Somente quando o liquidificador da loja de sucos parou de triturar uma polpa que a balconista Jassira Cristina Xavier, de 23 anos, escutou os berros de dor que vinham da Rua São Paulo, em frente à loja. Um ciclista, de 31, que descia a Rua dos Guajajaras, no Centro, perdeu os freios, passou desviando por duas das três faixas de veículos, mas acabou atingindo a lateral de um ônibus. “Foi terrível. O moço gritava de dor e tinha sangue para todo lado. A gente não sabia o que fazer e tinha medo que ele morresse. Todos ligaram para o socorro ao mesmo tempo, mas o Samu levou 40 minutos para chegar”, lembra. Como o sangue não parava de escorrer do abdome do ciclista, que ainda se contorcia sob o coletivo, comerciantes dos arredores assumiram os cuidados, trazendo panos, água e gelo para tentar fazer curativos até a vinda do resgate. Apesar de a Secretaria Municipal de Saúde (SMSA) afirmar que a média de atendimentos do Samu de BH chega a 13 minutos – número por si só acima do ideal, que é de, no máximo, 10 minutos –, há vários relatos de quem tenha esperado por mais de uma hora para ser socorrido.
O caso do ciclista ocorreu em 20 de fevereiro deste ano e o próprio cobrador do ônibus disse ter ligado 12 vezes para o 192, número de acionamento do Samu. Exatamente 10 dias antes, uma figura pública da capital, o vereador Adriano Ventura (PT), tinha sido atropelado por um carro, quando também circulava de bicicleta, na Região do Barreiro. Segundo ele, o acionamento do Samu ocorreu por duas horas seguidas, sem respostas, até que os Bombeiros fizeram o socorro e o levaram até o Hospital de Pronto-Socorro João XXIII. “É falta de respeito com o cidadão ficar duas horas esperando resgate”, declarou à época.
Acostumado a acompanhar pacientes que chegam por meio de ambulâncias do Samu, por ser grande parte deles vítimas de trânsito, e por atuar como médico no Hospital de Pronto-Socorro João XXIII, que é referência em atendimentos de urgência, o vice-presidente da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet), Guilherme Durães, lembra de vários casos de atrasos que agravaram a saúde dos pacientes. “Há duas semanas, no Belvedere, ajudamos a tratar de um motociclista e um motorista de um carro, que bateram. O piloto da moto estava em estado grave. Ligamos para o Samu, que demorou uma hora para atender. Quando chegou, era uma unidade básica, sem médicos, e não a avançada que pedimos”, conta. Ainda de acordo com ele, as condições nas ambulâncias também são precárias. “As pranchas de carregar os pacientes são velhas e desgastadas, os tirantes que prendem as vítimas perderam encaixes e precisam ser amarrados, e já vi até o curativo ser feito com crepom, uma espécie de quebra galho.”
Desestrutura
De acordo com a Ouvidoria da Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), a velocidade de atendimento do Samu tem melhorado com os anos. “O tempo médio de resposta em 2008 era de 20 minutos, passando para 13 minutos (-35%) em 2013.” À época do acidente do vereador Adriano Ventura, a SMSA informou que não foram registrados chamados para sua ocorrência no Samu. Já no caso do ciclista, a secretaria admitiu que houve atraso, já que a chamada se deu às 12h06 e a ambulância chegou às 12h36.
Em muitos casos, o tempo excessivo gasto pelo Samu para chegar ao paciente se une a outro problema: a falta de leitos e profissionais disponíveis em unidades de saúde. É o que ressalta o presidente da Federação Nacional dos Médicos (Fenam), Geraldo Ferreira Filho. “A rede hospitalar para urgência e emergência no Brasil está profundamente sobrecarregada. Na unidade de saúde, é comum a demora para atender o paciente, o que reforça a necessidade de o Samu ser ágil”, diz. “Os profissionais do Samu estão capacitados a oferecer um suporte primário, mas o principal é que a pessoa seja conduzida ao ambiente hospitalar, onde pode receber os cuidados definitivos”, acrescenta.