Quanto vale uma ofensa, um xingamento, uma injúria racial? Em Belo Horizonte, nesta quinta-feira, custou R$ 200.
De acordo com o músico e produtor cultural Leo Dias, que presenciou toda a cena, nem mesmo os negros têm dimensão da importância em se revoltar contra o preconceito que até hoje é vivenciado no Brasil. " A raça negra foi historicamente segregada e isso ainda ocorre. Fiquei revoltado com o que vi e não podia deixar barato. Me indignei, falei com o senhor que ele estava cometendo um crime e que merecia ser preso. Infelizmente ainda há muita falta de informação e alinhamento das políticas de promoção da igualdade racial com as políticas de coibição ao crime de injúria racial e preconceito", diz.
Segundo o músico, que compartilhou toda a experiência em sua página no Facebook, enquanto argumentava com o homem e explicava que ele não podia falar com a mulher daquele jeito, pessoas que estavam na fila da lotérica se comoveram e aplaudiram.
A mulher, ao ser ofendida, saiu da casa lotérica e retornou com um policial militar, também negro. A autoridade pediu que o senhor saísse do estabelecimento juntamente com a vítima da injúria, para os procedimentos cabíveis. Leo se prontificou em testemunhar o crime e informou seus dados pessoais, mas deixou o local para resolver questões pessoais na esperança de reencontrar a vítima e seu agressor na delegacia. Para sua surpresa, ao passar pela Praça Sete momentos depois, avistou o policial sozinho. Ele perguntou onde estavam o senhor e a mulher e ouviu do militar que o caso estava encerrado. O homem havia oferecido R$ 200 reais para a moça, que prontamente aceitou a quantia e foi embora, segundo a versão do PM, 'rindo de uma orelha à outra'.
"Senti que nem mesmo o policial, que também é negro, teve consciência da gravidade do que aconteceu. Eu agi como uma pessoa que presenciou um crime e tomou uma atitude frente a isso. Infelizmente o desfecho não foi o esperado, mas como julgar uma pessoa que está em dificuldade, precisa do dinheiro e vê a chance de recebê-lo? É uma situação complicada, que mostra que essa questão precisa ser discutida", pondera o músico.
Procurada pela reportagem, a PM informou que a conduta do militar foi correta já que o fato consiste em ação penal pública condicionada, ou seja, o crime só pode ser registrado se a pessoa ofendida decidir prestar queixas. Segundo a corporação, todos os policiais são orientados a instruir vítimas de injúria sobre seus direitos em casos como este, entretanto, não soube dizer se neste episódio específico a mulher foi informada de que, caso não aceitasse o dinheiro, poderia receber indenização ainda maior fixada por um juiz, além de colocar seu agressor atrás das grades. .