“A atitude dela serve de exemplo para quem sofrer no futuro esse tipo de preconceito”, diz o jovem L., de 18 anos. Ele tem agora mais um motivo para se orgulhar da namorada M., de 20. Ela, negra, não se deixou abater e, na terça-feira, denunciou à polícia as ofensas racistas que sofreu via Facebook, após publicar uma foto em que aparece junto do rapaz, branco. Os dois moram em Muriaé, na Zona da Mata mineira, e falaram nessa quarta-feira ao Estado de Minas sobre o incidente, com a condição de não terem reveladas suas identidades. Apaixonado, o casal ressaltou que as agressões virtuais não enfraqueceram o relacionamento.
Foi o rapaz quem primeiro viu as ofensas no Facebook, na tarde do dia 17 . “Não esperava por isso. Na hora liguei para ela”, comenta. Depois de a foto ser publicada, surgiram dezenas de comentários racistas. Um deles questiona onde L. havia comprado a “escrava”. Outro pergunta se ele era “dono” da jovem. M. ficou chocada, mas se manteve firme, com apoio do namorado. “Fiquei triste, chorei. Mas ele foi me dando força, dizendo que eu não deveria ligar para isso”, lembra.
A foto foi reproduzida em outro perfil do Facebook, “Pretinho do poder”, no qual várias pessoas criticaram a discriminação. A jovem se sentiu encorajada a procurar a polícia quando um advogado publicou na rede social comentário enfatizando que aquelas manifestações racistas eram criminosas. “Conversei com o profissional pela internet e ele me orientou a ir à polícia”, relata ela, que na terça-feira procurou a Delegacia Regional de Muriaé para prestar queixa.
O inquérito foi instaurado nessa quarta-feira e está aos cuidados do delegado Eduardo Freitas da Silva, da 31ª Delegacia. Segundo ele, os agressores poderão responder por injúria racial, crime tipificado no artigo 140 do Código Penal, com pena de um a três anos de prisão e multa.
A moça diz que foi a primeira vez que foi vítima de racismo. “São pessoas que nem nos conhecem”, aponta. O rapaz ressalta que ninguém jamais criticou o relacionamento, de um ano e oito meses. Os dois moram em bairros vizinhos. De vez em quando, pelas ruas, os olhares se cruzavam. Ele descobriu o nome dela e a adicionou entre os amigos no Facebook. Na mesma noite, conversara horas pela internet. Encontraram-se no dia seguinte.
Ele, que mora com os pais, concluiu o ensino médio e, enquanto faz um curso técnico de logística, trabalha em uma empresa que produz anúncios de outdoor. Ela também completou o nível médio e, após um curso técnico de corte e costura, está à procura de emprego. A jovem, caçula de três irmãs, mora com uma delas e com a mãe em uma casa simples, em uma vizinhança de ruas calçadas com paralelepípedos.
“A gente já planeja se casar, mas, por enquanto, isso está só na ideia”, diz ela, com um sorriso desinibido, apertando os dedos entre os do namorado. “Primeiro, precisamos nos concentrar nos estudos, para depois termos tranquilidade”, ressalta o rapaz. Ela conta que amigos e conhecidos telefonaram para o casal para saber se o relacionamento continuava firme, depois das ofensas. A jovem garante: “O que aconteceu não nos abalou. Gostamos tanto um do outro quanto antes”.