Ouro Preto – O que era uma simples disputa política se transformou em polêmica histórica no coração de uma das joias do patrimônio mineiro. Desde a última quarta-feira e pelo menos até a próxima segunda, a Praça Tiradentes, no Centro Histórico de Ouro Preto, reabriu as portas para o estacionamento de veículos, em decisão que deixou a cidade em pé de guerra. A proibição de parar carros no cartão-postal do município valia desde o início do ano, estabelecida pelo Decreto 3.705, de 30 de janeiro, mas a controvérsia sobre o tráfego no local já dura quase sete anos. O último lance da briga veio com o afastamento do atual prefeito, José Leandro Filho (PSDB), por decisão do Tribunal Regional Eleitoral (TRE). Ao assumir interinamente o cargo, em uma de suas primeiras providências o presidente da Câmara Municipal, Leonardo Edson Barbosa (PSDB), conhecido como Léo Feijoada, reabriu as vagas na praça. Comerciantes festejaram, enquanto entre moradores e turistas houve quem se revoltasse, por entender que a medida é um atentado ao aspecto visual e à preservação do entorno.
Ontem, depois de voltar à prefeitura sob força de liminar, José Leandro adiantou que pretende retomar a proibição na semana que vem. Afastado pelo TRE em ação interposta pela oposição, que questiona a prestação de contas em mandato de 1988, o prefeito voltou ao cargo por decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Em sua terceira gestão, o chefe do Executivo municipal garante que suas contas foram aprovadas e deixou claro que a disputa sobre o tráfego no Centro Histórico terá novos capítulos.
Ao Estado de Minas, o presidente da Câmara, Léo Feijoada, explicou sua motivação para a polêmica liberação das vagas na Praça Tiradentes.
Origem A disputa sobre a parada de veículos na Praça Tiradentes vem de 2008. Na época, um termo de ajustamento de conduta (TAC) foi firmado entre o Ministério Público e a Prefeitura de Ouro Preto para humanização do espaço. Foi nessa ocasião que ilhas para travessia foram construídas, próximo à entrada do Museu da Inconfidência e à Escola de Minas. Em 2013, as estruturas foram removidas por ordem do prefeito José Leandro, que acabara de assumir a administração. “Ele foi notificado a comprovar que a medida estava dentro do acordo para humanização da praça e, por isso, fez um grande projeto, inclusive com a proibição do estacionamento”, explicou o promotor Domingos Ventura de Miranda Júnior, da 4ª Promotoria de Ouro Preto. O documento, no entanto, ainda está sendo analisado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
Na tarde dessa sexta-feira, o promotor afirmou que aguarda os próximos passos do prefeito para se manifestar no inquérito do MP sobre a situação das regras de tráfego de veículos e pessoas e do aspecto visual na praça. “Com a liberação da parada de carros, o problema tende a piorar, mas somente a vedação do estacionamento não é suficiente para humanizar o espaço e deixar o local livre para pedestres”, afirmou Domingos Ventura.
Ontem, a movimentação de carros no entorno da Praça Tiradentes era intensa. Além das vagas na área central, a permissão para estacionamento foi garantida na rua em frente à Câmara Municipal e à Escola de Minas, onde apenas uma faixa ficou livre para o trânsito. Com o tráfego pesado, motoristas sinalizavam uns para os outros, na tentativa de conseguir fluidez.
Para a empresária Carina Fernandes, de 42 anos, que há dois se mudou do Rio de Janeiro para Ouro Preto, a proibição deve prevalecer. “As pessoas precisam de uma praça com menos carros para aproveitar melhor o espaço. Tanto para quem mora aqui, quanto para os turistas”, defende. Há dois dias na cidade, o casal de turistas Alice Verônica Lira, de 36, e José Givanildo Santos, de 42, também se diz a favor da proibição. “Este é um local histórico e merece ser preservado. Estacionamento não combina com o lugar, pois a paisagem e o conjunto arquitetônico devem ser valorizados”, afirma Alice, que veio de Recife com o marido e os filhos João Arthur, de 3, e Gabriel, de 6.
Mas entre comerciantes, o dia ontem era de comemoração. Para Carlos Henrique de Souza, que tem loja na Praça Tiradentes, a permissão da parada vai garantir melhoria das vendas, que, segundo ele, caíram em torno de 50%. “Foi um período de agonia para todos nós. O turista que vem aqui precisa de lugar para parar. Sem vagas, ele passava direto e ia para Mariana ou Lavras Novas”, disse.
Polêmica histórica
Confira os lances da disputa que envolve o tráfego no coração da cidade que é Patrimônio da Humanidade
2008 – Prefeitura de Ouro Preto assina termo de ajustamento de conduta com o Ministério Público para humanizar o tráfego na Praça Tiradentes. Na ocasião, intervenções viárias, como a construção de ilhas para pedestres e elevação de passeios, foram feitas pelo município.
2013 – O prefeito José Leandro (PSDB) assume o cargo e ordena a retirada das ilhas. Notificado pelo MP a se explicar, ele apresenta projeto que prevê, entre outras medidas, a proibição do estacionamento no entorno da Praça Tiradentes.
2014 – Em 30 de janeiro é editado o Decreto Municipal 3.705, proibindo o estacionamento na Praça Tiradentes.
6 de novembro – O Tribunal Regional Eleitoral decide pela impugnação do registro do prefeito José Leandro, em ação que questiona a prestação de contas em mandato de 1988.
12 de novembro – O prefeito é afastado. Assume o cargo, interinamente, o presidente da Câmara Municipal, Leonardo Edson Barbosa, o Léo Feijoada. No mesmo dia ele revoga o decreto de proibição e libera o estacionamento no entorno da praça. Também demite 40 funcionários municipal e exonera secretários municipais de Turismo, Obras, Casa Civil e Cultura.
13 de novembro – O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) suspende decisão do TRE, permitindo, por meio de liminar, que José Leandro volte à prefeitura.
14 de novembro – O prefeito reassume e afirma que vai retomar a proibição de estacionamento no entorno da praça. Comerciantes, porém, deixam claro que apoiam a manutenção das vagas, alegando que vinham tendo prejuízo. .