Jornal Estado de Minas

NOSSA HISTÓRIA

Mosteiro de Macaúbas, em Santa Luzia, celebra 300 anos de fé e tradição

Antigo recolhimento e uma das primeiras escolas femininas de Minas, Mosteiro de Macaúbas, em Santa Luzia, completa 300 anos de história. Complexo colonial abriga freiras enclausuradas

Gustavo Werneck
Satisfeitas com a adesão de voluntários à campanha de restauração do mosteiro, irmãs preparam celebração que vai até dezembro - Foto: Beto Novaes/EM/D.A Press

O  jardim está pronto e iluminado, a fachada, toda pintada de azul e branco e os corações, em festa para comemorar os 300 anos de história do Mosteiro de Nossa Senhora da Conceição de Macaúbas, em Santa Luzia, na Região Metropolitana de Belo Horizonte. A grande celebração será no período de 6 a 8 de dezembro, mas, até lá, as freiras concepcionistas, que vivem em regime de clausura, terão uma série de atividades religiosas a cumprir e ações culturais para oferecer à comunidade. Hoje, às 18h, haverá missa em agradecimento aos benfeitores da instituição (veja programação), com um momento especial: procissão luminosa de reentronização da imagem recém-restaurada de Nossa Senhora da Piedade à capela do convento. “Vamos cantar para saudar a padroeira de Minas”, diz a irmã Maria Imaculada de Jesus Hóstia, encarregada das obras de restauro e organização dos festejos.


- Foto: Beto Novaes/EM/D.A PressSatisfeita com a participação de voluntários na campanha de restauração do mosteiro, principalmente para requalificar a área frontal denominada Praça Félix da Costa, a irmã conta que a iluminação do espaço era um sonho de décadas. “O resultado ficou muito bom e, agora, estamos arrecadando dinheiro para pagar a mão de obra da pintura”, afirma. Com trajetória tão longa, o mosteiro tem muito para mostrar. Por isso mesmo, ainda este mês será aberta exposição de documentos antigos na Sala de Conferências do convento dirigido pela abadessa Madre Maria Auxiliadora. A edificação de 6,6 mil metros quadrados é tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico (Iepha) e Prefeitura de Santa Luzia.



Conhecer o Convento de Macaúbas, como é carinhosamente chamado, representa experiência única: ali estão 16 freiras, roseiras para fazer vinho, muitas orações e trabalho duro. Na entrada principal, onde se lê a palavra clausura, vê-se em destaque a pintura de um personagem fundamental nesta história tricentenária: o eremita Félix da Costa, que veio da cidade de Penedo (AL), em 1708, pelo Rio São Francisco, na companhia de irmãos e sobrinhos. Demorou três anos para chegar a Santa Luzia, onde construiu uma capela dedicada a Nossa Senhora da Conceição, de quem era devoto. Mas, antes disso, bem no encontro das águas do Velho Chico com o Rio das Velhas, na Barra do Guaicuí, em Várzea da Palma, Região Norte do estado, ele teve a visão de um monge com hábito branco, escapulário, manto azul e chapéu caído nas costas. “Ele se viu ali. Foi o ponto de partida para a fundação do Recolhimento de Macaúbas”, conta a madre superiora, explicando que o quadro e uma estátua de Félix da Costa foram feitos no século passado por uma irmã concepcionista.

RECOLHIMENTO No século 18, quando as ordens religiosas estavam proibidas de se instalar nas regiões de mineração por ordem da coroa portuguesa, para que o ouro e os diamantes não fossem desviados para a Igreja, havia apenas dois recolhimentos femininos em Minas: além de Macaúbas, em Chapada do Norte, no Vale do Jequitinhonha. Conforme os estudos, tais espaços recebiam mulheres de várias origens, as quais podiam solicitar reclusão definitiva ou passageira. Havia, portanto, uma complexidade e diversidade de tipos de reclusas, devido à falta de estabelecimentos específicos para suprir as necessidades delas. Assim, os locais abrigavam meninas e mulheres adultas, órfãs, pensionistas, devotas, algumas que se estabeleciam temporariamente, para “guardar a honra”, enquanto maridos e pais estavam ausentes da colônia, ou ainda como refúgio para aquelas consideradas desonradas pela sociedade da época.

Na época do recolhimento, Macaúbas recebeu figuras ilustres, como as filhas da escrava alforriada Chica da Silva, que vivia com o contratador de diamantes João Fernandes. A casa na qual Chica se hospedava fica ao lado do convento. Como parte do pagamento do dote das filhas, Fernandes mandou construir, entre 1767 e 1768, a chamada Ala do Serro, com mirante e 10 celas (quartos para as religiosas). Em 1770, o mestre de campo Ignácio Correa Pamplona assinou contrato para construir a ala da direita da sacristia (Retiro), igualmente dividida em celas. A construção tem ainda as alas da Imaculada Conceição, Félix da Costa (a mais antiga) e a de Santa Beatriz, onde se encontra o noviciado do mosteiro.


Nova iluminação é uma das atrações para admiradores do complexo - Foto: ADALBERTO MATEUS/DIVULGACAO

Em 1847, o recolhimento passou a funcionar também como colégio, tornando-se um dos mais tradicionais de Minas. Essa situação durou até as primeiras décadas do século 20, quando a escola entrou em decadência, devido à chegada de congregações religiosas europeias com grande experiência na educação de meninas. O tempo passou até que, em 1933, a construção passou a abrigar o mosteiro da Ordem da Imaculada Conceição.

Nesta história, um dos principais nomes é o da irmã Maria da Glória, que ficou mais de duas décadas doente sobre uma cama e morreu em 21 de janeiro de 1986. Muitos católicos atribuem à intercessão da freira diversas graças alcançadas. Em 1965, a extinta revista O Cruzeiro, dos Diários Associados, documentou momentos do cotidiano no mosteiro: as irmãs lavando roupas ou caminhando pelo pátio e a imponente construção colonial em meio ao coqueiral. Muito tempo depois, o Estado de Minas registrou a irmã Maria da Glória, enferma, acompanhada de outra religiosa.

A capelinha erguida por Félix da Costa em 1714, início de toda a trajetória, não existe mais, embora algumas peças primitivas estejam guardadas. “Temos ainda o cofre que Félix da Costa usava para pedir esmolas a fim de erguer o templo”, explica a irmã Maria Imaculada. De acordo com as pesquisas, o eremita seguiu, em 1712, para o Rio de Janeiro, onde obteve do bispo dom frei Francisco de São Jerônimo – na época, ainda não havia a diocese de Mariana, a primeira de Minas – licença para usar hábito e pedir esmolas.
Mais tarde, recebeu autorização para abrir o recolhimento feminino, no qual ficaram suas irmãs.



PROGRAMAÇÃO


» Hoje
18h – Missa em ação de graças pelas execução de obras (iluminação da Praça Félix da Costa, recuperação da rodovia de acesso) e de agradecimento aos benfeitores que participam da comemoração do tricentenário.

» Dias 21 a 23
Tríduo celebrativo, com participação de religiosos da ordem das concepcionistas de todo o país. No dia 22, às 15h, haverá conferência aberta aos leigos; no dia seguinte, missa solene às 10h30, presidida por frei Estêvão Ottenbreit, assistente da Federação Imaculada Conceição.

» Dia 27
Início da novena, com a presença do bispo auxiliar de BH, dom Wilson Luís Angotti Filho. Bênção da primitiva imagem restaurada de Nossa Senhora da Conceição e cortejo em direção à capela.

» 6 a 8 de dezembro
Festa para comemorar o tricentenário, com missas em latim, procissão e presença do arcebispo metropolitano de Belo Horizonte, dom Walmor Oliveira de Azevedo, do arcebispo emérito, cardeal dom Serafim Fernandes de Araújo, comunidades religiosas e leigos.

.