Há cinco anos, José Antônio dos Santos, de 61 anos, venceu um câncer na garganta e decidiu morar em Florestal, na Zona da Mata de Minas Gerais. Pai de três filhos, dedicado à família e com 40 anos de experiência como motorista de ônibus em Belo Horizonte, José, ontem, viveu a maior derrota da sua vida: enterrar a filha caçula, Hanna Cristina dos Santos, de 25.
Vítima do desabamento do Viaduto Batalha dos Guararapes, na tarde de quinta-feira, Hanna havia telefonado, poucos minutos antes do acidente, para pedir a bênção ao pai. “Eu disse: ‘Deus te abençoe, minha filha’. Ali, nos despedimos”, lamentou José Antônio durante o velório da motorista, cujo corpo foi enterro ontem à tarde no Cemitério Bosque da Esperança, na Região Norte da capital. No momento do telefonema, ele estava em Florestal.
José é exemplo para todos os filhos. Mesmo contra a sua vontade, eles decidiram seguir a carreira de motorista. Desde 2001, o pai dirigia o suplementar que ficou sob o viaduto, mas teve de abandonar a profissão, há cinco anos, por causa de um câncer na garganta. Hanna dividia com o irmão, Tiago, de 28, o volante do micro-ônibus pertencente à família.
Com base no que ouviu de testemunhas, José diz que Hanna havia dado preferência ao BRT/Move que seguia pela pista mista da Pedro I e, por alguns segundos, escapou do acidente. “Além de salvar a vida da minha esposa, Débora Nunes, cobradora do suplementar, ela salvou a vida de muita gente, inclusive da própria filha, que estava no capô do veículo. Em um reflexo, a mãe a afastou da cabine. Hanna é a nossa heroína”, afirmou Tiago. De acordo com ele, a tragédia foi algo “encomendado para acontecer”.
Ana Clara
Durante o velório, o clima era de revolta e tristeza. A filha da motorista, Ana Clara, de 5, foi levada ao cemitério por parentes. A Secretaria de Estado de Saúde informou que a menina deu entrada no Hospital Risoleta Neves apresentando um hematoma no lado esquerdo da cabeça, cefaleia e perda de consciência. Depois de passar por exames, permaneceu em observação e recebeu alta na manhã de ontem.
Uma psicóloga do hospital deu a notícia à menina. Ela acha que a mãe virou uma estrelinha no céu. A criança contou a familiares que, na hora do acidente, Hanna a mandou correr para a parte de trás do micro-ônibus.
Quando chegou ao Bosque da Esperança, Ana Clara foi para o colo do avô, que lhe perguntou se queria “ver a mamãe”. Ela concordou, mas, ao se aproximar do caixão, evitou observar o corpo e pediu para sair. “Hanna e a minha neta eram muito ligadas, esse vai ser o nosso maior problema agora”, desabafou José.
Um clássico de Roberto Carlos marcou a despedida de Hanna.
A irmã de Hanna, Priscila dos Santos, se sentiu mal no momento da despedida e foi carregada para o gramado. “Liguei para o Samu e pedi um suporte. Eles me disseram que tinha de esperar passar mal primeiro. Veja se tem cabimento isso”, reclamou José Raimundo Rocha, parente da motorista. Os pais de Hanna acompanharam o sepultamento à distância. Ana Clara permaneceu no cemitério até o fim da cerimônia. (Com Carolina Braga)
Alegre e amiga
Amigos e parentes dizem que Hanna Cristina era guerreira, festeira, vaidosa, alegre e amiga. Ela chegou a combinar com amigos ir ontem à Fan Fest da Copa, no Expominas.
“Apaixonada pela vida, ela gostava de dançar e viajar. Era muito alegre e trabalhadora, deixava de sair para cumprir seus compromissos com o transporte”, comentou, emocionada, Mariane Vilar dos Reis, de 24, amiga da motorista. Cláudio André dos Santos, tio de Hanna, contou que um dos sonhos da sobrinha era comprar móveis para o quarto da filha. “Ela estava juntando dinheiro para isso”, revelou. (LE).