Diante da obra na sala dedicada ao mestre Ataíde, no segundo andar do museu, José Efigênio aponta o soldado romano no lado esquerdo do óleo sobre tela que, sem moldura, mede 91cm por 83cm. “Não tenho dúvida de que se trata de Aleijadinho, cuja cabeça, tronco e braços se encontram bem enquadrados pela cruz”, afirma o artista plástico, ao citar o trecho do livro de Bretas: “Antonio Francisco era pardo escuro, tinha voz forte, a fala arrebatada e o gênio agastado; a estatura era baixa, o corpo cheio e mal configurado, o rosto e a cabeça redondos e essa (cabeça), volumosa; o cabelo preto e anelado, o da barba cerrado e basto; a testa larga, nariz retangular e algum tanto pontiagudo, os beiços grossos, as orelhas grandes e o pescoço curto”.
Resumindo as feições de Aleijadinho, conforme os escritos, José Efigênio afirma: “Ele era baixinho, forte e corpulento, muito diferente do retrato feito no século 19 por Euclásio Penna Ventura” – trata-se de um óleo sobre tela considerado o retrato oficial do mestre do barroco, em exposição no Museu Mineiro, em Belo Horizonte. Vinte e cinco anos mais novo do que Aleijadinho, Ataíde, nascido em Mariana, teria trabalhado com ele na Igreja de São Francisco de Assis, em Ouro Preto, uma das obras- primas do período colonial e eleita, em 2011, uma das sete maravilhas de origem portuguesa no mundo.
Retratos
Na avaliação de José Efigênio, Antonio Francisco Lisboa deve ter sido retratado para o quadro quando estava na faixa dos 50 anos. “Em todos os movimentos artísticos, é muito comum os artistas se pintarem. Nós temos Guignard desenhado por Scliar, Bené da Flauta pintado por Jair Inácio, Estêvão por Guignard, Amilcar de Castro por Bracher. Eu mesmo já pintei Nelo Nuno, Petrus, Roberto Resende, Sussuca e Xiquitão. Por que, então, não teríamos retratos de artistas feitos por outros que viveram no século 18, em Vila Rica (atual Ouro Preto)?”, indaga José Efigênio num contraponto com artistas contemporâneos.
Na pesquisa, registrada em cartório de Ouro Preto, o artista plástico explica que, “no século 18, passaram por Minas grandes pintores e, entre eles, houve muitas trocas artísticas, muita conversa. O mais consagrado foi Ataíde, pintor excepcional, dono de traço vigoroso que se iguala aos grandes mestres europeus. Tomou como modelos para suas pinturas familiares e amigos. Pintou telas, murais, altares, deixando sua obra máxima no forro da Igreja de São Francisco de Assis, de Ouro Preto”. O quadro Jesus cai carregando a cruz pertencia originalmente à Matriz de Nossa Senhora do Pilar.
“Aleijadinho ficou famoso em vida e era muito requisitado para trabalhar nas principais vilas de Minas. No entanto, poucas referências sobre artistas (modo de vida, aprendizagem do ofício etc.) chegaram aos dias de hoje. Felizmente, devido à notoriedade das obras de Aleijadinho, relatos e documentos foram encontrados.
Alegações de quem tem dúvida
O escritor Rui Mourão, diretor do Museu da Inconfidência, instituição que completa 70 anos, explica que não há possibilidade de se comprovar se Aleijadinho realmente foi retratado no quadro de Ataíde. “Não tem jeito, acredita-se ou não, pois não há prova real, embora seja possível encontrar elementos de uma descrição na pessoa retratada”, diz o diretor, que não deixa de considerar a pesquisa “interessante”. “A figura do quadro tem vitalidade, bem diferente do retrato oficial”, ressalta Mourão.
Com uma exposição – Tributo de Bracher aos 200 anos de morte de Aleijadinho – no MM Gerdau Museu das Minas e do Metal, na Praça da Liberdade, em Belo Horizonte, o pintor Carlos Bracher se surpreende, pois nunca ouviu falar no assunto. “Se isso tivesse ocorrido, certamente já teria vindo à tona nos últimos 200 anos, já que a história envolve dois grandes artistas”, diz o pintor, lembrando que Ataíde retratou a mulher dele como Nossa Senhora, no forro da capela-mor da Igreja de São Francisco de Assis, em Ouro Preto, e o fato se tornou conhecido. “De todo jeito, a tradição oral teria preservado esta história, portanto, não acredito”, afirma.
O especialista e professor de restauração Silvio Rocha Viana de Oliveira, de Ouro Preto, põe fé e arremata: “O José Efigênio é um pesquisador cuidadoso, tem olhar investigativo, está sempre procurando informações, relacionando fatos e percebe detalhes numa obra que ninguém havia levado em consideração”.
Belo Horizonte
» Dia 18, às 20h – Dia do Barroco, com solenidade na Assembleia Legislativa de Minas Gerais, com lançamento de medalha comemorativa com a imagem do Profeta Daniel, de Aleijadinho, que venceu em votação popular
Sabará
» Dia 18, às 20h30, na Igreja de Nossa Senhora do Carmo,concerto da Orquestra e apresentação do Coral da Sociedade Musical Santa Cecília
» Dia 21, às 9h, no Teatro Municipal, seminário Aleijadinho e o Barroco, com palestras de especialistas
Ouro Preto
» Dia 18, às 19h – missa solene na Igreja de São Francisco de Assis, entrega da Medalha do Aleijadinho e descerramento de placa alusiva à data
Mariana
» De 18 a 21, exibição do documentário Nos passos de Aleijadinho no Museu da Música (das 8h às 11h30 e das 13h30 às 16h30). De 18 a 22, no Museu de Arte Sacra, mesmo programa (das 9h às 12h e das 13h às 17h)
São João del-Rei
» De 15 a 20, às 20h, no Teatro Municipal, concertos Semana da Música.