A chuva que caiu na noite dessa quinta-feira em Viçosa, na Zona da Mata mineira, não foi suficiente para resolver a crise no abastecimento de água na cidade. O manancial do Rio São Bartolomeu, responsável por 55% do fornecimento de água no município, está com nível tão baixo que não consegue escorrer pelo vertedouro da represa, que, por isso, está aberta parcialmente desde quarta-feira. A situação se agrava com o assoreamento do leito do rio, denunciado pelo aparecimento de bancos de areia. A situação provocou até uma disputa entre a Universidade Federal de Viçosa (UFV) e o Serviço Autônomo de Água e Esgoto (Saae) da cidade.
O manancial do São Bartolomeu costumava atingir a marca de 1,4 metro em uma régua vertical fixada junto à represa. Desde quarta-feira, a água não alcança sequer o início da medição, que representa o ponto em que o montante do líquido é suficiente para escorrer pelo vertedouro. “Agora, estamos deixando a água passar por uma pequena abertura da represa. Abrimos o mínimo possível para não correr o risco de passar muito e ficarmos sem reserva”, explica diretor-técnico do Saae, Edson Bhering. “Desde 1971, o nível do manancial não ficava tão baixo”, acrescenta.
Após a represa, a água segue por um leito até um reservatório. Lá, ela passa por cima de uma mureta e cai em duas caixas de captação vizinhas. Em uma delas, usada pelo Saae, o líquido é canalizado para ser distribuído para mais da metade dos quase 60 mil moradores da cidade – deveria verter à taxa de 100 litros por segundo, mas hoje a vazão é de cerca de 45 litros por segundo. A outra caixa é empregada pela UFV para o abastecimento do campus, frequentado diariamente por cerca de 20 mil pessoas, segundo o chefe da Divisão de Água e Esgotos da instituição, Rafael Bastos. A vazão habitual de 50 litros caiu para 20 a 25 litros por segundo, diz ele.
A situação provocou concorrência entre o Saae e a UFV. O Saae instalou tubos espessos que buscam a água e a transporta para dentro de sua caixa de captação. “Na terça-feira, coloquei mais dois tubos, o que fez a vazão subir de 38 para 45 litros por segundo. Hoje temos cinco tubos”, diz Bhering. O chefe da Divisão de Água e Esgotos da universidade afirma que a medida reduziu ainda mais o líquido vertido na caixa da instituição, que também precisou instalar seus próprios tubos. “Havia uma disputa velada por água, cada um tentando tirar mais água do que o outro. Agora temos um acordo: ninguém mais tomará medidas unilaterais”, afirma Bastos.
O Saae planeja incrementar o sistema de abastecimento alimentado pelo São Bartolomeu com água da outra estação de tratamento da cidade, responsável por abastecer 45% dos moradores. Até o fim de semana, uma tubulação deve ser instalada para ampliar a conexão entre os dois sistemas, afirma Bhering.
São Pedro
O Saae disponibiliza dois caminhões-pipa para levar água aos habitantes que sofrem com a falta dela, situação cada dia mais comum na cidade. Na tarde de ontem, um dos caminhão-pipa foi a bairros da parte alta da cidade, os que mais sofrem com a crise no abastecimento. Assim que o veículo parou em uma rua do Bairro de Fátima, a aposentada Catarina do Carmo, de 62 anos, se aproximou e pediu que eles levassem água até o edifício onde mora com o marido, também aposentado. “Chegamos a ficar 14 dias sem água, tivemos que pegar com vizinhos”, reclamou.
No mesmo bairro, o aposentado José Lopes Duarte, de 78, e sua esposa, a dona de casa Maria Aparecida Costa, de 62, acompanharam o trabalho dos funcionários do Saae no edifício onde moram com um filho. O casal vive em Viçosa há cerca de 40 anos. “Nunca tinha faltado água desse jeito. Toda semana falta. Na terça-feira botaram aqui, mas acabou hoje (ontem)”, queixou-se Maria Aparecida. José, acrescenta: “Já entramos no banho com medo de a água acabar de repente. A esperança é que São Pedro nos acuda”.