Jornal Estado de Minas

Educação falha e mortes no trânsito voltam a crescer

Mortes por acidentes registradas pelo SUS em Belo Horizonte aumentam 19,2% em 2014, depois de quedas anuais consecutivas desde a implantação de projeto de conscientização

Mateus Parreiras
A implantação em 2010 do projeto Vida no Trânsito, que prevê campanhas, desenvolvimento de estratégias e uso integrado de informações, ainda não foi suficiente para reduzir de forma contínua o número de vítimas de acidentes atendidas em Belo Horizonte no Sistema Único de Saúde (SUS).
Levantamento do Datasus, feito a partir de dados enviados pela rede hospitalar credenciada na capital, mostra que o número de mortes nessas unidades de saúde, que vinha diminuindo desde 2012, voltou a crescer este ano. Foram 149 óbitos de janeiro a agosto de 2014, contra 125 no mesmo período do ano passado – alta de 19,2%. Já o número de feridos cresce desde 2011. No comparativo entre janeiro a agosto daquele ano com o mesmo período de 2014, o aumento é de 46%, de 3.169 casos para 4.636.


- Foto: Clique para ver a arte completaO projeto Vida no Trânsito é um compromisso do governo federal, dos governos estaduais e prefeituras em parceria com a Organização Pan-Americana de Saúde (Opas) e a Bloomberg Philanthropies, com ações previstas até 2015 em Belo Horizonte, Campo Grande, Curitiba, Palmas e Teresina. Na capital mineira, a execução do projeto, que inclui uso de informações de órgãos de trânsito e de saúde para políticas de prevenção e ações de conscientização, ficou a cargo das secretarias municipais de Saúde e Educação, BHTrans, Detran-MG, Guarda Municipal e Polícia Militar. Segundo a BHTrans, foram definidos como principais problemas a serem combatidos pelo programa os atropelamentos, acidentes de motocicleta, consumo de bebida alcoólica, juventude vítima do tráfego e excesso de velocidade.



Presidente da Associação Mineira de Medicina de Tráfego (Ammetra), o médico Fábio Nascimento, considera que campanhas e ações previstas no projeto são importantes, mas cobra avanços em conscientização, ferramenta que ele avalia como mais efetiva para reduzir a violência no tráfego. “As campanhas do Vida no Trânsito são ainda muito tímidas, restritas a poucos locais. Isso tinha de ser massivo, repetido à exaustão para os pedestres não atravessarem fora da faixa, sem teclar em celular e sem ouvir música em fones, por exemplo”, avalia. “Os motociclistas também tinham de dirigir com mais consciência. Só esse tipo de campanha pode salvar mais vidas”, acrescenta.

No alvo A violência envolvendo motociclistas e pedestres, considera o presidente da Ammetra, é a que mais preocupa. Mesmo sendo alvo preferencial de campanhas do projeto Vida no trânsito, as internações no SUS de pessoas que conduzem motos, circulam a pé ou em bicicletas e se envolveram em acidentes foram as que mais cresceram em comparação com o ano passado. No caso das motos, os feridos atendidos pelo SUS aumentaram de 2.460 para 2.729 (%2b11%) na comparação dos oito primeiros meses de 2013 e deste ano. A alta chega a 61,5% se comparadas as internações de 2011 (1.690) com as de 2014 (2.729). As mortes de pessoas em motos nos hospitais aumentaram 34% entre 2013 e 2014, de 38 para 51 registros.

Ontem, por volta de 10h30, o vistoriador de seguros Túlio Rafael Martins Veiga, de 25 anos, sentiu na pele a violência do trânsito. O jovem estava trabalhando e seguia pela Avenida Uruguai, no Carmo, para o Bairro São Pedro, na Região Centro-Sul, quando bateu no para-choque dianteiro de um Toyota Fielder no cruzamento com a Avenida Nossa Senhora do Carmo. A batida foi tão forte que afundou o para-choque do automóvel e quebrou a perna direita do motociclista, que ficou estirado no asfalto. Equipes do Samu, da Polícia Militar e da BHTrans interditaram duas faixas opostas das pistas centrais da Nossa Senhora do Carmo para que o ferido fosse imobilizado e levado para a ambulância que o transportaria até o Hospital de Pronto -Socorro João XXIII.

O Toyota era conduzido pela professora Lilian Sampaio, de 60 anos, que estava assustada com a situação.
“Não vi nada. O semáforo da Uruguai abriu. Meu carro era o terceiro da fila e, quando atravessei a Nossa Senhora do Carmo, escutei um barulho muito forte. Só quando parei é que vi o rapaz da moto caído”, contou. A visão do homem ferido deixou a professora abalada. “Mesmo estando certa, a gente sente pena de ver uma pessoa machucada, com a perna quebrada”, disse Lilian. Um dos policiais que atendeu ao caso foi o soldado Érico Teixeira, do Batalhão de Polícia de Trânsito (BPTran). De acordo com ele, o número de acidentes e feridos em cruzamentos perigosos como o da Nossa Senhora do Carmo é maior do que consta nos registros. “A gente sabe que tem mais batidas, mas nem todas são registradas por quem se envolveu. Aqui é preciso ter atenção, paciência e observar atentamente a sinalização para atravessar com segurança”, afirmou o policial.


No caso dos pedestres, as internações pelo SUS de janeiro a agosto passaram de 812 em 2013 para 875 no ano passado. O crescimento é de 7,7%, mas que chega a 22,4% se levadas em conta as 715 pessoas internadas em 2011, quando o projeto iniciou sua coleta de dados.

Casos menos graves O Detran-MG não designou um porta-voz sob a justificativa de que ontem era ponto facultativa por causa do Dia do Funcionário Público. A BHTrans indicou a Secretaria Municipal de Saúde para informar sobre o projeto Vida no Trânsito. De acordo com a secretaria, o projeto busca “modificar o comportamento de risco no trânsito para reduzir lesões graves e mortes por acidentes”.

Apesar das informações mais recentes do SUS, a secretaria ressaltou que o banco de dados do projeto, sem balanço consolidado de 2013 e 2014, indicou queda de 27% nos óbitos entre 2011 e 2012, de 338 para 248 – a estatística de mortes no SUS é menor do que o do banco de dados do projeto porque só inclui casos atendidos na rede hospitalar credenciada. Na estatística da secretaria, houve 1.794 internações por acidentes de trânsito em Belo Horizonte em 2011, contra 1.819 em 2012, alta de 1%. “A diminuição dos acidentes propiciou economia da ordem de R$ 8 milhões para o município e para União, referentes às vidas poupadas, e de cerca de R$ 10,5 milhões, quanto à redução de feridos graves”, afirmou a pasta por meio de nota.

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