Jornal Estado de Minas

Estudante de BH supera doença e sonha em ser pesquisadora de neurociência nos EUA

Com diagnóstico de atrofia muscular progressiva tipo 2, Aline de Castro, de 20 anos, foi no programa federal Ciência sem fronteiras e vai estudar no exterior

Jefferson da Fonseca Coutinho

Aline vence desafios e vai aos EUA, acompanhada pela mãe, Rosemary, estudar neurociência para ajudar quem sofre de doenças degenerativas - Foto: Túlio Santos/EM/D.A Press

É a vida de desafios a principal motivação para o estudo, bem maior que Aline de Castro Santos quer levar para o futuro. Ela, aos 20 anos, está decidida a se tornar pesquisadora de neurociência na área de doenças degenerativas. A estudante nasceu com o diagnóstico de atrofia muscular progressiva tipo 2, mesmo quadro do irmão mais velho, Claudio Henrique, de 25. Os dois são a alegria do casal Nelson Santos e Rosemary Castro. Quem vê o sorriso de Aline, ao lado da mãe, não imagina o sufoco de todos os dias para a família. Contudo, não há drama capaz de embarreirar os sonhos da garota. O salto mais alto ela dá agora, de malas prontas para o Kentucky (EUA).

Aline foi aprovada no programa federal “Ciência sem fronteiras”. As últimas semanas foram de batalha para conseguir que a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) – agência governamental vinculada ao Ministério da Educação e Cultura (MEC) – reconhecesse a condição especial da jovem.
Por fim, depois da recusa inicial, o reconhecimento e a liberação de recursos para que Rosemary Castro possa acompanhar a bolsista. Mãe e filha embarcam dia 15.

Logo depois da boa notícia, na quarta-feira à noite, Aline escreveu nas redes sociais: “Fiquei feliz também em saber que minha história serviu para abrir portas a outros deficientes, para que a inclusão seja efetiva! Nunca desista dos seus sonhos, pois somos fortes e suficientes para alcançá-los!”. Na mensagem, a estudante de biologia da PUC Minas agradece a mobilização de amigos e estranhos, unidos em favor de sua família. “Senti que ainda há pessoas boas neste país. Houve pessoas de outros estados que se disponibilizaram a ajudar e fiquei imensamente grata."

Aline, para quem a conhece bem, é modelo de dedicação e força. Mas nem só de livros vive a cadeirante, estudiosa que só ela. “Também gosto de balada”, revela. Conta que não perdeu uma só festa na Savassi durante a Copa do Mundo. No point dos estrangeiros, em BH, ela fez amizades e se divertiu com a turma do Colégio Santa Maria – instituição na qual concluiu o ensino médio – e com os amigos da graduação. Peralta, já deu até alguns “perdidos” na mãe. “É que tem lugar que, se digo a ela que vou, ela não deixa”, diverte-se.

Na sala, enquanto Prince, o poodle, exige participar da conversa, mãe e filha se divertem com as traquinagens trazidas da memória mais recente. Rosemary conta a vez em que Aline chegou ensopada em casa, “toda vermelha de sol”. “Ela disse que estava na casa de uns amigos.
Depois, soube que estava numa festa de pré-carnaval, na Praça da Estação. Ela ficou toda molhada e queimada, porque estava na multidão, debaixo de sol, tomando banho de mangueira”. A mãe conta que, muito querida e enturmada, não falta companhia a Aline nos passeios.

Com um histórico de lutas pelo melhor para os dois filhos cadeirantes, Rosemary se prepara para os próximos 12 meses. Diz que está fortalecida para acompanhar a filha em mais uma etapa de conquistas. Ainda que tenha que reinventar a estrutura de casa por causa de Claudio Henrique, também dependente de seus cuidados. Entretanto, a dona de casa entende que é preciso ajudar a filha a abraçar a oportunidade tão sonhada. “Meu filho entende. Sabe que faria o mesmo por ele.”

Claudio Henrique é formado em ciência da computação e faz pós-graduação em jogos digitais. É também artista plástico de mão cheia, com várias telas em cores quentes e vivas penduradas nas paredes do apartamento no Bairro Silveira, na Região Nordeste de BH. O analista de sistemas trabalha fora e, determinado como a irmã, não deixa de fazer nada por causa da cadeira de rodas.
Aline também já se enveredou pelas artes plásticas, mas reconhece que seu forte é a área médica.

“Gosto muito de bioquímica, imunologia e genética. Quero ser pesquisadora e ajudar as pessoas com descobertas, com tratamentos”, ressalta. No momento, o maior entusiasmo da estudante é com o que a espera em Kentucky, estado da região Sudeste dos EUA. “A escola é em Lexington, uma cidade do interior, que tem como símbolo um cavalo. Lá, na universidade, os cavalinhos ajudam na reabilitação de crianças. Isso é muito interessante.”

 

Saiba mais

Atrofia muscular espinhal proximal tipo 2

Trata-se de uma forma crônica infantil de atrofia muscular espinhal proximal, caracterizada por fraqueza muscular e hipotonia, resultante da degeneração e perda dos neurônios motores inferiores da medula espinhal e do núcleo do tronco cerebral. A prevalência está estimada em cerca de 1 para 70 mil pessoas. A doença é ligeiramente mais frequente nos indivíduos de sexo masculino. A apresentação dos sintomas ocorre entre os 6 e 18 meses de idade (geralmente por volta dos 15 meses). As crianças afetadas têm dificuldade em se sentar de forma independente e são incapazes de se levantar e de andar. A fraqueza muscular – quase sempre simétrica – afeta predominantemente as pernas e os músculos do tronco. 

 

 

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