Jornal Estado de Minas

Alunos contemporâneos demandam nova concepção da sala de aula

Desafiadas por uma geração multiconectada e disputando a atenção de alunos com redes sociais e uma parafernália eletrônica nunca antes vista, instituições do ensino médio têm missão de se reinventar. Todas estão em busca da fórmula da aprendizagem no século 21

Sandra Kiefer
'Qual é a utilidade de estudar a função do gameta macho na reprodução das samambaias?', questiona a produtora cultural Franciane Curi, de 49 anos, mulher do músico Túlio Mourão, de 62. Eles preferiam que Maria Clara Mourão, de 18, tivesse acesso a conteúdos mais 'edificantes', como artes, cidadania e sustentabilidade. Ela, porém, cobra de si própria estudar para passar em arquitetura nas provas do Enem, marcadas para novembro. 'Sei que meus pais estão ao meu lado, mas eu mesma sinto a pressão de dar um rumo para a minha vida e de ser um orgulho para eles', diz a jovem, no 3º ano do ensino médio, entrevistada por volta das 20h, na escola, estudando - Foto: Marcos Vieira/EM/D.A Press

Para conversar sobre educação, vamos precisar fazer um pequeno exercício. É rápido. Não vai levar mais que cinco minutos do seu tempo. Primeiro, observe o jovem que está agora ao seu lado. Se estiver complicado, visualize a imagem de uma filha ou um sobrinho. Ok? Com raras exceções, a grande maioria da meninada estará neste exato momento diante de uma tela de celular, tablet ou de um game qualquer. Repare nos dedos, teclando sem parar, nos olhos baixos e nos fones de ouvido, que os isolam do mundo exterior.


Depois do primeiro teste, tente agora imaginar esse mesmo jovem dentro de uma sala de aula, sentado em uma carteira durante quatro horas, assistindo ao professor, de pé, passando matérias no quadro ou na lousa.

E isso com o aluno proibido de ligar sua parafernália eletrônica. E então? Conseguiu? Acha que vai dar certo? Pois saiba que muitos professores e escolas brasileiras do ensino médio ainda buscam a melhor maneira de lidar com esse aluno do século 21, com idade entre 15 e 18 anos, no auge da efervescência de hormônios e dos questionamentos da juventude.


Embora o número de matrículas no ensino médio brasileiro tenha aumentado 120% em 21 anos, passando para 8,37 milhões de matrículas em 2012, menos da metade dos jovens (48%) chega a concluir essa fase da vida escolar, segundo o Ministério da Educação. “Não podemos fazer de conta que não estamos vendo esse nível de abandono e insatisfação dos alunos. Essa realidade é maior na escola pública, ainda que haja também jovens de escola particular que não concluam sua formação, gerando uma perda irreversível de talentos”, alerta Isabel Santana, superintendente da Fundação Itaú Social.


Para a especialista, os alunos contemporâneos demandam, com urgência, nova concepção de sala de aula, que seja implantada desde já nas escolas públicas e particulares. “É inadmissível querer que o adolescente totalmente conectado consiga passar quatro, cinco horas sem poder interagir com o professor e com os alunos”, completa ela, que critica também o currículo escolar do ensino médio, composto de 14 matérias, conteúdo excessivo e professores compartimentados por disciplinas, que não conseguem criar vínculos com os alunos. “Eles entram e saem a todo momento da sala, apressados”, critica Isabel Santana.

 

Apenas tecnologia não é o bastante
Na revolução escolar em curso, a fórmula passa longe de apenas colocar um tablet nas mãos de cada aluno e treinar o professor para escrever em lousas digitais. “De que adianta distribuir 40 tablets para os alunos, sendo que o professor mantém com eles a mesma relação do lápis e do papel, ou seja, continua a passar a matéria no quadro e os alunos copiando no tablet?”, questiona o padre Germano Cord Neto, diretor-geral do Colégio Loyola. Segundo ele, essa relação só irá se transformar efetivamente no dia em que, ao estudar uma equação matemática, ao alterar o x, ocorra uma mudança do objeto no ambiente virtual. “Será uma forma inovadora de perceber o mundo”, antevê.


Na educação do futuro, papéis de professor e aluno devem sofrer mudanças.

“Não estamos nessa cultura ainda. O grosso dos educadores ainda se compreende como detentor e transmissor de conhecimentos. Futuramente eles passarão a ser uma espécie de tutores, de facilitadores, orientando os alunos a terem ganhos de produtividade e a saber acessar textos, vídeos e fóruns até de outros países em relação ao assunto sobre o qual estão estudando. Estamos em uma fase de transição”, lembra o padre.


Ninguém tem ainda a fórmula para resolver o problema, mas alguns testes vêm sendo feitos em Minas e no país. São iniciativas como a criação de comitês com a participação de estudantes nas escolas, que pedem sugestões de melhorias aos maiores interessados na questão: os alunos. Maior envolvimento dos pais também está sendo buscado em projetos-piloto em escolas públicas nos estados de Goiás, Espírito Santo, Pará e Bahia, patrocinados pela Fundação Itaú Social. “Inspirados na reforma educacional de Nova York, contratamos um pai ou mãe em tempo integral dentro da escola, para acompanhar o clima institucional e checar casos como o do aluno que está faltando à aula, ir até a casa dele e procurar saber o que está acontecendo. Essa aproximação é necessária para que a família perceba que a escola não dá conta de tudo sozinha”, afirma a superintendente da instituição.


No Colégio Magnum, a solução foi estimular estudantes do ensino médio a atuar como monitores, tirando dúvidas dos próprios colegas.

“O sucesso das redes sociais traduz a característica da juventude atual, que pensa de forma compartilhada. Os jovens se sentem muito motivados a participar deste projeto e a ajudar os colegas. As notas no Enem melhoram”, constata Marco Antônio Barbosa, coordenador pedagógico da 3ª série do ensino médio.
O perfil do jovem estudante é ser pró-ativo. Segundo especialistas, a tendência é que caia em desuso a palavra aluno, que em latim significa “aquele que recebe a luz”. Como a nova escola está em construção, o termo está sendo criado para redefinir o estudante do novo milênio. “Aprendente” seria uma das possibilidades. A única coisa certa é que o jovem, especialmente no ensino médio, quer ser protagonista do processo educacional.

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