Altares cobertos de roxo, cerimônias com cânticos em latim, para lembrar as sete dores de Nossa Senhora, as confissões dos católicos e a caminhada a lugares sagrados. Minas está preparada, com fé e tradição, para as missas, procissões e outros ritos da semana santa, que começará domingo com a bênção dos ramos e cortejo que recria a entrada triunfal de Jesus em Jerusalém. Hoje, às 9h, no Santuário Nossa Senhora da Piedade, em Caeté, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, o arcebispo dom Walmor Oliveira de Azevedo vai presidir a peregrinação dos bispos auxiliares e de centenas de padres e diáconos ao alto da Serra da Piedade, dentro da celebração penitencial, considerado um momento de grande significado e de preparação espiritual para os religiosos. Nessa quinta-feira, na Praça da Liberdade, Região Centro-Sul de BH, uma encenação da Paixão de Cristo por um grupo de teatro de Congonhas emocionou moradores e visitantes.
A apresentação acontece há 50 anos na cidade histórica, durante a semana santa, mas este ano, em que é lembrado o bicentenário de morte de Antonio Francisco Lisboa, o Aleijadinho (1738-1814), os belo-horizontinos se surpreenderam com a cena “Pietá” reproduzindo o sofrimento de Jesus no colo de Maria, nas escadarias do Museu das Minas e do Metal.
Os últimos momentos de Cristo estão representadas em obras de Aleijadinho nas capelas de Congonhas. Antes da encenação, a música colonial mineira barroca, gravada pelo Coral Cidade dos Profetas, também de Congonhas, chamou a atenção de quem fazia caminhada, brincava com crianças ou passava pela praça a caminho do trabalho.
A atriz e cantora Carmem Célia Gomes, que representava Verônica, entoou o lamento da sacada do segundo andar do prédio, segurando o tecido que enxugou a face de Cristo. No grupo há dez anos, ela agora assume o papel que já foi da mãe, tia, madrinha, tia-avó e de uma prima, ao longo de cinco décadas. A atriz que representava Maria, acompanhada das personagens Maria Madalena, Verônica, João Batista e de um anjo deixaram o prédio e circularam pela Praça da Liberdade. Maria, desesperada, abordava as pessoas à procura do filho.
Em outra cena, surge o ator Rafael Junqueira, de 30 anos, na pele de Jesus. Ele carregava a cruz nas costas e levava chibatadas de um guarda romano, enquanto outro guarda seguia à frente, tocando corneta e abrindo passagem. A fidelidade do ator ao representar as dores de Jesus impressionou as crianças que estavam no local. “Estão matando Jesus. É muito triste”, lamentou Fernando Lembi, de 6. A mãe dele, a arquiteta Fabiana Couto, de 38, também se emocionou. A professora Rita de Cássia Fava, de 60, registrou tudo com o seu celular. “É um resgate da tradição religiosa de Minas”, comentou. A peça contou com 13 atores. A encenação completa, com 80 atores e 200 figurantes, poderá ser vista na sexta-feira da Paixão, às 19h, no Santuário Bom Jesus do Matosinhos, em Congonhas.
SERRA DA PIEDADE Em Caeté, as celebrações de 2014 ganham significado especial, pois o município comemora 300 anos de elevação à condição de Vila Nova da Rainha, uma das sete vilas do ouro das Gerais. Ponto de partida do Caminho Religioso da Estrada Real (Crer), a Serra da Piedade recebe milhares de devotos durante todo o ano e terá, no domingo de ramos, missa e bênção na Igreja Nova das Romarias (veja programação abaixo) – a ermida do século 18 está sendo restaurada. Já no distrito de Morro Vermelho, moradores mantêm tradições populares, como a Encomendação das almas, nas madrugadas da quaresma, e a Charola do esmoler, celebração centenária: uma pequena imagem do Senhor dos Passos Pequeno percorre o meio rural num convite ao povo para a semana santa.
Ao longo dos séculos, as cidades incorporaram costumes à programação dos dias da Paixão de Cristo, embora a Igreja determine como litúrgicos “o domingo de ramos, a quinta-feira do lava-pés, a sexta-feira, o sábado da vigília pascal e o domingo da ressurreição”, explica o vice-chanceler da arquidiocese e titular da paróquia de Nossa Senhora das Graças, padre Nivaldo Magela. Ele lembra que a cada ano cresce a participação dos fiéis nas missas e procissões, embora haja um interesse maior pelo que é litúrgico. A tradição popular, acrescenta o padre, “preencheu” a segunda e a terça-feira com as procissões do depósito de Nosso Senhor dos Passos e Nossa Senhora das Dores, reservando a quarta-feira para o encontro de Maria com Jesus.
No domingo de ramos, em BH, vai ocorrer a 5ª Jornada Arquidiocesana da Juventude, com o tema "Felizes os pobres de coração, porque o reinado de Deus lhes pertence" (Mt 5, 3). Conforme os organizadores, trata-se de “um momento de espiritualidade, confraternização e partilha para uma nova vivência dos jovens”. Rumo ao Santuário Arquidiocesano de Adoração Perpétua – Paróquia Nossa Senhora da Boa Viagem, no Bairro Funcionários, na Região Centro-Sul da capital, as peregrinações vão sair de cada uma das regiões episcopais, com a concentração às 13h.
Cerimônias na Praça Tiradentes
Em Ouro Preto, as cerimônias serão realizadas na Paróquia de Nossa Senhora do Pilar, com a maior parte das cerimônias na Basílica do Pilar. A montagem da estrutura, na Praça Tiradentes, no Centro Histórico, para a solenidade de 21 de Abril, não vai afetar a programação da Semana Santa nem causará problemas, informa Carlos José Aparecido de Oliveira, diretor do Museu de Arte Sacra, vinculado à paróquia do Pilar. “Tivemos uma reunião com a equipe do cerimonial do governo de Minas e ficou acertado que poderemos, inclusive, usar o palanque que receberá as autoridades”, afirmou ontem o diretor do museu.
Em Santa Luzia, na Grande BH, as figuras que compõem as procissões da Semana Santa vão sair com roupas novas, adianta o padre Danil Marcelo dos Santos, que estará à frente, amanhã, do último dia do Setenário de Nossa Senhora das Dores, na Igreja Matriz. O mesmo rito ocorrerá na Paróquia de Nossa Senhora do Rosário, na vizinha Sabará, com a presença da orquestra e do coral Santa Cecília, diz o titular da paróquia, padre Rogério Messias. Ele conta que a peregrinação ao Morro da Cruz, na madrugada da sexta-feira da Paixão, terá uma diferença desta vez: como a Capela de Nossa Senhora das Dores está interditada, a imagem será levada para uma tenda especialmente montada para a ocasião.