Jornal Estado de Minas

Hoje é dia da prova de fogo para o BRT

Sistema opera em dia útil com desafio de evitar problemas da estreia e provar agilidade na área central. Ontem, além de falhas como sinalização incompleta e portas de estações abertas, pedestres e motoristas invadiram locais de ônibus

Jorge Macedo - especial para o EM

Flávia Ayer
- Foto: Gladyston Rodrigues/EM DA Press


Em ritmo mais leve no fim de semana, a operação do BRT/Move, sistema de transporte rápido por ônibus de Belo Horizonte, terá hoje sua grande prova de fogo. Ainda com problemas pendentes do sábado e domingo, como portas de estações enguiçadas e sinalização falha, o sistema receberá nesta segunda-feira cerca de 30 mil passageiros. O número é o dobro do primeiro dia de circulação. Além do público maior e ajustes sem solução, a lista de desafios inclui o conflito com pedestres na pista exclusiva e, principalmente, o trânsito que os ônibus articulados enfrentarão no hipercentro, área hospitalar e Savassi, trechos em que dividem espaço com outros veículos.

Ontem, o BRT/Move circulou com apenas uma das três linhas, a 83P, que vai da Estação São Gabriel, na Região Nordeste, parando em oito pontos ao longo do caminho até a área central. Eram poucos passageiros e bastante agilidade – a viagem levou apenas 18 minutos da Avenida Santos Dumont ao São Gabriel. Mesmo assim, problemas registrados na estreia, sábado, persistiam. Na Estação São Gabriel, um dos gargalos do primeiro dia de operação, a sinalização das novas e antigas linhas de ônibus atendidas pelo terminal não sofreu qualquer alteração.

Apresentada como uma das inovações do sistema, os monitores que anunciam os horários de chegada dentro e fora dos coletivos também estavam sem funcionar. Os sensores das portas de algumas estações continuavam com defeito e precisavam ficar constantemente abertas.
Risco para os passageiros que preferiam esperar pelos articulados no vão situado fora entre a plataforma e a pista exclusiva do BRT/Move. Além dos bons modos dos passageiros, o BRT/Move precisa ainda conquistar o respeito dos motoristas. Ontem, um condutor invadiu a pista exclusiva na Avenida Paraná. Agentes da BHTrans abordaram o motorista e o orientaram a sair do local. A reportagem do EM tentou se aproximar do condutor, mas ele acelerou e se afastou.

O perigo de atropelamentos também já se anuncia, com pessoas atravessando a Avenida Cristiano Machado fora das passarelas. No Centro, os pedestres volta e meia estão na pista exclusiva. O tumulto tende a se agravar hoje, com maior número de pessoas circulando. A falta de sinalização também contribui para o perigo. Um dos passageiros que saía da estação Silviano Brandão errou o caminho e precisou ser socorrido no meio da pista exclusiva do novo sistema. O motorista do ônibus articulado pisou no freio para evitar o acidente. Perto da Rua Carijós, um cadeirante se arriscou na faixa exclusiva de ônibus.

O aposentado João Renato Moreira, de 64 anos, usou ontem pela primeira vez o BRT/Move e está certo de que hoje o sistema terá seu grande teste. “Estou achando muito bom, mas quero ver como vai ser em horário de pico, cheio de cruzamento e sem pista exclusiva”, diz o passageiro, que espera reduzir bastante as duas horas gastas no percurso entre sua casa, no Bairro Floramar, na Região Norte, e o Centro.


Curtindo o passeio de BRT com o filho Bernardo, de 3, o encarregado de departamento pessoal Bruno Souza, de 25, acha que o tamanho dos ônibus articulados, com 18, 6 metros, será um entrave. “Pelo tamanho do ônibus, eles vão agarrar”, diz. Mesmo com desconfiança, ele está disposto a seguir viagem com o novo transporte. “Vou ir para o trabalho de BRT esta semana. Vamos esperar para ver se vai dar certo ou se vai ficar cheio como o metrô quando as linhas (convencionais) forem extintas”, afirma.

- Foto: ARTE EM

Urgência

Algumas das falhas observadas nos dois primeiros dias de operação poderão ser corrigidas aos poucos, como o funcionamento dos monitores com os horários de chegada dos ônibus, mas outras reclamam soluções urgentes, na avaliação do consultor em transporte e trânsito Silvestre de Andrade Puty Filho. Um dos problemas mais graves é o risco de atropelamento de pedestres. “Em alguns locais, é necessário que haja agentes da BHTrans, guardas municipais ou policiais militares alertando os pedestres, orientando-os a utilizar passarelas ou faixas, pelo menos até eles se habituarem ao novo movimento”, recomenda. Outra providência imediata é o ajuste das portas das estações de transferência.

Para o especialista, com os veículos enfrentando o trânsito dos dias úteis, será possível ter uma ideia da eficácia do serviço, mas uma avaliação definitiva só será possível três meses após todo o sistema começar a funcionar. “Quando os ônibus entram no tráfego, perdem o diferencial, mas acredito que o ganho no corredor será expressivo”, avalia. A BHTrans informou que reforçará a sinalização na São Gabriel, as bilheterias, as equipes que orientam passageiros e o grupo de agentes.
A empresa informou que retirou placa que atrapalhava manobra de ônibus da Avenida Getulio Vargas para a Rua Professor Morais, como mostrou ontem o EM.

Passageiros fazem ‘turismo’


Dia de passeio em família no primeiro domingo de operação comercial do BRT/Move do corredor da Cristiano Machado, que ganhou status de mais novo ponto turístico da capital. De bermudas, máquinas fotográficas e bastante entusiasmo, a turma que andou ontem no novo sistema de transporte estava mais para turista do que passageiro. A manhã de sol foi dedicada a conhecer as estações e curtir o trajeto da linha 83P, a única em circulação no domingo, que vai da Estação São Gabriel, na Região Nordeste, parando ao longo de oito pontos na Cristiano Machado até a área central. Uma atração especial para as crianças, empolgadas com o novo modelo de ônibus, articulado e com 18,6 metros de comprimento.

Sentado na janela, atento a todos os detalhes, o pequeno Inácio, de 6 anos, foi quem incentivou a família a andar no BRT/Move. “Ele viu passando no sábado na Cristiano Machado e ficou doido para andar. Hoje (ontem) acordou já pedindo para vir”, conta a avó do garoto, Lúcia Magalhães, de 65, junto com o filho Sérgio Brasil, de 45, e a nora Flávia Custódio, de 27. “Moramos no Cidade Nova e, para a gente, vai ser uma beleza”, diz Lúcia, que espera diminuir pela metade o tempo de 1h20 gasto até o Centro.

‘Busólogos’

A prancheta para anotar o horário de chegada dos ônibus à Estação Tamoios, na Avenida Paraná, fica em uma mão. Na outra, lá está o celular, pronto para registrar mais uma passagem do BRT/Move pela área central. Despachante de coletivos por profissão, Weslley da Silva, de 33 anos, é busólogo, termo usado para designar os aficionados por ônibus. “Desde criança, pegava embalagem de pasta de dente e fazia ônibus de brinquedo”, conta Weslley, sobrinho de motorista. Depois de trabalhar por 10 horas no sábado, ele ainda teve disposição para andar no BRT/Move para fotografar o veículo por todos os ângulos. (FA)


Desafios para hoje

Problemas verificados no sábado e no domingo que exigem ajustes e atenção para hoje, primeiro dia útil em que o BRT/Move funcionará:

. Pedestres atravessam a Avenida Cristiano Machado fora da passarela e caminham pelas pistas exclusivas do BRT/Move na área central

. Veículos não respeitam as pistas exclusivas do BRT/Move na área central

. Sensores das portas de algumas estações, comoa do Sagrada Família, não funcionam. Com isso, pedestres ficam fora da área de segurança

. Os monitores que anunciam os horários de chegada dentro e fora dos coletivos estavam sem funcionar

. Todas as linhas do BRT/Move, especialmente a 82 (São Gabriel/Savassi via hospitais) trafegam em pistas mistas em parte do seu trajeto, dividindo espaço com veículos


Perigo na pista
Situações perigosas: no alto, motorista trafega por pista do BRT na Avenida Paraná; à esquerda, um senhor é retirado de faixa exclusiva após quase ser atropelado e um cadeirante circula em área proibida; acima, passageiro espera ônibus em área restrita devido a falha em porta

 

 

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