No cárcere, agulhas de tricô e crochê se tornaram a chave da liberdade. A cada ponto, a renovação das esperanças de um futuro além das grades. Talentos aprisionados que, com uma dose de confiança e oportunidade, estão mostrando ao mundo o significado de uma nova escolha. Detentos da Penitenciária Professor Ariosvaldo Campos Pires, em Juiz de Fora, na Zona da Mata mineira, entraram no mundo luxuoso da moda e são a linha de frente de produção de uma conceituada grife mineira. Peças exclusivas feitas com uma técnica aprimorada para passar os fios de um lado a outro ganharam passarelas e lojas do Brasil e países das Américas, Europa e Ásia. Ontem, durante o Minas Trend Preview, no Expominas, em Belo Horizonte, dois presidiários tiveram a chance de ver de perto, pela primeira vez, o resultado do trabalho.
A estilista Raquell Guimarães, dona da Doisélles, tem no tricô e no crochê a matéria-prima de suas coleções. Uma atividade tipicamente feminina ganhou ares de modernidade por meio dos olhares masculinos e de agulhas diferenciadas – da espessura de um cabo de vassoura, permitem fazer pontos mais largos e abusar da criatividade. “Esse trabalho é feito normalmente por artesãs, que não têm o compromisso com prazo de entrega e produção em série.
Ao entrarem no prédio do Expominas, a emoção era visível. O detento Luiz Paulo Pacheco da Silva, de 33 anos, bem que tentou, mas não conseguiu esconder o choro. Pela primeira vez em 12 anos, ele via as cores da rua. “Não tem explicação. Sair de lá e vir para um lugar bonito desses, sabendo que o trabalho está sendo valorizado. Espero continuar nesse projeto e melhorar cada dia mais”, disse. Em meio a sessão de fotos e vídeo, a admiração de ver pendurada nos cabides, expostas para quem quisesse ver, as roupas que as mãos teceram. “É o nosso trabalho sendo reconhecido no Brasil e lá fora.”
ORGULHO Colega de trabalho, Sandro Heleno dos Santos, de 31, se orgulha em dizer que ganha, quarta-feira, a liberdade e uma profissão. Cheio de sorrisos e pose de modelo, ele aposta num futuro promissor.
A própria Doisélles tem contratado detentos que ganham a liberdade. De acordo com a diretora da penitenciária, Ândrea Valéria Andrias Pinto. Atualmente, 18 presidiários estão na linha de montagem e outros 20 estão aptos ao trabalho. Todos os trabalhadores têm rendimentos por produção. O subsecretário de Administração Prisional, Murilo Andrade de Oliveira, da Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds) informa que, atualmente, 13 mil presos trabalham em Minas Gerais e 6,6 mil estudam.
No caso das peças produzidas em Juiz de Fora, todas ganham passarelas e lojas de importantes centros da moda, como Paris, Nova York e Tóquio, com um selo de origem.