Mateus Parreiras
As linhas de fogo alto, com labaredas de mais de dois metros, se rebelam contra golpes de chicotes e abafadores na Serra do Cipó. A guerra contra o fogo que já devastou 3 mil hectares do parque nacional, a 100 quilômetros de Belo Horizonte, e outros 5 mil do entorno, é um embate contínuo em áreas que ao primeiro vento voltam a arder. Na manhã desta quinta-feira, um helicóptero do Ibama sobrevoa a área para levantar os focos de queimada e brigadistas já estão no combate ostensivo por terra. Uma aeronave air tractor também atua no combate jogando água, principalmente em áreas onde o fogo ameaça distritos residenciais.
Por causa da falta de segurança e do empenho de todos os funcionários, a unidade de conservação foi fechada por tempo indeterminado, frustrando o passeio de muitos turistas.
A névoa seca e cinzenta de fuligem impede voos de helicópteros e aviões para despejar água sobre as labaredas, uma vez que as chamas estão ardendo a 1.370 metros de altitude. Essas aeronaves não podem operar sem visualizar os alvos e a região é muito íngreme, explica o chefe do parque, Flávio Lúcio Braga Cereso.
Com isso, a tarefa de barrar as chamas que destroem canelas-de-ema, bromélias e flores do cerrado fica restrita a combatentes que se deslocam por solo, a pé ou em jipes, por labirintos de trilhas entre raízes esturricadas. São 85, entre brigadistas do Ibama, do Instituto Chico Mendes de Biodiversidade, bombeiros civis e voluntários de várias cidades.
A equipe do Estado de Minas acompanhou essa ação. Duas picapes foram usadas para transportar os combates e cruzaram um terreno totalmente queimado, com tanta fumaça que tornava os raios do sol avermelhados. Até aparelhos meteorológicos usados para monitorar o clima foram consumidos. No deslocamento sofrido pelas trilhas de pedras, o rádio comunicava baixas. “Traz água para nossas bombas (costais) e um pneu estepe, que o do nosso jipe rasgou”, comunicou um dos motoristas.
Quilômetros à frente, o grupo percebeu que as chamas tinham se alastrado por uma linha de mais de 5 quilômetros. Em poucos minutos, o helicóptero do Ibama – que ainda pode voar por não atuar diretamente no combate, mas sim transportando brigadistas – aterrissou no meio do mato. O co-piloto sinalizou e quatro combatentes desceram do jipe para embarcar. “Vamos, gente. Vamos apagar esse fogo. Preciso de quatro no helicóptero e o resto nos flancos (lados) do incêndio”, comandou, aos berros, o coordenador do ICMBio, Estevão Marchesini. Em questão de minutos, o helicóptero decolou e o coordenador explicou seu destino: “Vão para a parte mais alta, onde devem passar a noite. Cada um tem uma mini-barraca para dormir”.
Enquanto isso, brigadistas atacavam as chamas mais perigosas, com o vento soprando em direção à mata seca. O rosto de cada um pingava suor. De perto, o calor e a fumaça produziam tosse e irritação nos olhos de quem não tinha proteção. Atrás dos combatentes com abafadores, chicotes e jatos de água de bombas costais, vinha outra turma, resfriando as áreas apagadas,para que as labaredas não voltassem.
PERNA ESMAGADA O trabalho é perigoso. Na semana passada, Marchesini conta que um brigadista teve fraturas sérias. “Uma pedra rolou e esmagou a perna dele. Estava a seis horas de caminhada e os companheiros tiveram de improvisar uma maca com cabos de abafadores e três agasalhos anti-fogo. Ele foi operado e está se recuperando”, conta.
Entre os combatentes que lutam contra o fogo no parque, outro que precisou de atendimento médico foi o jovem Ray Soares, de 20 anos. “Inalei muita fumaça e passei mal. Tive de ser levado para o hospital e respirei oxigênio a noite toda. Mas não posso deixar de ajudar. Estou enchendo as bombas costais de água e colaborando na logística”, disse.
O chefe do parque destaca a valentia dos combatentes: “Nossos brigadistas são heróis. Enfrentam o calor e o fogo, põe a própria vida em risco por isso”. “É preciso um comando forte, porque a disposição dos nossos homens é de bravura. Por isso, traçamos estratégias e fazemos de tudo para que todos voltem depois do dever cumprido”, afirma Marchesini, do ICMBio.
(Com Luana Cruz)