A estiagem em plena época de chuvas castiga Minas Gerais. Subiu para 26 o número de municípios que decretaram estado de emergência por causa da seca. Até 26 de dezembro, conforme revelou o Estado de Minas, eram 10 cidades que haviam entrado em emergência depois de novembro. Agora, a estimativa é de que a quantidade vai aumentar, diante da previsão de chuvas insuficientes para os próximos dias. Enquanto isso, a população sofre com a falta de água e muitos prejuízos. A última cidade a solicitar ajuda estadual e federal para enfrentar a seca foi Viçosa, na Zona da Mata. Na terça-feira, além da situação de emergência, o município de 72 mil habitantes retomou o racionamento de água e vai multar quem desperdiçar.
O Serviço Autônomo de Água e Esgoto (Saae) de Viçosa voltou a adotar medidas drásticas.
A prefeitura também proibiu, durante o período crítico da estiagem, o uso de água fornecida pelo serviço público para lavagem de carros em postos de combustíveis e lava a jato. Os estabelecimentos que desobedecerem serão multados. Moradores e comerciantes estão proibidos também de regar jardins e plantas, encher ou esvaziar piscinas, lavar quintais, telhados, paredes, calhas, garagens e veículos.
A Prefeitura de Viçosa impôs o racionamento por causa do baixo volume da represa do Ribeirão São Bartolomeu, que abastece 70% da população local. Em condições normais nesta época do ano, a vazão do São Bartolomeu deveria ser de 300 litros por segundo, mas, ontem, era de apenas 40 litros por segundo, obrigando o Saae a reduzir em mais da metade o volume captado para o abastecimento da cidade, que era de 100 litros por segundo.
Ainda por conta da estiagem, o município já enfrentou o racionamento entre outubro e o início de dezembro de 2014. Agora, a prefeitura dividiu a cidade em seis regiões. De segunda-feira a sábado, uma das regiões não recebe água – neste caso, somente no domingo, o fornecimento atende todo o município.
PREJUÍZO Outra cidade que decretou emergência por causa da seca é Brasília de Minas, no Norte do estado. O Rio Paracatu, onde é feita a captação de grande parte da água consumida pela população, “cortou” (teve o curso interrompido). A situação não é mais crítica por causa do uso de poços tubulares para o abastecimento de parte do município.
“Mas, se a seca continuar, vai faltar água na cidade”, afirma o secretário de Agricultura e Meio Ambiente, Marcos Paiva Queiroz, lembrando que cerca de 80 famílias da zona rural do município estão sendo atendidas por caminhão-pipa. Por causa do sol forte, 100% das lavouras de milho e feijão de Brasília de Minas estão praticamente perdidas, quadro que se repete em quase todo Norte de Minas.
O secretário disse que é a primeira vez que a cidade entra em estado de emergência em janeiro por causa da seca.
Montes Claros, também no Norte de Minas, está em emergência desde 16 de dezembro, por causa dos danos provocados pela estiagem prolongada na zona rural do município, onde lavouras foram destruídas e quase todos os rios e córregos secaram. Pequenos agricultores dependem de caminhão-pipa. Segundo o coordenador de Defesa Civil do Município, de outubro até agora, choveu 276,6 milimetros no município, enquanto o volume aguardado para o período era de 700 milímetros.
O sol impiedoso destrói plantações e tira o dono de pequenos agricultores, como Geraldo Rocha Zuba, de 52 anos, pai de cinco filhos, morador da comunidade rural de Me Livre. Ele plantou milho, feijão e mandioca e“nada vingou”. “O calor é de matar. Os animais estão magros e se Deus não tiver piedade, nem sei o que será de nós”, diz. Mas ele não perde a esperança.
Morador da mesma comunidade, o agricultor José Geraldo Dias, de 58, pai de três filhos, confessa que, ao longo da vida, nunca viu uma seca “tão braba”. Enfrentar uma estiagem em pleno período que seria chuvoso o faz pensar no “fim dos tempos”. “Nunca vi isso na vida.
EMERGÊNCIA
Vinte e seis municípios mineiros já decretaram situação de emergência por causa da estiagem desde novembro de 2014
Berizal
Bonito de Minas
Brasília de Minas
Carmo de Minas
Coração de Jesus
Francisco Badaró
Francisco Dumont
Gameleiras
Guaraciama
Japonvar
Jequitibá
Jordânia
Josenópolis
Juvenília
Monte Formoso
Montes Claros
Novo Cruzeiro
Pirapora
Ponto dos Volantes
Santa Maria do Salto
São João das Missões
São João da Ponte
São João do Pacuí
Setubinha
Riachinho
Viçosa
País já tem 937 municípios em emergência
Brasília – A cada dia que não chove, a crise hídrica ganha corpo pelo país, afetando a vida da população, das empresas e da já abalada economia brasileira. Neste ano, 37 municípios tiveram o estado de emergência por seca reconhecido pelo governo federal, 36 só ontem em Alagoas, totalizando 937 no país, segundo o Ministério da Integração, que admite também que há muitos pedidos de emergência em análise.
A maioria dos prefeitos não declara racionamento por questões políticas, dizem especialistas. A Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp), por exemplo, informou que não há racionamento nos 364 municípios que opera. O que existe é um problema de abastecimento causado pelas “altas temperaturas e consequente aumento de consumo”, que reduziram o nível dos principais reservatórios.
A crise hídrica é um problema não apenas do Brasil. Ela é o primeiro item no ranking de riscos globais de 2015, segundo o Fórum Econômico Mundial. Como os dados são muito dispersos, especialistas têm dificuldade para calcular o impacto do racionamento de água na economia. No entanto, há um consenso de que as perdas não são pequenas no país. “Sabe-se que o racionamento vai afetar o PIB da agricultura e o da indústria, mas existem outros fatores concorrendo também porque a economia já está fraca”, explica a professora da Escola de Administração Pública da Fundação Getulio Vargas (FGV/EBAPE) Marilene Ramos.
“A crise está se agravando e pode levar muitas empresas a reduzirem suas atividades por falta de água. Mas há um lado positivo nisso tudo que é o aumento da busca de alternativas, como o reuso e a conscientização das pessoas de que a água tratada é um bem caro e não é abundante”, destacou.
O economista Silvio Campos Neto, da consultoria Tendências, faz umas estimativas para o racionamento da energia. Ele avalia que um corte de 10% da carga poderá impactar em -0,8 ponto percentual do PIB, passando para -1,3 pp se esse racionamento for de 15%. Ou seja, a perda para o país poderá oscilar entre R$ 44 bilhões e R$ 77 bilhões, dependendo do tamanho do ajuste. (Rosana Hessel e Bárbara Nascimento)
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