Resultados iniciais de perícia encomendada pelo Ministério Público de Minas Gerais mostram que a barragem B1 da Herculano Mineração, em Itabirito, na Região Central do estado, se rompeu por causa da instabilidade do talude localizado imediatamente abaixo de plataformas (baias) de secagem de rejeitos. O acidente, na quarta-feira, matou duas pessoas e deixou uma desaparecida. Depois das constatações do laudo técnico preliminar, os promotores apertaram o cerco contra a empresa. Nessa sexta-feira, a Coordenadoria Geral das Promotorias de Defesa do Meio Ambiente por Bacias Hidrográficas a responsabilizou pelos projetos e execução de medidas emergenciais na barragem e definiu em ofício uma série de recomendações. Caso qualquer uma delas não seja cumprida, o MP entrará com ação judicial contra o dono e a diretoria da Herculano.
A primeira das recomendações é para que seja apresentado, em 48 horas, projeto de manutenção da estabilidade de todas as estruturas do local. A empresa deve providenciar outras três propostas em caráter de emergência. Até depois de amanhã, deve estar pronto o plano para o caso de ruptura da barragem B3. A proposta para estabilização do material restante da barragem B1, acompanhado de cronograma, deve ser apresentada em até 15 dias. Já o plano integrado de ações de todas as barragens na área do empreendimento tem prazo de 90 dias. “É uma situação complicada e devemos agir preventivamente”, afirma o coordenador das Promotorias de Meio Ambiente, Carlos Eduardo Ferreira Pinto.
As vistorias e determinações foram feitas em conjunto pelo MP, Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), Polícia Militar e Corpo de Bombeiros, com participação da Herculano e consultores contratados pela mineradora.
O coordenador do Núcleo de Emergência Ambiental da Semad, Milton Olavo de Paiva Franco, explicou que houve no local desmoronamento do minério de ferro processado que era empilhado no interior da B1. O material estava estocado sobre baias e a água que escorria de lá era lançada em uma barragem menor, denominada B2. “Quando a pilha deslizou, a represa B1 se rompeu, o rejeito desceu carregando a B2 e foi parar na B3, no fundo do vale. Desde anteontem as equipes da empresa reforçam a B3, que agora está estável”, disse Franco. O impacto do acidente foi tamanho que gerou vibrações detectadas pela Rede Sismográfica do Brasil, até em estações no estado do Amazonas, segundo o Centro de Sismologia da Universidade de São Paulo (USP).
O coordenador da Semad afirma que a tanto a barragem B1 quanto suas baias eram seguras, de acordo com os últimos laudos da Semad. “A barragem B4, que está desativada, apresenta algumas trincas e erosões e por isso não é usada, mas tem sido monitorada e não apresenta risco de rompimento”, garantiu. Ainda de acordo com Franco, o reforço que está sendo feito no dique da barragem B3 afastará qualquer risco de que a água e o pó lavado do minério atinjam cursos de água e comunidades abaixo da mineração ou que afetem o abastecimento de água dos sistemas dos rios das Velhas e Itabirito, comprometendo o fornecimento de água de Belo Horizonte e região metropolitana. Ontem foi intenso o tráfego de caminhões carregados com grandes blocos de pedra e terra para o reforço da estrutura. Tratores e pás carregadeiras posicionavam as pedras para bloquear a saída da lama.
BUSCAS A equipe de 28 socorristas do Corpo de Bombeiros continua procurando pelo operador de máquinas Adilson Aparecido Batista, de 44 anos, um trabalho lento e perigoso, em uma área instável maior do que a de 22 campos de futebol. Ontem, as buscas terminaram somente à noite, devido a uma pista que deu esperança às equipes: por volta das 18h, os cães farejadores indicaram um local onde poderia estar o trabalhador. Apesar das escavações, nada foi encontrado. Hoje, o trabalho será retomado no mesmo ponto.
A Polícia Civil informou ontem que na segunda-feira um equipe de peritos de Belo Horizonte vai trabalhar na represa. Também no início da semana, a delegada de Itabirito, Mellina Isabel Silva Clemente, vai convocar ex-funcionários da empresa, uma engenheira e dois sobreviventes do desastre. Ela começou ontem a ouvir parentes das vítimas e funcionários da Herculano Mineração, mas não foram divulgados detalhes dos depoimentos, para não atrapalhar as investigações.
COPASA A Copasa informou, por meio de nota, que a captação de água da empresa no Rio das Velhas está operando normalmente. “Desde o momento do acidente ocorrido na mineradora em Itabirito, a empresa está monitorando seus impactos e vem tomando todas as medidas necessárias para garantir que o abastecimento de água de Belo Horizonte e região metropolitana não seja afetado.”
‘O medo segue a gente todos s dias’
Da cabine do caminhão de transporte de minério de ferro, o motorista Lúcio Pereira Lima, de 52 anos, passou por momentos de medo nas instalações da Mineração Herculano, em Itabirito. De acordo com ele, escavações para reaproveitamento de minério estavam sendo feitas enquanto obras de reforço ocorriam na estrutura na barragem B1, que se rompeu na quarta-feira. “Era uma loucura o que faziam. Escavar uma barragem perto da base é perigoso demais. Trabalhar dentro de minas é muito estressante e perigoso. Em local que tem barragem, então, é muito pior. Não se para nenhum processo enquanto se faz obras na estrutura que segura os rejeitos. O medo segue a gente todos os dias”, disse. Aparentando estar muito abatido, o motorista foi ontem à mineradora para dar um basta na situação. “Não aguento mais a insegurança, essa incerteza de não saber se vou voltar para casa. Depois que a barragem estourou, então, foi muito pior. Pedi demissão”, afirma.
Os socorristas do Corpo de Bombeiros de Itabirito tratam o rompimento da barragem como uma “tragédia anunciada”. Eles foram os primeiros a chegar ao local do acidente e contam que os funcionarios que lá estavam disseram que um vazamento na represa havia sido reportado à técnica de segurança da Mineração Herculano pelo menos uma semana antes.
Desde 2001 a Herculano, sediada em Itaúna, no Centro-Oeste mineiro, apresentou sete autuações ambientais que renderam multas de fiscais da Feam, sendo quatro infrações consideradas “graves”. Auditores do Ministério Público do Trabalho e do Ministério do Trabalho e Emprego também encontraram situações que consideraram ser ameaças à segurança dos trabalhadores. No relatório gerado na última inspeção, realizada em junho, foram 28 autos de infração lavrados. Na vistoria constatou-se que faltava monitoramento adequado dos taludes (paredões) e bancadas (degraus) da mina. A inspeção verificou ainda não haver um engenheiro de minas responsável que fosse empregado da empresa, o que é exigido por lei. (MP)