Jornal Estado de Minas

Polícia Federal indicia 17 pessoas por venda de gabaritos do Enem 2013

A duas semanas da nova edição do exame, federais indiciam envolvidos em fraude. Quatorze são alunos que podem estar cursando universidades públicas

Guilherme Paranaiba

Investigações começaram a ser feitas pela Polícia Civil, que desvendou esquema de venda de gabaritos, e passaram à polícia federal, por envolverem concurso nacional - Foto: Beto Novaes/EM/D.A PRESS

Dezessete pessoas foram indiciadas pela Polícia Federal por fraude no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) de 2013. Três são acusados de integrar a quadrilha que vendia respostas para os candidatos e 14 são alunos que fizeram os testes, segundo a PF de Minas Gerais, e podem ter usado a artimanha para ingressar em universidades públicas. A duas semanas das provas de 2014, é a primeira vez que a corporação admite a fraude, com base em um inquérito aberto em dezembro do ano passado para apurar os fortes indícios de venda de gabaritos, descobertos pela Polícia Civil mineira. Na ocasião, equipe de policiais de Caratinga, no Vale do Rio Doce, desbaratou uma quadrilha que comercializava respostas de vestibulares de faculdades particulares de medicina de Minas e do Rio de Janeiro. Em escutas telefônicas, investigadores descobriram que, dos 21 presos na época, pelo menos dois também operavam com respostas do Enem.

Como o trabalho da Polícia Civil esbarrou em um exame nacional, coube à PF detalhar as investigações sobre a fraude. Além de José Cláudio de Oliveira, de 42 anos, e Quintino Ribeiro Neto, de 67, os agentes federais identificaram mais um integrante da quadrilha. As funções de cada um não foram informadas pela PF, mas a Polícia Civil, na época, indicou que José Cláudio era o líder do esquema.

Ele teria desembolsado R$ 10 mil pelas provas de sábado e domingo do ano passado, que foram apreendidas em seu carro quando ele foi preso. No verso de um dos cadernos, havia cerca de 40 números de celular anotados à mão. Segundo as investigações da Polícia Civil mineira, seriam telefones de clientes que deveriam receber o gabarito via mensagem de celular ou ponto eletrônico.

Com acesso privilegiado às provas, apontaram os investigadores, Cláudio mandava as questões a uma equipe de “pilotos”, pessoas de alto nível intelectual, responsáveis por responder cada item. De posse das respostas, ele as disparava aos clientes, que pagavam entre R$ 70 mil e R$ 100 mil pelo gabarito. Quintino foi apontado pela Polícia Civil como o principal agenciador de candidatos. As investigações encontraram em um endereço de e-mail operado por ele várias fichas e senhas de inscrição no Enem. Essa seria a forma de checar quem tinha se beneficiado, para cobrar o pagamento.

As conversas captadas pela polícia indicaram que José Cláudio ridicularizava a segurança do Enem, apontada por ele como muito mais frágil do que a das faculdades particulares. Em uma das conversas, ele é questionado por um interlocutor. “O Enem é mais fácil?”, pergunta o homem. “É mais fácil, ‘né’? Bagunçado, ‘né’? É tudo escolinha pública que aplica”, comentou Cláudio. “É esse povinho de colégio que toma conta. Não tem detector de metal, não tem nada no banheiro, é tudo uma zona”, completou.
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Segurança

A edição deste ano do Enem terá 8,7 milhões de participantes, 21,6% a mais que em 2013, quando houve 7,17 milhões.

Pela primeira vez, candidatos poderão ser revistados com detector de metal, eliminando uma brecha que no ano passado garantiu a entrada de estudantes com celulares, segundo a polícia. O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), vinculado ao Ministério da Educação (MEC), não informou se todos os candidatos serão revistados ou apenas aqueles sob suspeita, alegando razões de segurança do exame. O número de equipamentos para revista eletrônica também não foi informado.

Em nota, o Inep afirmou que tão logo tomou conhecimento das supostas irregularidades, solicitou abertura de investigação pela Polícia Federal. A instituição informou que tem colaborado com as investigações, mas que ainda não recebeu o relatório da PF. Segundo o texto, se comprovado que qualquer participante teve acesso a vaga no ensino superior em decorrência de fraude, o estudante será punido com exclusão do curso. “Esclarecemos ainda que o Inep trabalha continuamente com a Polícia Federal no sentido de garantir a segurança do Enem”, informou o texto.

Segundo a PF, ao serem indiciados, os envolvidos vão responder por fraudes em certames de interesse público, corrupção ativa e passiva e organização criminosa. Somadas, as penas podem variar de nove a 38 anos de reclusão.

O advogado Alexsandro Victor de Almeida, que representa José Cláudio de Oliveira, negou participação de seu cliente no esquema do Enem investigado pela PF. “As gravações sozinhas não provam nada. Ele só foi envolvido no caso das faculdades de medicina porque é parente de um dos alunos apontados pela polícia como participantes da fraude”, sustenta.
Já Antônio Hermelindo Ribeiro Neto, que representa Quintino Ribeiro Neto, disse que não tem informações para comentar o inquérito da PF. “Nem comigo ele comenta sobre o caso. Mas nega veementemente todas as acusações”, diz. Ambos já respondem a processo na Comarca de Caratinga, relativo ao golpe nas faculdades particulares investigado pela Polícia Civil. Eles ficaram seis meses presos, mas foram soltos em maio e aguardam a instrução do processo em liberdade. (Com Landercy Hemerson)

 

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