Gustavo Werneck
Ao receber a denúncia, a Coordenadoria das Promotorias de Justiça de Defesa do Patrimônio Cultural e Turístico de Minas Gerais (CPPC) começou a investigar, mas ainda não tem pistas do paradeiro da imagem. “Trata-se de uma subtração indevida. A imagem de Nossa Senhora é hoje uma peça ‘procurada’ e se encontra na nossa base de dados. Se for encontrada em exposição, será apreendida imediatamente”, informa o coordenador do CPPC, promotor Marcos Paulo de Souza Miranda. Ele lembra que Sant’Ana, como ficou conhecida popularmente, “tem altar em quase todas as igrejas coloniais do estado e é padroeira de muitas cidades nascidas na época da mineração”.
Autor do livro Bambuí nas trilhas da picada de Goiás, sobre o caminho que ligava São João del-Rei a Goiás Velho, antiga Vila Boa de Goiás, Lindiomar dedicou capítulo especial ao desaparecimento da padroeira. Nos estudos, ele verificou que a imagem pertenceu ao Santuário do Caraça, entre Catas Altas e Santa Bárbara, de onde foi adquirida por um padre, durante a construção da matriz de Bambuí, em 1896. “A igreja primitiva foi demolida e essa é outra tristeza que carregamos”, afirma o professor.
Com 1,10m de altura, a imagem de Sant’Ana Mestra, sentada numa cadeira, com a menina de pé, chegou à cidade com a escultura de São Joaquim, seu esposo. “Acreditamos que são esculturas feitas em Portugal, mas ainda não foram tombadas pelo patrimônio”, diz Lindiomar. Ele conta que tomou a decisão de fazer a denúncia ao ler reportagem no EM sobre bens desaparecidos, na qual constava o endereço eletrônico do CPPC. “Atualmente, a Sant’Ana está na sacristia da igreja, quando poderia muito bem estar no seu altar.” Titular da Paróquia de Sant’Ana, o padre João Bosco da Silva celebrou missa ontem à noite em honra à padroeira de Bambuí. “Se devolvessem a imagem, seria muito bom. É uma situação muito triste”, diz. No altar está hoje uma peça de gesso.
CELEBRAÇÃO São Joaquim e Sant’Ana são os pais de Maria, mãe de Jesus. Conta a tradição que o casal, já em idade avançada, não tinha filhos, o que na época para os judeus era motivo de desgosto e vergonha. Naquele tempo, a comunidade judaica aguardava com expectativa a chegada do Messias. Assim, cada esposa judia que engravidava esperava que dela nascesse o Salvador – era uma cultura que valorizava muito a gestação.
Apesar da idade, o casal não perdeu as esperanças e, finalmente, Ana engravidou. Não se sabe muito sobre a vida dos pais de Maria, mas, a Bíblia ensina que São Joaquim e Sant’Ana foram considerados santos. Jesus, por meio do evangelista São Mateus, disse que “é pelo fruto que se conhece a árvore” (Mt 12,33). Inicialmente, apenas Sant’Ana era festejada, mas a partir de 1584 também São Joaquim passou a ser lembrado, em 20 de março. Depois da reforma litúrgica do Concílio Vaticano II, a Igreja unificou a data em que os avós de Cristo deveriam ser celebrados: 26 de julho passou então a ser dedicado a São Joaquim e Santa Ana, também Dia dos Avós.
A Basílica de Sant’Ana, em Jerusalém, foi construída no local onde ficava a casa dos pais de Nossa Senhora e onde Maria nasceu. De acordo com o Livro dos santos, de Noemí Marcos Alba, São Joaquim e Sant’Ana são patronos de pessoas que trabalham na área de mineração, “pois sua descendência, Jesus e a Virgem Maria, pode ser comparada a uma emanação de ouro e prata”.
EXPOSIÇÃO Segundo o promotor Marcos Paulo, aumentaram as denúncias de bens desaparecidos – “alguns deles há décadas”. Ele citou a exposição Patrimônio recuperado, encerrada no dia 20 e fruto da parceria entre o MP, a Secretaria de Estado de Cultura e o Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico (Iepha), como excelente oportunidade para que pessoas do interior pudessem ver o acervo apreendido em operações realizadas desde 2003 pelo MP e polícia e ajudassem a identificar as peças.