Os moradores de Itamonte, a pequena cidade no Sul de Minas palco do tiroteio entre policiais e ladrões de banco que culminou com a morte de nove criminosos, tão cedo não vão esquecer os momentos de tensão e medo que viveram na madrugada de ontem. A costureira Cecília Fernandes, de 58 anos, que mora a apenas 10 metros da Praça Padre Francisco Mira, um dos cenários da troca de tiros entre assaltantes e policiais, estava sozinha em casa na hora do confronto e ficou apavorada com o que aconteceu. Um dos bandidos em fuga pulou o muro vizinho e se escondeu no fundo do lote dela até ser encontrado e preso pela polícia. “Graças a Deus não tentou entrar aqui em casa. Teve gente me ligando hoje achando que eu tinha sido refém”, contou.
Veja fotos do confronto entre polícia e bandidos
Ela relata que um helicóptero ficou durante todo o dia rondando a cidade em busca de foragidos e que muitos policiais estavam nas ruas. “Aqui era uma cidade pacata. Depois do primeiro assalto, no fim do ano passado, escureceu eu fecho tudo. Tenho medo”, conta.
Uma funcionária de um comércio local, de 31, que preferiu não se identificar, disse que ouviu os tiros da sua casa, no Bairro Berta, próximo ao Centro da cidade. “Ficamos apavorados. Não sabíamos como agir. A única coisa que pude fazer foi ligar o computador e procurar por notícias do que estava acontecendo”, conta. Ela diz que conhecia um dos assaltantes, que trabalhava na cidade e que acabou morto no tiroteiro, e tem medo de outros conhecidos estarem envolvidos no esquema. “Itamonte era um município calmo. Há pouco tempo estouraram uma agência e agora teve isso de novo”, reclamou
O motoboy Norival Leite, de 36, que mora no Bairro Coqueiros, na saída de Itamonte, a três quilômetros da praça onde ocorreu o tiroteio, disse que acordou com os tiros e a movimentação policial. “Inicialmente pensei que se tratava de uma briga de rua, quando ouvi alguém gritando por socorro. Mas logo percebi que era algo maior. Os policiais atravessaram um caminhão na BR-354, perto de minha casa, para impedir a fuga dos criminosos. Foi uma madrugada agitada, não deu para dormir. Quando vi as viaturas perto de casa, corri para saber do que se tratava”, contou.
Lugar tranquilo
Com cerca de 13 mil habitantes, localizada no Sul de Minas, próxima às divisas com São Paulo e Rio de Janeiro, Itamonte é uma cidade tranquila, conhecida por fazer parte do Circuito das Águas, a poucos quilômetros das estâncias hidrominerais de São Lourenço e Caxambu. Uma rampa para prática de voo livre e parapente também atrai um bom número de visitantes à cidade.
Memória
Confrontos com o novo cangaço
O tiroteio na madrugada de ontem em Itamonte, no Sul de Minas, que resultou na morte de nove assaltantes, foi o confronto mais violento entre policiais e criminosos já registrado em Minas Gerais, mas há outros precedentes. Em 9 de janeiro de 2007, em São Gotardo, no Alto Paranaíba, o cabo da PM Wandeck Costa da Silva, de 32 anos, morreu em um tiroteio com ladrões que haviam assaltado duas agências bancárias na cidade.
O grupo de assaltantes, formado por pelo menos 15 homens fortemente armados, invadiu as agências do Banco do Brasil e do Itaú, fez pelo menos 20 reféns e trocou tiros com os militares. Além do cabo Wandeck, dois policiais foram feridos e conseguiram se recuperar. O bando fugiu depois de dominar os policiais e usar os militares como escudos humanos.
Dois dias antes, as cidades de Tiros e Brasilândia já haviam sido atacadas por grupos armados, mas nesses dois municípios não houve confronto entre ladrões e policiais. As operações para prender os autores dos assaltos foram em vão, apesar da mobilização de um grande efetivo da PM e da Polícia Civil.
Quase um mês depois, em 6 de fevereiro, usando tática muito semelhante, bandidos assaltaram agências bancárias em São Romão e Riachinho, no Norte de Minas, e foram perseguidos pela Polícia Militar por um mês, sem resultado. Durante a fuga, os criminosos sequestraram quatro moradores locais, que foram usados como reféns, e se esconderam na zona rural da região. A PM montou uma base de operações em Bonfinópolis, com cerca de 300 militares, mas não conseguiu capturar os assaltantes.
Para localizar e capturar os criminosos, a Polícia Civil montou a Operação Wandeck, nome em homenagem ao cabo morto em São Gotardo.
A forma de atuação dos criminosos, sempre atacando em grupos numerosos, passou a ser chamada de "novo cangaço", numa referência direta aos bandos de cangaceiros que agiram no Nordeste do Brasil no fim do século 19 e nas primeiras décadas do século 20, atacando e saqueando as cidades da região. .