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Estado de Minas

EM revela como pessoas com pouca ou nenhuma capacidade de enxergar percebem o mundo

Série mostra um universo de sensibilidade altamente aguçada e força para contornar obstáculos


postado em 24/08/2014 06:00 / atualizado em 26/08/2014 08:23

Apenas em BH, quase 70 mil pessoas enfrentam dificuldades severas de visão(foto: Leandro Couri/EM/D.A.Press)
Apenas em BH, quase 70 mil pessoas enfrentam dificuldades severas de visão (foto: Leandro Couri/EM/D.A.Press)


Ver é bem diferente de enxergar. O sistema sensorial aguçado e a capacidade extrema de percepção dilatam o alcance de quem pouco ou nada vê. No breu das janelas da alma, deficientes visuais esbanjam sensibilidade e apresentam uma visão de mundo que vai longe, além do que se pode observar. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), quase 20% da população tem alguma perda significativa no olhar. A deficiência visual severa é a mais anotada – 3,5% das pessoas declararam ter grande dificuldade ou nenhuma capacidade de enxergar. Em Belo Horizonte, 61.425 cidadãos quase nada podem ver e 7.044 vivem na absoluta escuridão.

Clique aqui para ouvir mais sobre a série "Pelo olhos da alma"

 

Com a disposição de entender um pouco mais a realidade desse grupo de pessoas, o Estado de Minas esquadrinhou vários pontos da cidade por uma semana, de dia e à noite, e encontrou lições de vida e recortes de determinação, superação, tristeza, revolta e alegria. Casos como o da universitária Ana Luiza Martins de Freitas, de 18 anos, cega de nascença, capaz de decodificar um livro na metade do tempo de uma pessoa com visão normal e campeã em esportes paralímpicos. Ou da judoca Deane Silva de Almeida, de 32 – uma das lideranças da Associação dos Deficientes Visuais de Belo Horizonte (Adevibel) –, que fez do esporte força para minimizar a perda de quase toda a visão.

Assista o vídeo em que deficientes visuais falam sobre suas dificuldades no dia a dia


Com pessoas como elas, aprende-se uma nova forma de ler o mundo. O braile, sistema de leitura com o tato para cegos, inventado em 1827 pelo francês Louis Braille, vai perdendo espaço para softwares cada vez mais modernos, que leem em voz alta e-mails, mensagens, livros e jornais. Embora especialistas defendam a importância do braile como “leitura ativa” – que, além do conteúdo, dá ao cérebro do leitor a estrutura do texto, letras e pontuação –, é fato que as novas tecnologias, capazes de aumentar em até cinco vezes a velocidade da “leitura” de qualquer escrita, estão deixando o método tradicional para trás. O desempenho ajuda a explicar o fenômeno: o ritmo da decodificação por meio de sistemas de áudio pode chegar a 250 palavras por minuto, enquanto a média pelo tato não passa de 50.

Gustavo Felipe, de 39, andante apaixonado por Belo Horizonte, diz-se entristecido com a falta de cuidado de grande parte das pessoas com os deficientes. “Se pudesse fazer um pedido, hoje, pediria a visão”, diz. Alegre, sempre “feliz com as novas amizades”, Gustavo, a pedido do EM, descreve um de seus pontos preferidos em Belo Horizonte: a Praça da Liberdade.


Durante a reportagem em série, publicada a partir de hoje, conhecemos adolescentes cegos, tomados por sonhos de caminhos menos difíceis. Politizados, eles falam do desafio de viver em “mundo pensado para a maioria”. Tateando por esse universo, nos deparamos com pessoas, que perderam a visão já crescidas e falam das memórias dos tempos de luz. Descobrimos também mães apaixonadas, que vivem de emprestar os olhos aos filhos. Associações e ONGs de Minas Gerais e do Brasil também foram ouvidas e expõem cidades e indivíduos pouco preparados para a relação com os deficientes. Em Belo Horizonte, por exemplo, um dos pontos mais criticados é a pista tátil, um arremedo de traço em poucas calçadas da cidade, que costuma terminar em obstáculos ou levar a lugar algum.


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