Segundo o presidente do Conselho Municipal da Saúde, Wilton Rodrigues, ao cumprir a recomendação do MP os funcionários dos hospitais podem ser acusados da prática de sequestro ao afastar os bebês do convívio das mães. “Os promotores estão pedindo que os técnicos de saúde delatem as mães e os familiares envolvidos com drogas. Além de quebrar a relação de confiança do paciente, nossos funcionários estão preocupados com a possibilidade de sofrer retaliação”, afirma. “Também não queremos devolver esses bebês para as cracolândias. Será que os governantes vão acordar para o problema das drogas?”, completa.
Desde que a recomendação do MP começou a ser aplicada, 154 órfãos do crack foram levados para abrigos de BH, lotando até dezembro passado quatro instituições especializadas no atendimento a bebê. “Chamar de sequestro é mais uma expressão caricatural. Na verdade, precisamos mostrar que Belo Horizonte tornou-se um caso digno de denúncia nos tribunais internacionais de direitos humanos, ao impor uma medida arbitrária, autoritária e preconceituosa, que condena a criança a se separar da sua própria mãe. A prefeitura não trabalha assim. A gente não desiste da mãe de forma generalizada, antes mesmo de conhecer o potencial de cada uma”, protestou Sônia Lansk, coordenadora da Comissão Perinatal da Secretaria Municipal de Saúde.
JUSTIFICATIVAS
Nessa quarta-feira, ninguém da promotoria foi encontrado para comentar o caso. Ao editar as recomendações, o MP justificava ter tomado esta atitude extrema em decorrência da falta de políticas públicas para gestantes usuárias de crack, que ganhavam os bebês sem acompanhamento pré-natal e frequentavam a cracolândia mesmo grávidas, pondo em risco a vida delas e a da criança na barriga. O principal embasamento era o artigo 19 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que estabelece que toda criança tem direito (…) a ser criada e educada em ambiente livre da presença de pessoas dependentes de substâncias entorpecentes.
Já o parecer jurídico da Secretaria de Saúde contrapõe outro artigo do ECA, que defende o direito da criança e do adolescente de conviver com a sua família e com a comunidade. Em vez de estimular a guerra jurídica entre as partes, Sônia Lansk propõe uma solução conjunta para beneficiar os bebês e as mães com histórico de dependência química em drogas como o crack. “Fizemos um grupo de trabalho e estamos tentando nos organizar para criar uma casa para deixar os bebês e as mães juntos, com uma possibilidade de abordagem social e uma proposta de saída das drogas. Se a promotoria ficar emperrando o processo, podemos entender que a intenção real deles é promover a adoção dos bebês”, afirma a coordenadora da comissão.