Jornal Estado de Minas

Rio do Peixe sofre com estiagem e captação de mineradoras

Rio avaliado pela Copasa para coleta de água para a região metropolitana sofre com a estiagem prolongada e já tem afluentes usados por mineradora para alimentar usinas

Jorge Macedo - especial para o EM
Mateus Parreiras

Seca praticamente acabou com a barragem Lagoa das Codornas, que pertence ao Sistema Rio das Velhas, às margens da BR-356, na Grande BH, e desvendou um muro de pedra de fazendas que foram inundadas - Foto: Beto Novaes/EM/D.A Press

Um manancial avaliado pela Copasa para reforçar o abastecimento de água no Sistema Rio das Velhas é um rio combalido, com tamanho de córrego por causa da seca e de grandes captações de mineradoras, o que gera um impasse para ser usado como nova fonte de abastecimento. Em 23 de janeiro, o governador Fernando Pimentel anunciou um estudo do plano diretor da Copasa para fazer barragem no Rio das Velhas. Mas fontes ligadas à empresa informaram ontem ao Estado de Minas que o barramento será no Rio do Peixe, manancial cujo nome não lhe faz jus, já que quase não existe mais pescado nos 10,8 quilômetros do afluente do Rio das Velhas, entre Nova Lima e Rio Acima. Boa parte da água e dos seus principais afluentes, os ribeirões Capitão da Mata e Congonhas dos Marinhos, foi encanada em conexões metálicas e alimentam as sete usinas da mineradora AngloGold Ashanti, no Complexo do Rio do Peixe. Essa água, inclusive, chegou a ser  requisitada pela Copasa.

Em 20 de outubro, a companhia negociou com a mineradora a liberação de 500 litros por segundo do Rio do Peixe, o que representou 3,5% do volume captado pela distribuidora, acordo cancelado com a volta da chuva. O plano diretor identificoum a área antes da foz do rio como ponto estratégico para construção de um reservatório de captação para a Grande BH, capaz de fornecer até 3 mil litros/s.

O Rio do Peixe nasce no encontro do Ribeirão Capitão da Mata, que corre por 5,86km depois da Lagoa do Miguelão, com o Ribeirão Congonhas dos Marinhos, que se estende por 4,44km desde a Lagoa das Codornas. Um nascimento modesto dentro do território da AngloGold, em Rio Acima, pouco depois do alojamento chamado “Vila A”, antes da Usina Hidrelétrica G.

Os dois córregos chegam em cursos reduzidos, que são acompanhados por grandes tubulações metálicas, onde um volume muito superior de água é transportado entre as usinas. “Mais de 90% do rio está dentro do cano”, disse um dos engenheiros que trabalhava no local na última semana.

“São outorgas monstruosas como essas que precisam ser revistas e que realmente tiram a vazão do Rio das Velhas. As mineradoras contribuíram para essa seca, principalmente porque precisam bombear noite e dia a água subterrânea que as impede de retirar o minério das profundezas. Várias nascentes secaram depois que as águas do subterrâneo foram retiradas. Eram nascentes que abasteciam a bacia do Peixe”, afirma o fundador do Projeto Manuelzão, Apolo Heringer Lisboa.

Rachado

As atividades de empreendimentos já secaram por completo uma das barragens, a Lagoa das Codornas, às margens da BR-356. O reservatório foi construído em 1905 pela Saint John Del Rey Mining Company, antecessora da Morro Velho e hoje AngloGold Ashanti, e serve justamente para regularizar a vazão de água para as usinas que fornecem grande parte da eletricidade usada pela extração minerária. O solo do leito está trincado. A seca expôs até um complexo de muros antigos de pedras, resquícios de fazendas seculares inundadas.

MUnicípios que abrigam as maiores jazidas cobrarão das mineradoras planos de revisão e redução do uso da água. O assunto será discutido na semana que vem pela Associação dos Municípios Mineradores de Minas Gerais em BH.  “As mineradoras têm de reavaliar o seu consumo, informar os volumes e a forma de captação nos mananciais hídricos e definir uma proposta conjunta nas cidades para redução do uso da água”, afirma Celso Cota, presidente da entidade.

A Copasa não comenta o estudo para o Rio do Peixe, alegando que ele faz parte do plano de definição das captações para a Grande BH até 2050. A AngloGold Ashanti informou, por meio de nota, que as tubulações são necessárias para energia elétrica e que atende as exigências ambientais. “Ao longo do sistema, existem cursos da água preservados de acordo com a outorga para uso do sistema”, diz a nota. Os trechos de tubulações são considerados “pequenos” pela empresa, que afirma ainda que a água retorna para o Velhas. A AngloGold credita à falta de chuva a seca das barragens.

Ainda segundo a empresa, a Lagoa das Codornas está com 30% de seu nível normal. (Com Marta Vieira)

Força-tarefa

A primeira reunião da força-tarefa formada por 11 órgãos para gerenciar ações que garantam o abastecimento de água na Grande BH, realizada ontem, marcou para o segunda-feira o prazo para apresentação de projetos e estudos. Uma das novidades é que as 40 equipes da Copasa que sairão às ruas para encontrar vazamentos na rede  serão identificadas por coletes especiais e adesivos nos carros, para diferenciá-las dos demais funcionários da companhia, fazendo deles uma referência para denúncias e informações. A força-tarefa deverá enviar ao governador, em 180 dias, o relatório final com as recomendações.

- Foto: Arte EM

 

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