Jornal Estado de Minas

Indignados, moradores do Mangabeiras protestam contra a violência na região

Sensação de insegurança ronda a Zona Sul de Belo Horizonte

Sandra Kiefer
Dezenas de pessoas se reuniram na Praça da Bandeira e pediram providências para acabar com os furtos no bairro - Foto: Beto Novaes/EM/D.A/Press

Na onda de protestos que retornam com a proximidade da Copa do Mundo no Brasil, até mesmo os moradores do Bairro Mangabeiras venceram o medo de ser assaltados e saíram às ruas ontem para se manifestar publicamente sobre a sensação de insegurança que ronda a Zona Sul de Belo Horizonte. “Não quero ser refém dentro da minha própria casa. Investi mais de R$ 10 mil em equipamentos de policiamento privado, mas não me sinto segura”, desabafou a designer Romilda Ferreira, organizadora do movimento que reuniu algumas dezenas de pessoas na Praça da Bandeira. Segundo ela, esta é a primeira das diversas iniciativas que os moradores pretendem tomar para combater a violência instalada no bairro.

Um dos moradores pioneiros do Mangabeiras, um médico presente ao ato de protesto, contou que teve a residência assaltada pela primeira vez em 40 anos. “Meu carro já dormiu com a chave no contato, já esqueci a porta de casa aberta e nunca aconteceu nada. Acreditava que o problema não era comigo, até o dia em que a violência invadiu a minha sala”, disse ele, que teve a casa arrombada por ladrões este ano, enquanto a família estava fora.

Outra moradora do bairro, também médica, confessa que está com medo de sair no portão desde dezembro, quando a residência foi arrombada durante o horário de almoço dela e do vigia da rua. Ela não sabe calcular o quanto foi levado em joias e eletrônicos. “Fico trancada dentro de casa vendo televisão.
Poderia estar indo ao teatro ou ao cinema, mas prefiro não arriscar. Estou evitando até passear com meus netos na pracinha”, afirma ela, que prefere permanecer no anonimato. “Fico com receio de publicar meu nome. Está vendo? Ando com medo até de conversar”, completa, emocionada, com os olhos marejados.

PERIGOSO Na carta aberta à comunidade convocando para o evento, a médica lembrou que o bairro é um dos cartões postais de Belo Horizonte, porque abriga o Parque dos Mangabeiras, a Praça do Papa e tem ao fundo a Serra do Curral. “Nosso bairro vem sofrendo com uma crescente onda de assaltos a mão armada, sem falar no tráfico de drogas, que tornou a Praça do Papa um lugar perigoso depois das 17h”, alerta.

“É fundamental trazer as câmeras do Olho Vivo para a praça, que virou ponto de rolezinho, com jovens surfando em cima dos ônibus”, reclama Marcelo Marinho, que foi presidente por dois mandatos da Associação de Moradores do Mangabeiras. Para o atual presidente da entidade, Alberto Dávila, é necessário uma ação conjunta da Guarda Civil e polícias Militar e Civil, para atuar na região do entorno da praça. “Estão melhorando a iluminação e virá um sistema de monitoramento eletrônico especial para a Copa, que já vai começar a ser instalado”, anima-se Dávila.

A manifestação contou, além da PM e da Polícia Civil, com o gerente de articulação e mobilização da PBH, Samuel Sampaio. “Estamos abertos a ouvir as principais reivindicações dos moradores e verificar o que pode ser feito. Eles estão pedindo a manutenção do posto policial na Praça da Bandeira e a instalação de outro dentro do bairro, além de câmeras de videomonitoramento eletrônico.”

Entrevista/SAMUEL NERI, titular da 3ª Delegacia de Polícia Civil da Região Sul (DP Sul)

Combate à criminalidade


Furto a residência é o principal tipo de crime cometido no Mangabeiras, segundo informa o delegado Samuel Neri, titular da 3ª Delegacia de Polícia Civil da Região Sul (DP Sul). Carioca, ele trabalhou na instalação das UPPs nas comunidades do Rio de Janeiro e, há um ano à frente da delegacia em BH, já comandou três operações de desarticulação de quadrilhas na capital.

O que está ocorrendo no Mangabeiras?
Na maioria dos casos, identificamos furtos a residência, que geralmente ocorrem quando não tem ninguém em casa. Já sabemos sobre a ação de quadrilhas organizadas, que vêm do Bairro Alto Vera Cruz para rondar o bairro, atrás de casas grandes, localizadas em ruas desertas e sem sistema de segurança.

Como essas quadrilhas agem?
Não há alvos pré-selecionados. Eles batem a campainha e informam um nome qualquer. Se alguém responder dentro da residência, partem para outra que esteja vazia.
Preferem atuar durante o dia, pois sabem que os moradores estão no trabalho.

Por que os ladrões ainda não foram presos?
Somos apenas seis agentes para atuar no Mangabeiras, Sion, Anchieta e no Aglomerado da Serra. Destacamos três para atuar na Serra e outros três para atender os outros os bairros. Prendemos todos os chefões do tráfico na Serra, inclusive o maior deles, surpreendido durante churrasco com toda a quadrilha. Em BH, ainda é diferente do Rio, onde, antes das UPPs, havia áreas em que a polícia não entrava. Aqui não foi necessária a retomada do território. Tenho duas viaturas que percorrem a Serra de uma ponta à outra.

O que pode ser feito, então?
Acredito que a segurança seja dever do Estado, mas também uma responsabilidade de todos. Vejo, aqui no Mangabeiras, residências de alto valor financeiro sem qualquer investimento em segurança. Falta também uma maior relação interpessoal entre os vizinhos. Outro dia, uma casa sem câmeras foi assaltada e batemos na vizinha para conseguir a gravação. Ela confessou ter visto um indivíduo suspeito batendo a campainha, mas ficou impossibilitada de avisar pois não tinha o celular da vizinha de muro.

Cuidados básicos
» Investir em equipamento de monitoramento de residência com boa resolução do vídeo, que permita identificar nas imagens o assaltante ou a placa do carro usado no assalto.

» Nunca deixar o HD do equipamento perto do sistema de vigilância.
Os assaltantes já sabem identificar o aparelho e levam com eles a ‘fita’ do assalto, inutilizando todo o esforço do morador.

» Não entrar em casa, se perceber que o portão está amassado, a porta entreaberta ou que há pessoas suspeitas por perto. É melhor avisar antes à polícia.

» Outra precaução é ligar o sistema de monitoramento ao próprio celular. Assim, antes de entrar em casa, o morador pode verificar se a residência não foi invadida.

» Em épocas de feriado ou férias, deixar os vizinhos sob alerta, de preferência com os números do celular. Pedir a eles que informem à polícia caso haja movimentações estranhas na residência.

Fonte: delegado Samuel Neri, titular da 3ª Delegacia de Polícia Civil da Região Sul (DP Sul) .