atividade circense e reconhecendo-a como patrimônio cultural e imaterial brasileiro. “O circo quer e teria pedido se tivesse sido chamado para as audiências na Assembleia Legislativa a regulamentação da atividade. Já existem leis que protegem os animais. Qualquer pessoa que maltrata animais já tem as penas definidas por lei, mas não há lei específica para o circo”, diz Sula.


O QUE DIZ A LEI

A Lei 4.787/13, que entrou em vigor em 17 de janeiro, determina: “Ficam proibidas no território do estado a apresentação, a manutenção e a utilização de animais silvestres ou domésticos, nativos ou exóticos, em espetáculos circenses. O descumprimento do disposto nesta lei sujeita o infrator às penalidades de multa de R$ 26 mil A destinação e a guarda dos animais a que se refere serão definidas em regulamento”.


Lei define três tipos de animais

A Lei 4.787/13 ainda não foi regulamentada pelo estado, mas a fiscalização e o destino dos animais aprendidos em circos já estão definidos. “Os domésticos são de competência municipal, os silvestres nativos do estado e os exóticos da União, por meio do Ibama”, adianta o superintendente de fiscalização da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), Marcelo da Fonseca. “São três tipos de animais (domésticos, exóticos e nativos) e três níveis de competência, segundo a Lei Federal Complementar 140, criada antes da Lei Geral de Fauna de Minas”, explicou Fonseca. Como a nova é iniciativa da Assembleia Legislativa, e do Executivo, o estado ainda analisará o assunto para fazer a regulamentação. “Paralelamente, estamos fazendo a elaboração do projeto de lei da fauna do estado. A regulamentação deve ser de forma conjunta”, disse.

Ao interpretar a nova lei “ao pé da letra”, segundo Fonseca, donos de circo não poderiam ter nenhum tipo de animal, mesmo de estimação. “É preciso regulamentar para ver como tratar esses animais”, disse. Outra dúvida é se animais de circos de outros estados poderão entrar em Minas, ou se haverá uma regra específica para essa situação. Marcelo esclarece que, por não ser matéria proposta pelo estado, hipóteses estão sendo levantadas para definir tecnicamente qual é o melhor encaminhamento. Ele entende que o leão do Circo D’Toros D’La Paz é explorado, por haver o benefício da atração de público por sua causa, e Sansão pode ser apreendido.

MAUS-TRATOS “O próprio aprisionamento de animais domésticos e silvestres já caracteriza maus-tratos”, considera o coordenador da ONG Núcleo Fauna de Defesa Animal, Franklin Oliveira. “Sou favorável à retirada dos animais do circo. Inclusive, fizemos lobby junto ao governador para sancionar a lei”, disse. Segundo ele, os animais são retirados do seu habitat e condicionados a realizar acrobacias, longe da natureza. “Esses treinamentos são feitos com estímulo de dor, o que é crime. Felizmente, a maioria das cidades do Brasil trabalha pela proibição dos animais em circos”, afirmou. A ONG, segundo ele, tem conhecimento de que nove circos do interior de Minas mantêm animais exóticos para exibição, como leões, macacos, chimpanzé e animais domésticos. “A gente espera uma fiscalização intensiva nesses locais”, disse.

Franklin também está preocupado com os animais apreendidos, pois a nova lei estadual não trata a destinação. “O problema é conseguir zoológico e criadouro. Leões, por exemplo, as autoridades vão ter que se esforçar muito para encaminhá-los, pois não há locais aptos para recebê-los.” Ele considera que Sansão não está vivendo em seu espaço natural e adiantou que vai recorrer ao Ministério Público se o poder público não tomar providências. “Ele vive numa cela de 2,5 metros quadrados. Circo nenhum tem condições de cumprir a obrigação da lei, principalmente quando se trata de animais exóticos. Eles devem ser mantidos em um recinto que reproduza ao mínimo que seja as condições deles no espaço natural, assim como no zoológico de BH, que tem a ambientação”, disse.

O superintendente substituto do Ibama em Minas, Luiz Benatti, informou que para cada tipo de animal apreendido há uma logística. Animais exóticos, como leão, segundo ele, são levados para zoológicos que têm disponibilidade e condições de manter o animal, pois os custos são altos.


CAMPANHA

O Ministério Público lançou ontem uma campanha educativa de defesa dos animais. São vídeos e peças de áudio que serão veiculadas em rádios e TVs em Minas. Será distribuída uma cartilha em formato de quadrinhos a todos os infratores durante as audiências dos processos de crimes contra animais. O objetivo é alertar para o tráfico de animais, já que 90% dos capturados na natureza morrem. Outra iniciativa do MP será um concurso para alunos da rede estadual com o tema “Os animais merecem um tratamento ético”.


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