O terceiro maior reservatório de abastecimento de água de Belo Horizonte agoniza com a falta de chuva e está perto de chegar ao seu volume morto, que é a porção além da captação. A represa de Serra Azul nunca esteve tão vazia e o lago, que chega a 8,9 quilômetros quadrados de extensão, se resume a filetes de água e empoçamentos contidos num extenso leito de terra trincada. A torre de captação de concreto quase não chega mais ao nível da água e a barragem de 640 metros de largura e 48 metros de altura está totalmente exposta.
A situação preocupa especialistas e moradores do entorno, que temem o racionamento, e por ser um dos lados mais severos da crise de abastecimento que atinge os reservatórios mineiros, levou a nova diretoria da Copasa a determinar ontem que seja feito um amplo diagnóstico do processo de abastecimento de água na Região Metropolitana de Belo Horizonte e no interior de Minas Gerais.
A situação de Serra Azul é tão grave que o chefe do departamento operacional da Região Metropolitana de BH da Copasa, João Andrade, informou ao EM há duas semanas que estão em andamento obras de transposição de água do Rio Paraopeba para tentar um alento à escassez. Contudo, de acordo com Andrade, o volume transposto é pequeno – já que o Paraopeba também enfrenta problemas –, de cerca de um metro cúbico por segundo, que é pouco mais do que o reservatório atualmente fornece.
“As obras estão em andamento e a previsão é de que consigamos levar água do Paraopeba para o Sistema Serra Azul ainda neste semestre. Mas, se a estiagem for ainda mais vigorosa, medidas adicionais precisarão ser adotadas para que não haja falta de água nem sobrecarga nos sistemas”, disse, sem adiantar quais seriam.
O recuo da água de Serra Azul deixou para trás um cenário de desolação. Da terra trincada, com rachaduras tão profundas que cabem um braço, ou dos bancos de areia acumulados, despontam pedras e tocos ainda enraizados no fundo do manancial.
Sem a água, o vale ressecado que apareceu com a estiagem mostra encostas altas, com 40 metros de altura e que chegavam a ficar totalmente submersas. A torre de concreto, que tem mais de 50 metros de altura e avançava 100 metros adentro da represa para captar água próximo ao barramento, está com água praticamente na sua base. Um recuo ainda maior do lago pode obrigar a Copasa a procurar outras técnicas de bombeamento.
Pescadores que concordaram em conversar com a reportagem sem revelar sua identidade, já que a pesca no reservatório de Serra Azul é proibida, afirmam estar impressionados e que o lago nunca esteve tão raso. “Estamos bestas de ver como a barragem secou. Tem tão pouca água que os peixes estão acumulando. São traíras e tilápias grandes quase sem espaço nos poços”, disse um deles, que está desempregado.
Outro pescador, que mora em um bairro próximo a Serra azul, o Canaã, em Juatuba, conta que por vezes a água chega barrenta e amarelada, com gosto ruim. “Deve ser o resto de água que tem no lago, porque da laje da minha casa dá para ver que logo não vai ter mais água para captar”, teme.
CRISE
Para o biólogo Ricardo Mota Pinto Coelho, professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a situação dos reservatórios é de calamidade. Para o especialista, na atual conjuntura, um gabinete de crise deveria ser instituído em Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro. Ele defende “reunir secretários de Saúde, de Agricultura, de Meio Ambiente e traçar estratégias para impedir que a crise afete a produção de alimentos e o abastecimento humano, que são prioritários.”
A reportagem do Estado de Minas requisitou à Copasa reiteradas vezes acesso à represa de Serra Azul, mas a permissão não foi concedida.