Pedro Ferreira e Valquiria Lopes
A diferença, segundo ela, é que nas classes mais abastadas os casos vêm à tona com menor frequência. “Essas vítimas precisam de um estímulo maior para denunciar, porque muitas vezes são dependentes financeiramente e se sentem mais vulneráveis”, diz. Evangelina Duarte explica que, até chegar à polícia, as mulheres já se sujeitaram a intenso grau de violência, seja verbal, psicológica ou física, e muitas vezes só recorrem às autoridades porque receberam grande incentivo de familiares e amigos para denunciar. “Muitas vítimas acabam fugindo de casa e indo para as casas de parentes”, afirma.
O importante é que, segundo a desembargadora, as mulheres de condições financeiras mais favorecidas estão mais encorajadas a romper o silêncio diante da brutalidade dos companheiros. “Vítimas de todas as condições estão denunciando: de classes alta, baixa e média”, afirma. Em muitos caso, esclarece, o agressor age embriagado, sob efeito de drogas, ou tem uma conduta violenta, segundo ela.
Basta
Cansada de ver o marido oscilar entre a tranquilidade e comportamentos agressivos, a empresária C., de 35 anos, decidiu romper o relacionamento e denunciar o agressor à polícia. Moradora do Bairro Vila Paris, na Região Centro-Sul, ela é o exemplo de que a violência doméstica também se abriga em classes econômicas mais favorecidas. “Nunca achei que isso fosse acontecer comigo, mas vivi, e ainda vivo, momentos de horror com meu ex-marido. Ele sempre teve comportamento agressivo. Era nervoso, se envolvia em confusões, jogava objetos nas paredes em casa, me xingava e uma vez tentou de me jogar do carro, com o veículo em movimento”, lembra, ainda traumatizada. Apesar de nunca ter apanhado, C. constata que todas as atitudes que enfrentou representam extremo grau de violência. Cansada, depois de três anos de convivência, ela se separou, em janeiro de 2013.
Mas o rompimento não significou tranquilidade. Inconformado com o término do relacionamento, o ex-marido, que também é empresário, deu início a uma rotina de perseguição. “Ele começou a espalhar faixas com meu nome e fotos minhas, dizendo que eu era uma golpista, uma criminosa, e também espalhou injúrias contra mim em redes sociais”, conta. As faixas, segundo a vítima, foram colocadas próximo a locais que ela frequenta, como o salão de beleza, o posto de gasolina ou empresas com as quais mantém relações profissionais. Todos os pontos, de acordo com a mulher, são em bairros da Região Centro-Sul de Belo Horizonte, como Belvedere, São Bento, Lourdes, Gutierrez e Santa Lúcia.
Apesar da denúncia e de ter sido beneficiada por uma medida protetiva prevista na Lei Maria da Penha, a empresária diz ainda conviver com o medo. “Tenho medo de morrer e virar uma estatística. Já presenciei um caso assim, em que o noivo de uma colega a assassinou e depois se matou. Meu ex-marido me persegue. Não tenho sossego. Não sei o que pode acontecer comigo se a Justiça não tomar uma providência séria”, desabafa. Segundo C., o ex-companheiro já descumpriu a medida protetiva por duas vezes: ficou preso por 10 dias, foi solto, mas continuou monitorado por tornozeleira eletrônica. Atualmente, não está mais com o equipamento e, segundo a empresária, mantém a rotina de perseguição. “Não sei até quando isso vai durar”, desespera-se.