Jornal Estado de Minas

Solução para desafogar sistema prisional, tornozeleiras eletrônicas são subutilizadas

Apenas 75% das tornozeleiras eletrônicas, dispositivo essencial para desafogar o sistema prisional e humanizar cumprimento de pena, são usadas em Minas. Solução é expandir para o interior

Flávia Ayer

Central de Monitoração de Tornozeleira Eletrônica da Secretaria de Estado de Defesa Social acompanha detentos e detecta qualquer irregularidade, como rompimento do dispositivo - Foto: SEDS/DIVULGAÇÃO


O sistema prisional está superlotado. Além de vagas, faltam pessoal e infraestrutura, mas um quarto das tornozeleiras eletrônicas para monitoramento de detentos não está sendo usado. Adotados há pouco mais de um ano em Minas Gerais, os equipamentos têm alcance limitado e funcionam 25% abaixo de sua capacidade. Embora existam tornozeleiras para vigiar 1.815 detentos, a Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds) segue os passos de apenas 1.358 pessoas (entre presos do regime aberto e domiciliar) dos que cumprem medidas cautelares e agressores enquadrados na Lei Maria da Penha, que coíbe violência contra mulheres.

Apesar dos 58 mil presos no estado, a tecnologia, que poderia ser usada por mais 457 presos, está restrita à Região Metropolitana de Belo Horizonte. Outro entrave, segundo juízes que determinam o uso, é porque a aplicação do mecanismo se restringe apenas a casos específicos. Para tentar ampliar o emprego da tecnologia, a Seds estuda levar tornozeleiras para o interior ainda neste primeiro semestre.

Quem usa o aparelho fica sob vigilância 24 horas por dia pela Central de Monitoração da Seds. Se o preso descumpre horários de ficar em casa e no trabalho, deixa de carregar ou viola o equipamento, um sinal é emitido para a central, ele se torna imediatamente foragido da Justiça e perde o benefício da liberdade.
Desde dezembro de 2012, 2.306 pessoas foram indicadas pelo Judiciário para usar o equipamento, sendo 275 por causa da Lei Maria da Penha, que há um ano foi contemplada com as tornozeleiras. Nesses casos, se o agressor desrespeita a distância mínima da vítima, que dispõe de um aparelho semelhante a um celular, a tornozeleira  emite sinal e funcionários da central ligam para a mulher e alertam a Polícia Militar.

A juíza responsável pela Central de Flagrantes, Maria Luiza de Andrade Rangel`Pires, apoia, mas questiona a eficácia da tornozeleira: “Elas são muito úteis para prisão domiciliar e a Lei Maria da Penha, mas, no caso das medidas cautelares, têm eficiência relativa”.

A monitoração eletrônica é uma das medidas cautelares previstas pelo Código de Processo Penal. Substitui a prisão preventiva e é aplicada a réus primários cujos crimes somam pena de até quatro anos, dando ao acusado o direito de responder o processo em liberdade provisória.

Além de usar o equipamento, o réu é obrigado a ficar em casa à noite e nos dias de folga, se tiver residência e trabalho fixos. “Ele acaba monitorado apenas à noite. Para funcionar 100%, a lei deveria autorizar o juiz a determinar como será a prisão domiciliar ”, diz a magistrada. “A tornozeleira não previne a prática de crimes, tem mais efeito psicológico. Ao mesmo tempo, como registra por onde a pessoa passa, serve de prova prática caso o acusado tenha estado no local de um crime”, afirma.

Depois de um ano em uso, o aparelho mostra alcance restrito, apesar de apresentado inicialmente como instrumento para humanizar as penas e liberar espaço nas prisões. “Na Central de Flagrantes, falta público para a tornozeleira, pois ocorrem mais crimes graves (sem o benefício da medida cautelar)”, informa Maria Luiza. “Acredito que na Copa do Mundo colocaremos mais equipamentos, pois, geralmente, onde tem mais gente, ocorrem mais crimes”, afirma.

"Na Central de Flagrantes falta público para a tornozeleira, pois ocorrem mais crimes graves (sem o benefício da medida cautelar)" Maria Luiza de Andrade Rangel Pires Juíza responsável pela Central de Flagrantes - Foto: MARCOS MARCOS MICHELIN/EM/D.A Press
MINORIA

No sistema penitenciário, é também uma minoria que pode usar o dispositivo, restrito a presos do regime aberto e prisão domiciliar. “A tornozeleira já está incorporada ao cotidiano, mas são poucas as pessoas do regime aberto”, reforça o juiz da Vara de Execuções Penais de BH Guilherme de Azeredo Passos, que aprova a adoção do equipamento. “Os presos estão fiscalizados e com uma inclusão social maior. Com o monitoramento, tenho certeza de que ele dorme em casa, sai para trabalhar, cumpre determinado perímetro e passa o fim de semana recolhido”, afirma.

Ele ressalta o desafogamento do sistema penitenciário com o emprego das tornozeleiras.

“Presos têm passado menos tempo na casa do albergado (estabelecimento de segurança mínima para cumprimento do regime aberto)“, conta Passos, que defende a ampliação da tecnologia para o interior de Minas. A expansão da tecnologia no estado está em estudo na Seds, segundo o subsecretário de Administração Prisional, Murilo Andrade de Oliveira. “Estamos buscando novo contrato para o interior ainda no primeiro semestre”, adianta.

No início do ano, a Seds assinou aditivo no contrato de prestação do serviço para o fornecimento de 600 aparelhos. Com esse incremento, a meta é alcançar a marca de 4.582 presos monitorados simultaneamente até 2016. O contrato atual cobre apenas a região metropolitana, ao custo de R$ 28,5 milhões por cinco anos, contados a partir de 2012. Segundo o subsecretário, o uso do aparelho gera economia para os cofres públicos. “A tornozeleira tem custo mensal de R$ 185, enquanto o detento na unidade prisional custa R$ 1.800”, completa Oliveira.

 

- Foto: ARTE EM 

.