Em jogos de Copa do Mundo, especialmente no país do fanatismo pelo futebol, a maioria das mulheres brasileiras ganha agora uma oportunidade única. Se suportaram seus namorados, maridos e ficantes hipnotizados em frente à TV assistindo a dois campeonatos nacionais por ano, aos estaduais, intermináveis programas esportivos e a jogos de qualquer divisão, chegou a hora de descontar. Durante o Mundial, a torcida feminina entra em campo. Sabendo ou não o que é impedimento, elas pintam as unhas de verde-amarelo, vestem a camisa da Seleção Brasileira e são, disparadas, as mais empolgadas da família.
É o caso da bióloga de Sorocaba (SP) Patrícia de Oliveira Leis, de 48 anos. Depois de pelejar durante dias no site oficial da Fifa, ela conseguiu comprar os ingressos para Inglaterra e Costa Rica, em Belo Horizonte. Faltava convencer o marido, o engenheiro José Fernando Leis, de 51, a vir dirigindo 674 quilômetros de carro para assistir ao jogo no Mineirão. “Comprei o terninho azul, que pode ser aproveitado depois, para torcer pelo Brasil, e fiz a unha com a bandeira inglesa. Nem imaginei que a Inglaterra já estaria desclassificada”, lamenta ela, animadíssima, ao lado do marido, à paisana, com a barba por fazer.
“Gosto mais quando minha esposa acompanha as partidas.
Já a engenheira de Belo Horizonte Fátima Chagas tem outra explicação para o machismo generalizado no futebol. Simpatizante do Cruzeiro, ela nunca faz questão de reunir os filhos para assistir às partidas dos times locais dentro de casa. Durante a Copa do Mundo, porém, as partidas ganham novo significado. “A mulher tem esse senso de união da família já aflorado. Quando abre a possibilidade de confraternização, ela aproveita para convocar todo mundo a participar da festa”, diz.
Olhar feminino
Namorados há sete anos, o engenheiro de Taubaté (SP) Antônio Santos, de 25, trouxe Viviane Rezende, relações-públicas, para irem juntos ao jogo de ontem no Mineirão. O casal vai também à decisão do terceiro lugar da Copa, em Brasília. A moça torce para o Flamengo, embora seja mineira de Itajubá. “É diferente assistir ao jogo com ela, que repara em coisas engraçadas, como o hino, a roupa dos jogadores, o cabelo. Sai um pouco da rotina”, conta ele, dizendo que Viviane entende cerca de 40% das regras do futebol.
“Levei a Bruna duas vezes ao campo. Meu time perdeu nas duas vezes, por quatro gols. Ela é o maior pé-frio!”, critica o administrador Juliano Fantone, de 34, que mesmo assim se casou com a enfermeira Bruna Laponez da Silveira, de 32. Em função da fama de azarenta, ela é proibida de ir à casa do sogro em dia de jogo. “Você acredita que no intervalo em que levantei para jogar um papel na lixeira, que era um pouco distante, o Brasil fez dois gols?”, conta ela, entre gargalhadas, enquanto assistia à partida da Seleção em um bar da Savassi, na companhia de um casal de amigos. Sem se incomodar com as provocações do marido, Bruna vestia camisa amarela e trocava com a amiga fotos do jogador brasileiro Hulk, por mensagens de celular. Vendo tudo, o marido fazia cara de bravo.
A Copa das crianças
Copa do Mundo no Brasil é melhor que sorvete. Quem diz isso, com uma carinha lambuzada do doce, é o garoto Frederico Spacarrenberger, de 5 anos, equilibrando uma casquinha de baunilha na mão direita e, na esquerda, um objeto barulhento de torcedor. Nascido em Novo Hamburgo (RS), mas morando com a mãe em BH, o pequeno ainda não aprendeu a escrever o intrincado nome completo, mas já sabe bem o que quer. No dia do jogo da Seleção Brasileira, pintou o rosto com as cores da bandeira e foi passear na Região da Savassi com o pai, que mora em Buenos Aires, na Argentina.
Alguns passos à frente estava Kevin Medeiros, também de 5. O garoto chamava a atenção em função dos cabelos louros espetados com gel, mais do que do camisa 10 Neymar Jr. Engana-se quem pensa, porém, que o topete era inspirado no jogador. Ao fazer pose para foto, o garoto fez gesto de metaleiro. Segundo a mãe, o filho é roqueiro nato. Seu nome surgiu dos Backstreet Boys, que estavam no auge quando o bebê nasceu. Perguntado sobre o possível placar do jogo contra Camarões, que terminaria em 4 a 1 para o Brasil, Kevin se mostrou indeciso: “Acho que vai ser 2 a 0. Pensando bem, 10 a 0. Não, já sei! Pode escrever aí: 4 a 1”. Acertou.
Já Helena Fantone, de 9, primeiro apostou no 3 a 0. Depois, trocou o palpite para 6 a 1 para o Brasil. Não parou quieta nas cadeiras distribuídas na calçada do Bar da Dalva, na Avenida Getúlio Vargas, onde assistia à partida acompanhada da mãe, a analista ambiental Cecília Almeida, de 32, e do pai, o professor Thiago Torres, de 33. “Quer saber? Vou trocar para 7 a 3. Não, não. O que eu queria dizer mesmo é o Brasil vai ganhar de 9 a 3”, desabafou a menina. “Ganhar de goleada faz parte da imaginação infantil, não é?”, interpreta o pai, com um olhar carinhoso para a filha.
Arquibancada
Na manhã de ontem, o entorno do Mineirão, na Pampulha, também estava repleto de pequenos estreantes na Copa. Um deles era Miguel de Oliveira, de 6, que veio de Petrópolis (RJ) com a mãe, a professora Ana Carolina Carius, de 33, para assistir ao jogo entre Costa Rica e Inglaterra. “É muito difícil desenhar a bandeira da Costa Rica ou do Brasil”, confessa ele, que tinha no rosto as cores inglesas. Ana Carolina conta que a viagem foi planejada há anos, logo que soube que a Copa seria no Brasil. “Guardo dinheiro desde então”, conta. (Sandra Kiefer e Eduardo Tristão Girão)
Campeãs na redes sociais
Durante o jogo de anteontem do Brasil contra Camarões, as mulheres foram as que mais fizeram comentários sobre a Copa no Facebook. Segundo estatísticas da rede social, a faixa etária entre 18 e 24 anos foi a que mais falou sobre a partida. Em seguida ficaram os homens da mesma idade e as mulheres na faixa seguinte (25 a 34 anos). Segundo o Facebook, 18 milhões de pessoas interagiram na rede social durante os jogos da Copa, gerando 41 milhões de curtidas, compartilhamentos, postagem de fotos e publicações. .