Desde a tragédia, Maria das Graças busca apoio e forças no carinho dos filhos e no sorriso dos netos. “Adilson tinha muitos planos. Pensava em se aposentar dentro de alguns anos, aumentar a sua casa.
ABRAÇO O pequeno Renan, de 1 ano, não para quieto no colo da mãe Patrícia Aparecida Batista, de 35, irmã de Adilson. Na semana passada, ela acompanhou com outros parentes as buscas na área da mineradora e achou melhor não voltar. Às vezes, ela se refere ao irmão no passado –“ele deixou três filhos, Fernando, Raíssa, de 11, e Juan, de 2 anos e nove meses” –, mas depois se corrige, embora sem qualquer notícia.
“Acho que ele pode estar morto. Afinal, foram toneladas de terra. Mas queremos o corpo para enterrar, chorar, enfim, cumprir todo o ritual”, diz Patrícia, que não acredita na possibilidade de o irmão estar vagando por aí, como resultado de uma eventual pancada na cabeça. Com o semblante abatido, ela abraça Renan e diz que confia em Deus. Ao lado, a mãe, evangélica, acrescenta que tem orado muito pedindo respostas e sabe que as receberá: “Só Deus pode fazer isso e dar conforto”.
Para Maria das Graças, o primogênito dos quatro filhos jamais teria motivos parar sumir por vontade própria por um simples motivo: “Adorava a vida”. E revela, sem alterar a voz, que um funcionário da empresa contou que, em seguida à avalanche de rejeitos, Adilson teria caminhado cerca de 200 metros, para depois sumir na lama. Ela reclama da direção da mineradora, a quem já solicitou que mandasse um carro para levá-la ao local onde o filho desapareceu: “Até hoje, nada.
LEMBRANÇAS Pai de três filhos e separado, Adilson morava sozinho, mas gostava de se encontrar com a família no domingo. Era sagrado o churrasquinho, acompanhado de cerveja gelada. “Queimava carne desde a manhã. Essa era a sua diversão no fim de semana”, recorda-se Patrícia. Se a família ainda não entrou na casa de Adilson, tampouco mexeu no veículo, uma Blazer preta, parada na garagem. “Está tudo do jeitinho que ele deixou”, comenta a irmã, consciente do calvário que a família atravessa. “Não tem como disfarçar, vai ficando cada vez mais difícil.
De acordo com o Corpo de Bombeiros, as buscas continuam na área de Herculano Mineração, mas, por enquanto, não há informações sobre o paradeiro do corpo de Adilson. Na tarde de ontem, as equipes se ocuparam da retirada de água de uma poça, local sinalizado por cães farejadores, para fazer as escavações. A Herculano, via assessoria de imprensa, informa que contratou um psicólogo para dar assistência às famílias das vítimas.
Bloqueio de R$ 30 milhões
A Justiça de Itabirito, na Região Central, decidiu pelo bloqueio dos bens da Herculano Mineração, responsável pela mina em que houve o rompimento de uma barragem de rejeitos em 10 de setembro, dos sócios da mineradora e de mais uma empresa em nome dos réus. O decreto atende a um pedido de ação cautelar do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) para garantir a indenização e a recuperação dos danos causados pela tragédia. O valor do bloqueio pode chegar a R$ 30 milhões.
Segundo o MPMG, os impactos do incidente ainda não foram completamente contidos e há riscos de agravamento do desastre ambiental e de comprometimento de abastecimento de água para o município de Itabirito. A ação ressalta que os danos, conforme o ordenamento jurídico, devem ser integralmente reparados e os impactos irreparáveis, compensados. Ainda de acordo com o órgão, “a medida requerida é imprescindível para garantir os recursos necessários à reparação, evitando que a insuficiência patrimonial fosse obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados”.
A assessoria de comunicação da Herculano informou que já foi comunicada da decisão, mas ainda não tem definição sobre a determinação. Segundo assessores, a empresa vai analisar a petição para se pronunciar a respeito. Os trabalhos na mina estão suspensos desde o dia do rompimento da barragem e o Corpo de Bombeiros continua as buscas pelo corpo do operador de retroescavadeira Adilson Aparecido Batista, desaparecido desde o deslizamento de terra. Ainda não foram concluídas as investigações para determinar as causas da tragédia.
O MPMG também informou que continua em curso uma investigação paralela sobre as causas e a dimensão do impacto do desastre ambiental e análise de quais medidas são mais adequadas para reparar e prevenir novos danos.
LAUDO A delegada de Itabirito, Mellina Clemente, disse que a evolução das investigações tem sido “muito positiva” e já tem uma linha de direcionamento para apontar as causas do acidente. Ela prefere não adiantar nada para não atrapalhar as apurações. Informou já ter ouvido 17 pessoas, entre familiares das vítimas, funcionários da empresa e outras testemunhas, e está marcado para hoje o depoimento de profissionais que davam consultoria para a mineradora. Na semana que vem será a vez de técnicos da Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) e de órgãos vinculados, como Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam) e outros. Mellina espera o laudo da perícia para completar o inquérito. (GW e RM)
Corpo que não
foi encontrado
Em 22 de junho de 2001, ocorreu o rompimento da barragem de contenção de rejeitos de minério de ferro da Mineração Rio Verde Ltda., em Nova Lima, na Região Metropolitana de Belo Horizonte. Cinco trabalhadores morreram soterrados pela lama e um deles nunca foi encontrado, embora a morte tenha sido reconhecida pelo juiz da comarca. O acidente aconteceu por volta de 16h45, quando houve o rompimento de parte da represa denominada Cava C1, usada para acondicionar rejeitos originários da Instalação de Tratamento de Minério. O resultado foi o vazamento de material para o vale do córrego Taquaras, causando impacto ambiental na região por onde passou grande volume de detritos.