Jornal Estado de Minas

Torcedores do Chile lamentam a derrota e choram no meio da multidão de brasileiros

Já os brasileiros, festejaram na Savassi. Euforia e autoconfiança se transformaram em tristeza e decepção

Luciane Vidigal - Especial para o EM Sandra Kiefer - Especial para o EM
Os irmãos chilenos Pedro e Alejandra Escobar se abraçam depois da derrota de La Roja no Gigante da Pampulha - Foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press
Em meio à alegria dos torcedores brasileiros, que depois de quase três horas de sofrimento comemoravam a vitória da Seleção Brasileira nos pênaltis, os chilenos caíram no choro, na Savassi. “O Brasil tem várias outras oportunidades, é pentacampeão. Para nós, chegar onde chegamos foi um sonho”, lamentou Alejandra Escobar, de 31 anos, que veio de Santiago, capital do Chile, torcer por La Roja em Belo Horizonte. Soluçando, ela abraçava o irmão, Pedro, de 23.

“O Chile merecia ganhar. Nossos jogadores são bons e preparados, eles nos trouxeram muitas alegrias. Hoje, infelizmente, o nosso sonho acabou. Mas valeu a pena estar aqui”, afirmou Pedro Escobar.
Os irmãos, que revelaram ter gasto muito dinheiro na viagem ao Brasil, foram consolados por brasileiros, que se dividiam entre a solidariedade à dupla e a euforia da comemoração.

No fim da manhã, os chilenos eram minoria no mar de gente que torcia na Savassi, mas eles não se sentiram acuados pela multidão verde-amarela. “Viemos em um grupo de 10 pessoas. Não conseguimos ingressos para o estádio, então, resolvemos chegar cedo aqui para garantir mesa. Os brasileiros não nos intimidam, vamos cantar mais alto e a vitória será nossa”, disse Joaquim Castilho, de 27.

Enquanto o Hino do Chile era cantado no campo, ouvia-se o animado coro dos torcedores de La Roja em frente à TV. Diferentemente do que ocorreu no Mineirão, os brasileiros aplaudiram respeitosamente o canto entoado com emoção pelos adversários.

Cerveja

Durante o tenso segundo tempo da partida, o clima mudou. Torcedores das duas seleções trocaram provocações em um bar próximo à Praça Diogo de Vasconcelos. A confusão começou com gritos de guerra de ambos os lados e os brasileiros jogaram cerveja sobre os chilenos. Apesar da tensão, não houve maiores problemas.

Encerrado o jogo, a autoconfiança deu espaço à tristeza. Poucos chilenos permaneceram na Savassi para assistir à festa verde-amarela. Enquanto caminhavam para o hotel, três torcedores de La Roja se viram obrigados a aturar provocações: motoristas chegavam a reduzir a velocidade, gritando “chi-chi-chi-lê-lê-lê”.

Eles passaram longe do sufoco

A Copa é do mundo, mas nem todo mundo está ligado na Copa. Diferentemente da maioria dos torcedores brasileiros, alguns moradores de Belo Horizonte passaram incólumes pela agoniada partida entre o time de Felipão e o Chile.
Eles nem sabiam dizer o placar enquanto a bola rolava.

“Parece que está 1 a 0 para o Brasil, não é?”, arriscou o jovem de cerca de 18 anos, que, embora vestisse a camisa da Seleção, tinha outro interesse: disputar uma das quatro prostitutas disponíveis em um hotel da Rua Guaicurus, no Centro. Na verdade, o Chile já havia empatado. “Você acha que vou trocar uma morena dessas por 22 jogadores correndo atrás de uma bola?”, afirmou ele.

Dos 16 hotéis da zona de baixo meretrício, 15 fecham meia hora antes do jogo da Seleção do Brasil e reabrem 30 minutos depois do fim da partida. Na Copa, o movimento cai até 60%. Na única pensão aberta durante a partida de ontem, havia apenas quatro garotas no batente. “Para nós, a Copa foi uma decepção. Parece que os homens estão guardando dinheiro para o churrasco ou ficaram com medo de sair de casa por causa da confusão”, lamentava Bianca de Oliveira, recostada sensualmente na porta do quarto, que deixa entrever a luz vermelha e o slogan “Seu prazer garantido”.

Na Estação Rio de Janeiro, o novo sistema de transporte rápido por ônibus da capital estava às moscas.
No veículo sanfonado que seguia para o Mineirão, o motorista Flávio Conceição conduzia cinco pessoas onde cabem 140. Conformado, ele previa placar de 3 a 1 para o Brasil. Sônia Maria Martins, de 62, era uma das passageiras. “Copa não faz mais a minha cabeça. Prefiro dormir”, revelou a cuidadora de idosos, que bateu ponto ontem para dar banho e fazer curativos no paciente com câncer em estado terminal. “Ele sente dores e precisa de morfina, mas estava louquinho para assistir ao jogo”, disse ela.

Mais à frente, a Avenida Afonso Pena vazia, sem carros nem motos, estava irreconhecível. Dois jovens skatistas aproveitaram a chance para delizar na pista, livre dos veículos. Nem quiseram parar para conversar. Provavelmente, prefeririam descer em ziguezague entre os automóveis, com uma dose a mais de adrenalina.

Na Avenida Bandeirantes, um solitário homem buscava o oposto dos skatistas: sossego. Quase ninguém caminhava na pista de cooper. Quando o juiz apitou o início do jogo, o pecuarista Marco Mattos, de 50, iniciou o treinamento. Ele pretendia andar por duas horas. Não levava rádio nem nada que lembrasse as cores da bandeira brasileira. Nos fones de ouvido, música. “Sempre fui fazendeiro. Quem trabalha na terra não pode se ligar a distrações. Nosso tempo é outro: os bois precisam comer três vezes ao dia, as plantações precisam de cuidados”, filosofou Mattos, que passa cinco dias na fazenda e o fim de semana na cidade grande. .