Bruno Freitas
Para os taxistas e órgãos de regulação, é concorrência informal, irregular e desleal. Para startups, a oportunidade de convencer motoristas a aderir a uma nova realidade mundial e claro, crescer em cima do serviço. Fenômeno da era digital que vem causando controvérsia em grandes cidades como Madri, Londres e Nova York, aplicativos de carona e transporte executivo chegam a Belo Horizonte cercados de comodidade e conforto. Ao mesmo tempo em que abrem a possibilidade de motoristas particulares se inscreverem no serviço, incrementando a renda, por outro lado, concorrem de frente com o faturamento dos taxistas. Em meio à polêmica, o principal órgão regulador do transporte em Minas, DER-MG, sinaliza que o modelo configura meio de transporte clandestino.
O primeiro software de sucesso a desembarcar por aqui foi o Zaznu (gíria que em hebraico significa algo como “partiu?”). Bolado pelo empresário israelense naturalizado brasileiro Yonathan Yuri Faber, o app, anunciado como de carona solidária, permite solicitar e oferecer caronas a desconhecidos. Cadastre o cartão de crédito, solicite a corrida e no final pague ou não o valor sugerido (80% do cobrado normalmente por um táxi, em média), que é opcional. Desde sexta-feira os belo-horizontinos também contam com o Uber, bem-sucedido modelo desenvolvido em São Francisco (EUA), que oferece transporte executivo remunerado com carros de luxo e motoristas profissionalmente vestidos, que tenham o próprio carro ou trabalhem para empresas de transporte.
“Isso nada mais é do que uma plataforma da web que une motorista e passageiro, funcionando como aplicativo para chamar táxi.
O conceito de carona solidária, aponta Baeta, funciona na prática como um “álibi”. Além de desrespeitar a Lei Federal 12.468, de 2009, que disciplina a profissão do taxista, o transporte clandestino pode ser enquadrado no artigo 47 da Lei das Contravenções Penais (Decreto 3.688, de 1941), que trata do exercício ilegal de profissão. O serviço vem sendo acompanhado pelo órgão há pelo menos seis meses. “No início o passageiro vai com a impressão que é de graça. Mas não é. A carona pressupõe uma relação em que o cidadão não obtém vantagem econômica daquilo. Se fosse uma coisa absolutamente gratuita, naturalmente o poder público não poderia intervir”, afirma.
Baeta ressalta que o fenômeno de car sharing (compartilhamento de carro) se tornou um novo nicho de mercado internacional e em algumas cidades os taxistas tomaram a iniciativa de combatê-lo. Em outras, as autoridades discutem a nova realidade.
Em fevereiro, taxistas cariocas se reuniram contra o Zaznu – o que chamam de “app disfarçado de carona gratuita”. O presidente do sindicato, Luiz Antonio Barbosa da Silva, disse ter solicitado intervenção do Ministério Público e da Delegacia do Consumidor. Silva mostrou aos órgãos competentes que na propaganda dos aplicativos são identificadas frases como: “Você que dirige todo dia, por que não ganhar com isso?” e “Nossos motoristas ganham em média R$ 60 por hora dirigida”. “O serviço se intitula como carona remunerada e o significado de carona é viagem gratuita. Portanto, a remuneração não cabe nesta propaganda, com caráter enganoso. Os sites destes aplicativos têm a intenção de criar uma nova modalidade de transporte de passageiros com remuneração, fato proibido”, reclama.
Ao longo de dois dias, o Estado de Minas monitorou o Zaznu na tela de um smartphone. Sete motoristas apareciam cadastrados em BH, mas nenhum atendeu aos chamados entre o período da tarde e a noite. Yonathan Yuri Faber também não retornou os contatos da reportagem para falar sobre a experiência no Rio e em São Paulo, primeiras cidades a contar com a tecnologia.
O presidente do Sindicato Intermunicipal dos Condutores Autônomos de Veículos Rodoviários, Taxistas e Transportes Rodoviários Autônomos de Bens de Minas Gerais (Sincavir-MG), Ricardo Luiz Faedda, foi procurado mas não retornou os contatos. A BHTrans declarou apenas que trabalha em parceria com a Polícia Militar e o DER para combater o transporte clandestino, com apoio do Ministério Público.
Empresa bilionária
O diretor-geral do Uber em São Paulo, Guilherme Telles, acha normal que as leis não tenham se adaptado aos novos aplicativos. Na capital paulista, a empresa tem política de pró-regulação, procurando explicar aos órgãos reguladores como é o serviço.
O diretor aponta que em Bogotá, na Colômbia, grande parte dos motoristas parceiros da startup são ex-taxistas que agora ganham “quatro vezes mais”. “A gente se vê como mais uma opção de transporte. A cobrança é muito diferente da de um táxi. Às vezes é até mais barato que na bandeira 2. Em média, a Uber é 20% mais barata que um táxi na bandeira 1”, explica, em referência aos valores: R$ 3,50 da tarifa-base, R$ 2,17 por quilômetro rodado, R$ 0,30 por minuto e R$ 10 de tarifa, em BH.
O representante da empresa, que opera em 152 cidades de 42 países e é avaliada em US$ 18,2 bilhões, destaca que a taxa de satisfação é um dos pontos altos do serviço executivo – em BH, para participar, o motorista deve oferecer carros de luxo como Toyota Corolla, Ford Fusion e Hyundai Azera, fabricados depois de 2010. “Os motoristas estão recebendo acima de 4,8 estrelas num total de 5, com 93% de ocupação. Quanto mais as pessoas usam, mais elas gostam de usar.”
O empreendedor Fernando Gadotti, de 29 anos, usava o Uber em São Francisco e agora em SP. Para ele, que recorre ao aplicativo principalmente à noite, as corridas são convenientes. “Já tive problemas com táxi em São Paulo e no Rio”, conta. Ela revela já ter sido ressarcido pelo Uber depois de uma experiência ruim. “O cara estendeu a corrida. Em meia hora me ressarciram pela tarifa justa. Foi uma experiência ruim, mas avaliei como bom o atendimento ao cliente.”
A motorista Marina Barros, de 31, trocou o Volkswagen Polo 2010 com que transportava informalmente turistas no litoral paulista por um JAC J5 2015, sedã executivo chinês. Cadastrada no Uber, Marina garante ter dobrado de renda. A Zaznu promete uma renda mensal de R$ 4 mil.
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