“É um número preocupante. As vítimas, que muitas vezes vivem o sonho de uma vida de riqueza, acabam se submetendo a ataques verbais, que progridem e muitas vezes chegam a agressões físicas”, afirma a superintendente da Coordenadoria de Proteção à Mulher em Situação de Violência Doméstica Familiar do TJMG, desembargadora de Justiça Evangelina Castilho Duarte. Segundo a desembargadora, a experiência do dia a dia no trato com as ocorrências joga por terra o mito de que só há violência doméstica onde há pobreza. “As pessoas têm essa ideia porque supõe-se que os integrantes de classes mais elevadas, nas quais as pessoas têm mais recursos e maior escolaridade, saberiam resolver seus problemas na base do diálogo, por meio da lei.
A diferença, segundo ela, é que nas classes mais abastadas os casos vêm à tona com menor frequência. “Essas vítimas precisam de um estímulo maior para denunciar, porque muitas vezes são dependentes financeiramente e se sentem mais vulneráveis”, diz. Evangelina Duarte explica que, até chegar à polícia, as mulheres já se sujeitaram a intenso grau de violência, seja verbal, psicológica ou física, e muitas vezes só recorrem às autoridades porque receberam grande incentivo de familiares e amigos para denunciar. “Muitas vítimas acabam fugindo de casa e indo para as casas de parentes”, afirma.
O importante é que, segundo a desembargadora, as mulheres de condições financeiras mais favorecidas estão mais encorajadas a romper o silêncio diante da brutalidade dos companheiros. “Vítimas de todas as condições estão denunciando: de classes alta, baixa e média”, afirma. Em muitos caso, esclarece, o agressor age embriagado, sob efeito de drogas, ou tem uma conduta violenta, segundo ela.
Basta
Cansada de ver o marido oscilar entre a tranquilidade e comportamentos agressivos, a empresária C., de 35 anos, decidiu romper o relacionamento e denunciar o agressor à polícia. Moradora do Bairro Vila Paris, na Região Centro-Sul, ela é o exemplo de que a violência doméstica também se abriga em classes econômicas mais favorecidas. “Nunca achei que isso fosse acontecer comigo, mas vivi, e ainda vivo, momentos de horror com meu ex-marido. Ele sempre teve comportamento agressivo. Era nervoso, se envolvia em confusões, jogava objetos nas paredes em casa, me xingava e uma vez tentou de me jogar do carro, com o veículo em movimento”, lembra, ainda traumatizada. Apesar de nunca ter apanhado, C. constata que todas as atitudes que enfrentou representam extremo grau de violência.
Mas o rompimento não significou tranquilidade. Inconformado com o término do relacionamento, o ex-marido, que também é empresário, deu início a uma rotina de perseguição. “Ele começou a espalhar faixas com meu nome e fotos minhas, dizendo que eu era uma golpista, uma criminosa, e também espalhou injúrias contra mim em redes sociais”, conta. As faixas, segundo a vítima, foram colocadas próximo a locais que ela frequenta, como o salão de beleza, o posto de gasolina ou empresas com as quais mantém relações profissionais. Todos os pontos, de acordo com a mulher, são em bairros da Região Centro-Sul de Belo Horizonte, como Belvedere, São Bento, Lourdes, Gutierrez e Santa Lúcia.
Apesar da denúncia e de ter sido beneficiada por uma medida protetiva prevista na Lei Maria da Penha, a empresária diz ainda conviver com o medo. “Tenho medo de morrer e virar uma estatística. Já presenciei um caso assim, em que o noivo de uma colega a assassinou e depois se matou. Meu ex-marido me persegue. Não tenho sossego.