Sombra, água fresca, futebol e lanche grátis em abrigos e albergues, que passaram a funcionar dia e noite e a abrir excepcionalmente aos sábados durante a Copa do Mundo. Com base nesses atrativos de forte apelo para moradores de rua (80% são do sexo masculino), a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) conseguiu esvaziar trechos da cidade que costumavam ser ocupados por eles. É o caso da região conhecida como Cracolândia, no Bairro da Lagoinha; de áreas embaixo dos viadutos da Avenida Antônio Carlos, no corredor que dá acesso ao Estádio do Mineirão; e até da comunidade “Apartamento 302”, sob o viaduto da Floresta, no Centro.
“Estão dando até lanche para esconder a gente dos turistas, pode escrever aí. Só vai durar enquanto tem Copa. Daqui a 30 dias acabou”, afirma Wellington, de 42 anos, um dos 68 moradores de rua que foram ao Albergue Tia Branca, no Bairro da Floresta, para assistir ao jogo entre Argentina e Suíca, transmitido no telão. Ontem à tarde, ele e o colega Ramiro, de 38 anos, tentaram, sem sucesso, “secar” os hermanos.
Segundo o operador de betoneira desempregado e usuário de crack, além da estratégia inteligente empregada pela PBH, há outra razão para buscar o albergue. “Tem polícia demais na cidade, não dá para ficar na rua.
Quem assistiu aos dois jogos teve direito a jantar, a partir das 18h. Os albergados poderiam também tomar banho e lavar roupa no Centro de Referência da População de Rua (Centro Pop). Antes da Copa, o albergue funcionava apenas para dormir. “É bom demais, mas já avisaram: depois de sábado, acabou”, suspira o ex-garçom Sandro, de 32 anos, há três anos usuário de crack.
O albergue estendeu para a meia-noite o horário para receber novos hóspedes. “A recomendação é não retirar as pessoas das ruas. Porém, se alguém manifestar vontade de ser acolhido, terá vaga”, explica Vanessa Aparecida Rezende, coordenadora do Albergue Tia Branca e membro do Comitê da População de Rua. Ela garante que a unidade fica aberta durante o dia, mas passará a fechar aos sábados. “Com o frio, nosso público aumenta naturalmente. Eles estão mais quietos, pois ficaram com medo das manifestações e do policiamento”, observa.
“Não fazemos ações higienistas em Belo Horizonte, não só no contexto da Copa, mas em nenhuma hipótese. Nosso trabalho é de convencimento, sensibilização e ampliação da oferta de serviços para esse público”, afirma Soraya Romina, coordenadora do Comitê de Políticas para a População de Rua. Embora reconheça a eficácia da ampliação da oferta de serviço durante a Copa, da extensão dos horários nos albergues e da ação de equipes de abordagem social, ela não garante a continuidade dessas medidas depois do Mundial. “Vamos convocar uma reunião no dia 17 para ver o que deu certo e o que não deu”, diz.
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