Os esforços para erradicar as moradias de zonas de risco geológico em Belo Horizonte pouparam as comunidades de mortes por enchentes e desabamentos por pelo menos cinco anos. Mas o abandono em que se encontram alguns desses locais, principalmente porque obras de melhoria estão suspensas, trouxe de volta as invasões e o despejo de entulhos em áreas de preservação suscetíveis a desastres. No Aglomerado da Serra, o maior conjunto de favelas da cidade, com oito vilas que abrigam 39.920 pessoas, espaços desocupados para o programa Vila Viva, da prefeitura, estão sendo invadidos por barracos improvisados e viraram bota-fora instáveis que soterram até nascentes e córregos. A Companhia Urbanizadora e de Habitação de Belo Horizonte (Urbel) afirma que não pode demolir as construções enquanto não forem resolvidas todas as disputas judiciais pendentes.
A queda de braço entre o poder público e as famílias que constroem em áreas de risco se intensificou com a implantação de políticas sistemáticas de urbanização, como o programa Profavela, que completa 30 anos na próxima sexta-feira. Atualmente, o modelo seguido é o do Vila Viva, que remove famílias e as reassenta ou indeniza para abrir vias, instalar redes de esgoto, canalizar córregos, pavimentar e criar áreas públicas e de preservação. Pelo último levantamento da Urbel, de dezembro de 2014, existem 1.924 construções em áreas de risco em BH, uma redução de 87% ante as 14.349 de 1994.
Para chegar à região invadida do Aglomerado da Serra, é preciso atravessar bloqueios do tráfico, o que só é possível com a companhia de líderes comunitários. Na última quinta-feira, a Rua da Passagem, por exemplo, estava fechada por carrinhos de transporte de material reciclável transformados em barricadas móveis.
Do outro lado do beco, a área onde seria implantado o Parque do Pocinho para preservar três nascentes de córregos está sendo invadida por criadores de cabras e se tornou ponto de descarte de entulho que se empilha formando montanhas bem no curso do vale onde se formam enxurradas. Uma ameaça a moradias mais baixas. “Esse abandono ocorreu porque a Urbel não deu sequência à construção da via de ligação da Avenida do Cardoso com as ruas Chaparraus e Caraça. Onde não tem dono, o povo invade mesmo, porque não tem para onde ir”, afirma o líder comunitário Antônio João Barros.
Mais no alto da comunidade, a área conhecida como Primeira Água também representa perigo por ser um barramento de mananciais com vários barracos invadindo área de extremo risco geológico. “As obras começaram e pararam. Deixaram escadas que ligam nada a lugar nenhum e as invasões estão voltando. Um desperdício de dinheiro”, reclama o porteiro José Lima, morador do aglomerado há 30 anos.
JUSTIÇA A diretora de obras da Urbel, Patrícia Batista, diz que, nos dois casos, a companhia não pode demolir as moradias invadidas porque existem disputas judiciais, contestando a desapropriação ou o interesse de espólio familiar. “No caso da Rua da Passagem, o plano de ligação da Avenida do Cardoso não era um projeto, mas um traçado sugerido e que foi adaptado com uma solução melhor numa rua paralela”, afirma.
Patrícia afirma também que o problema do entulho é o mesmo de toda a cidade, porque quem faz obra deixa de contratar caçambas e opta pelo descarte ilegal.