Um empreendimento de 70 lojas funciona há nada menos que 24 anos na Avenida Nossa Senhora do Carmo, em plena Região Centro-Sul de Belo Horizonte, sem o documento que atesta sua regularidade junto à prefeitura: o Alvará de Localização e Funcionamento. Depois de receber, em todo esse período, apenas uma notificação fiscal, como informou a administração, o centro comercial pediu prazo ao município para se regularizar. A solicitação foi feita em dezembro e vence no próximo dia 11, mas até agora o documento não providenciado. A situação do estabelecimento, em uma das avenidas mais movimentadas de uma área nobre da capital, indica como é extensa a lista de atividades comerciais que funcionam em condição irregular na cidade. Todos os dias, são 10 notificações por falta do alvará ou por documentação vencida. O quadro configura infração administrativa, mas pode ser também um risco à população, uma vez que o documento atesta o atendimento a exigências oficiais de estrutura e segurança.
A média diária de irregularidades detectadas se refere aos quatro primeiros meses de 2014, quando foram feitas 3.418 vistorias, que resultaram em 1.248 notificações e 307 multas. Dados da Secretaria Municipal Adjunta de Regulação Urbana (Smaru) mostram que, mesmo com queda no número de fiscalizações feitas no comércio da capital (a média caiu de 49 por dia em 2012, para 35,5 em 2013 e 28,4 nos quatro primeiros meses deste ano), as ações têm resultado em mais punições. A média de 10 estabelecimentos/dia notificados por fiscais este ano é superior aos 8,9 que receberam aviso para se regularizar no ano passado. Entretanto, a média de 2,5 multas aplicadas diariamente em 2014 está abaixo das 2,7 expedidas há um ano.
A redução das vistorias, argumenta a secretaria, é resultado de avanços tecnológicos que permitem a checagem da existência de alvará pela internet, para estabelecimentos de menor impacto, como escritórios. Outras atividades, que geram resíduos, barulho ou efluentes, segundo o órgão, são fiscalizadas no local. “As ações se tornaram mais concentradas e eficientes”, explica a fiscal integrada da Secretaria Municipal Adjunta de Fiscalização, Márcia Curvelano.
Além de configurar um problema de ordem econômica, não ter o alvará de localização e funcionamento ou estar com o documento fora da validade pode significar risco aos frequentadores do estabelecimento, como explica Márcia. “O alvará é o documento que traz as exigências às quais o estabelecimento está sujeito para lidar com problemas, como geração de barulho, riscos à segurança, emissão de gases ou geração de resíduos sólidos”, afirma Márcia. Ela acrescenta que não adianta o estabelecimento estar com todos os projetos e ações em dia, se não providenciar o alvará. “O responsável será notificado, porque é o alvará que reúne essas informações”, explica.
Ainda segundo a fiscal, três situações são muito comuns nas vistorias de alvará. Na primeira, caso em que se enquadra o centro comercial que opera há quase duas décadas e meia na irregularidade na Avenida Nossa Senhora do Carmo, o estabelecimento não tem o documento. Em outro caso, há empreendedores que começam uma atividade e, posteriormente, a expandem, sem comunicar à prefeitura ou fazer a mudança no alvará. Márcia Curvelano exemplifica citando os casos de bares, licenciados inicialmente para a venda de bebidas, que depois passam a ter música ao vivo. “Se não houver cobrança de ingresso, eles recebem o código de casas de festas e eventos, além do registro de bar. Se for cobrado ingresso na entrada, funcionam também como discoteca, danceteria, salão de festas ou similares. Para tudo isso, o estabelecimento precisa providenciar o acréscimo do código da nova atividade no alvará. Caso contrário, fica irregular”, alerta a fiscal.
O problema, segundo Márcia, é que, ao acrescentar um novo funcionamento, os empreendedores são obrigados a adotar medidas mais complexas e, muitas vezes, fogem dessa responsabilidade. Em locais com emissão de ruídos, por exemplo, pode ser necessária a apresentação de estudo de impacto de vizinhança (EIV) e projeto de tratamento acústico, entre outras exigências. O auto de vistoria do Corpo de Bombeiros também é exigência para locais com aglomeração de pessoas. Além de o documento ser necessário para a expedição do alvará, a legislação prevê a aplicação de multas e interdição do estabelecimento quando este oferece risco iminente à segurança dos frequentadores.
FUNDO DE QUINTAL Outra irregularidade comum nas fiscalizações é a manutenção de atividades comerciais em residências. No Bairro das Indústrias, na Região do Barreiro, o aposentado Vicente Eugênio de Morais manteve por cinco anos uma mercearia funcionando sem o alvará na garagem do imóvel onde vive. O ponto funcionou por 36 anos, no nome da esposa do comerciante, mas, com o falecimento da mulher, ele deu baixa na microempresa. Isso foi em 2009, mas somente há um semestre as portas foram baixadas. “Desde que minha mulher morreu, eu só abria no fim da tarde para vender bebidas e alguma mercadoria que sobrou, porque tenho problemas de saúde. Por isso, não quis providenciar outro alvará”, conta. A fiscal Márcia Curvelano lembra que exercer uma atividade em casa pode ser cômodo, mas tem as mesmas exigências de um estabelecimento comercial. “Várias atividades são permitidas, mas as pessoas precisam sair da informalidade”, recomenda.
Boates ainda têm pendências
Seguem sem alvará de localização e funcionamento três das sete boates identificadas em março, pelo Estado de Minas, mantendo atividades normais mesmo sem o documento. Pontos badalados da noite em BH, as danceterias NaSala, dentro do Shopping Ponteio (Centro-Sul), e Deputamadre, na Floresta, continuam funcionando mesmo sem se regularizar, enquanto a UP, na Savassi, encerrou as atividades. No caso da Deputamadre, uma ação fiscal está em andamento e o estabelecimento foi notificado. Já a NaSala foi notificada e autuada pela falta do documento. Duas casas estão protegidas por decisões judiciais. O Café de La Musique, que foi vendido e hoje funciona como o nome fantasia de West Pub, se regularizou depois de conseguir uma liminar. O documento havia sido cassado pela prefeitura ainda na época do antigo nome. Também funciona por meio de liminar a boate Cheio de Graça, no Bairro Funcionários. A fiscalização nas boates foi resultado de uma força-tarefa montada em Belo Horizonte após o incêndio na Boate Kiss, em 27 de janeiro de 2013, que resultou na morte de 241 pessoas em Santa Maria, no Rio Grande do Sul.
Para ficar legal
Passos para obtenção do alvará
1 - Fazer consulta prévia no site alf.siatu.pbh.gov.br, no ícone “CONSULTA PRÉVIA/Solicitar”.
2 - Com a consulta aprovada, fazer a solicitação do alvará no ícone “ALVARÁ/Solicitar”.
3 - Informar o número da Consulta e CNPJ
4 - Será gerado o alvará (para atividades de baixo risco, como escritório administrativo) ou o requerimento (para atividade de risco, como boates)
5 - Será gerada também, automaticamente, uma guia exclusivamente para o alvará ou requerimento
6 - Se for gerado o alvará, após pagamento da guia, a compensação bancária é feita eletronicamente em até dois dias úteis e o documento passa para situação ativo, ficando disponível na internet
7-Se for gerado o requerimento, este deverá ser protocolado no BH Resolve, juntamente com todos os documentos exigidos na consulta prévia (nesse caso, o prazo depende do tempo que o interessado
8 - levará para protocolar o pedido. Após o protocolo, o alvará é concedido em um prazo médio de cinco dias, se toda a documentação estiver correta)