No fim de outubro do ano passado, autoridades de Belo Horizonte, Nova Lima e do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) prometeram um convênio para acabar com os bota-foras às margens da BR-040. Mais de três meses depois, os cerca de 100 pontos de descarte clandestino na faixa de domínio da rodovia federal entre Belo Horizonte e o trevo do Condomínio Alphaville, em Nova Lima, na Grande BH, não apenas continuam abarrotados de entulho, como se multiplicaram. A falta de providências do poder público para acabar com o problema abriu espaço para que os arredores da alça de Nova Lima, que liga a BR-356 à MG-030, também receba restos de escavações, de mineração, da construção civil, entre outros materiais que deveriam estar em depósito apropriado.
O trecho está no limite entre BH e Nova Lima e é margeado pela alça e também pela continuação da Avenida Luiz Paulo Franco, no Bairro Belvedere, Centro-Sul de BH, que vai até a MG-030, a pouco metros do BH Shopping. Do alto do prédio em que mora no Belvedere, a advogada Maria Terezinha Mourão Mafra, de 43, acompanhou a transformação de um trecho recém-reformado em um ponto de descarte de entulho. Ela conta que em 12 de abril do ano passado, quando foi a inaugurada a trincheira possibilitando o acesso direto da MG-030 para a BR-356 no sentido Savassi, o terreno estava limpo. “De lá para cá, caminhões começaram a despejar material no local”, diz ela.
Inicialmente, a situação não despertou tanta atenção da vizinhança, já que os terrenos hoje repletos de entulho serviam de canteiro de obras para as intervenções da trincheira. “Pensávamos que poderia ser alguma coisa ainda relacionada à obra. Mas os descartes ficaram mais frequentes a partir do segundo semestre do ano passado”, acrescenta Terezinha. Ela conta que em janeiro testemunhou caminhões despejando rejeitos no local.
Do alto é possível observar montanhas de terra e de entulho que contrastam com a vista da área verde entre Nova Lima e Belo Horizonte. São duas áreas de bota-fora clandestino, uma de cada lado da alça. Na primeira, em meio ao entulho vive Carlos Alberto Carvalho Alcântara, de 43. Ele diz que invadiu o local há 18 anos e que pretende reivindicar a propriedade definitiva por usucapião. “Hoje não deixo jogar mais nada aqui. Mas muitas empresas costumavam descarregar e ir embora. Por isso ficou desse jeito”, diz ele. A aparência da maioria dos montes já sedimentados indica que os restos podem ser originários da mineração.
Já na BR-040, a situação chama a atenção principalmente no km 546, em Nova Lima. Diferentemente do que ocorre na rodovia até a entrada do Alphaville, em que se multiplicam pontos com pequenos descartes, no local a situação é mais grave. A sinalização da rodovia é bem clara: “Área de proteção ambiental”. Mesmo assim, os rejeitos de mineração e outros tipos de entulho invadem a área paralela à rodovia criando um grande bota-fora. Pouco adiante, a marginal já começa a ser obstruída pelo material descartado clandestinamente. O fotógrafo Gustavo Lovalho, de 37, que sempre passa por áreas de descarte na região, chama a atenção sobre a possibilidade de acidentes na rodovia. “O entulho que está tomando a pista pode causar problemas até para a circulação”, diz ele.
Vice-prefeito e secretário municipal de Meio Ambiente da capital, Délio Malheiros admite que não houve evolução nas negociações para assinatura de convênio para enfrentar o problema, e que isso permitiu que o transtorno aumentasse. “A Prefeitura de Nova Lima ficou de conseguir um terreno para receber o descarte de material, mas até hoje não evoluímos”, afirmou. Ele acrescentou que, com o leilão da
BR-040 entre Brasília e Juiz de Fora, a empresa que arrematou a rodovia será a responsável pela solução do problema. A previsão é de que o contrato de concessão seja assinado em 20 de março. Em relação aos terrenos que estão recebendo entulho no encontro da MG-030 com a Avenida Luiz Paulo Franco, Malheiros prometeu ir hoje até o local. “Vamos ver exatamente em que área está o descarte e providenciar a limpeza, caso o entulho esteja no território de Belo Horizonte”, afirmou.
Por meio de nota, a Prefeitura de Nova Lima informou que o problema é de difícil solução, pelo tamanho do município (400 quilômetros quadrados) e pelo fato de envolver áreas sob responsabilidade também do estado e da União. Na terça-feira, ficou definido que o município vai implantar um plano emergencial para coibir os bota-foras nas proximidades da 040, com sinalização, blitzes e câmeras de monitoramento. Porém, não foi apresentado prazo para nenhuma das ações.
Para o assessor de comunicação da Polícia Rodoviária Federal (PRF) em Minas Gerais, inspetor Aristides Júnior, é muito difícil flagrar os despejos, pois as empresas se aproveitam de momentos em que as viaturas estão empenhadas. “Temos dificuldades de pegá-los, devido às outras atribuições da PRF”, afirmou. Quando são flagrados, segundo o inspetor, os caminhoneiros são levados à delegacia, onde é lavrado um boletim de ocorrência por crime ambiental.
Há três meses, o então superintendente-adjunto do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes em Minas Gerais (Dnit), Alexandre Oliveira, disse que agir contra crimes ambientais não é função exclusiva do Dnit. Na época eram 15 agentes para 500 quilômetros de estradas apenas na Grande BH. Ontem o Estado de Minas voltou a procurar a autarquia para se pronunciar sobre o assunto, mas não houve resposta.
O que diz a lei
A legislação municipal de Belo Horizonte prevê multas de até R$ 4.303,45 para quem descarta resíduos de forma inadequada. Se causar dano ao meio ambiente, a prática é considerada crime ambiental, conforme a Lei Federal 9.605, de 12 de fevereiro de 1998. Nesse caso, a ação é investigada pela Polícia Civil. Na norma federal estão previstas sanções penais e administrativas, que variam conforme o entendimento das autoridades para cada caso. O município de Nova Lima não tem legislação que trate do descarte ilegal de entulho.