Pirapora – O Rio São Francisco deveria estar com seu volume elevado ou pelo menos no seu leito normal nesta época do ano, mas a estiagem mantém o nível do manancial muito baixo. As consequências são drásticas em Pirapora, no Norte de Minas. Sempre muito movimentada no verão, desta vez, a cidade sofre com a falta de visitantes. O Balneário das Duchas do Velho Chico, principal atração turística da cidade, está praticamente seco. Enquanto comerciantes e pescadores reclamam do prejuízo, toda a população está preocupada, porque nunca viu o rio tão vazio em janeiro, e espera dias piores no segundo semestre. Em plena temporada que deveria ser de chuva, a situação já é crítica.
Josué Reis da Costa, de 73 anos, um dos mais antigos pescadores de Pirapora, está apreensivo: “Se não chover, quando chegar setembro, a água do São Francisco vai diminuir mais ainda e ficarão somente aqueles poções no meio do leito, sem condições de navegar”.
Na semana passada, Josué percorreu o rio de barco por cerca de 70 quilômetros no sentido Pirapora/Três Marias. “Tive de descer e andar dentro do rio, empurrando o barco, mais de cinco vezes”, conta o pescador, depois de caminhar no leito seco, próximo à histórica Ponte Marechal Hermes, entre Pirapora e Buritizeiro. O local, hoje vazio, deveria ter um nível de água com pelo menos 1,5 metro de profundidade nesta época do ano, segundo ele.
Ele complementa a renda transportando barcos de pescadores e turistas pelo rio em janeiro, mas agora a realidade é outra.
Velhas
Pirapora, de 51 mil habitantes, a 375 quilômetros de Belo Horizonte, é a primeira cidade abaixo da Usina Hidrelétrica de Três Marias e, por isso, sofre diretamente os efeitos da diminuição do volume de água liberado pela represa, cujo reservatório, hoje com 10,50% da capacidade, tem vazão de 122 metros cúbicos por segundo.
A 15 quilômetros de Pirapora, fica a foz do Rio das Velhas, que também é abastecido pela chuva da Região Metropolitana de Belo Horizonte, onde começa a ser formada a bacia. Mas o volume do Velhas próximo ao seu ponto de encontro com o Velho Chico (distrito de Barra do Guaicuí, município de Várzea da Palma) também está reduzido.
“Estamos no período da piracema, época da reprodução dos peixes. O problema é que os peixes, para se reproduzir, precisam de grande volume de água, para que possam subir o rio e desovar. Como o nível da água está muito baixo, eles não desovam”, afirma o pescador Heberty Rodrigues Castro, de 35.
Outro morador impressionado com a baixa vazão do rio é o aposentado Adalberto Nunes Santos, de 52, que durante mais de duas décadas trabalhou no rio como funcionário da antiga Companhia de Navegação do São Francisco (Franave). Ele recorda que o rio ficou muito baixo durante a grande estiagem de 1971 e 1972. “Mas, desta vez, está pior. Nunca imaginei que o São Francisco fosse chegar numa situação dessa, ainda mais nesta época do ano. O aposentado chama a atenção para a necessidade de contenção da retirada de matas ciliares para interrupção do assoreamento do São Francisco.
Navegar não é possível
Única embarcação no mundo movida a lenha, o vapor Benjamin Guimarães ficou conhecido como uma espécie de vitrine das maravilhas do Rio São Francisco. Por meio dos passeios na embarcação, era possível conferir as belezas do rio. Mas agora é um triste exemplo da dura realidade do manancial, que sofre os efeitos de uma das piores secas da história. Devido à falta de condições de navegabilidade, desde agosto de 2014, os passeios na embarcação, feitos em curso de 15 quilômetros até a foz do Rio das Velhas, em Barra do Guaicuí, foram suspensos.
Um dos trabalhadores do Benjamin Guimarães, Carlos Henrique da Silva Souto, de 61, diz que, além da tristeza de ver o vapor parado, fica muito desolado com a situação em que se encontra o Velho Chico. “O rio está muito baixo.
O marinheiro disse que não apenas pessoas que trabalham em embarcações, como ele, mas todos os moradores ribeirinhos estão chocados com a redução drástica do nível da água no Velho Chico. “Já vi muitas pessoas chorando por causa dessa situação triste do São Francisco. É muito doído a gente ver o rio tão vazio”, reclama Carlos Henrique, que trabalha na bacia há mais de 30 anos.
Cidade desolada sem o turismo
Pirapora – Além do Vapor Benjamin Guimarães, que está atracado pela falta de navegabilidade do Rio São Francisco, outra atração turística de Pirapora está comprometida. Um dos locais mais procurados nesta época do ano é o Balneário das Duchas, abaixo da Ponte Marechal Hermes. A seca transformou a atração turística em um cenário desolado. Nascido em Pirapora, Vermano Gonçalves, de 45 anos, mora em Esmeraldas, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, onde é gerente de fazenda. Nesta semana, ele voltou à terra natal e levou o casal de amigos Celso do Nascimento e Francilene, para conhecer o balneário do Velho Chico.
Vermano conta que levou um susto quando se deparou com as duchas vazias. “Nunca imaginei que fosse ver uma coisa dessa. Para mim, isso é conseqüência da ação do homem, que destrói a natureza e provoca um desastre dessse”, disse o gerente.
Dono de um restaurante próximo ao ponto das duchas, o comerciante Márcio Ribeiro Lessa, de 70, revela que o movimento teve uma redução de 50% neste mês em relação ao mesmo período do ano passado. Márcio disse que sua preocupação maior, no entanto, é com o próprio futuro do Velho Chico. “Como o rio não está cheio, os bares e restaurantes também estão vazios. O problema maior é que não está chovendo na cabeceira do rio. Se não chover logo, vamos viver uma situação terrível”. Na mesma linha, o morador Rubens Lopes Morais completa: “Se continuar baixando, o São Francisco vai ter água somente no canal do lado de Buritizeiro, como se fosse apenas um córrego”.
O prefeito de Pirapora, Heliomar Valle da Silveira (PSB), o Léo Silveira, destaca que a redução do volume do rio “afeta o astral” da cidade. “Pirapora é uma cidade que vive em função do São Francisco. À medida que o volume do rio baixou muito, numa época que deveria estar cheio, a população também sente muito com isso”, comenta Léo Silveira. (LR)
.