Jornal Estado de Minas

Beijar, pode. Sem forçar a amizade

Blocos de rua em BH são contra atitudes sexistas e machistas no carnaval

Sandra Kiefer - Especial para o EM

Blocos de rua de Belo Horizonte se preocupam em garantir a festa e a azaração, mas sem desrespeito, sexismo ou homofobia - Foto: Ramon Lisboa/EM/D.A Press

“Carnaval de BH é gostoso demais, né? Que coisa molhada, todo esse hormônio, ‘todxs essxs gatxs gostosxs’, todo esse encaixe, esse tchan que a gente construiu pra nossa cidade nos últimos anos com muita festa e muita luta...” Nesse post do Tchanzinho da Zona Norte, bloco de rua fundado na capital em 2013 inspirado em bandas de axé dos anos 1980 e 1990, como o É o Tchan, é possível perceber que o carnaval de Belo Horizonte se propõe a ser diferente do de outras capitais. Nas bandas de cá, os organizadores dos blocos de rua avisam que não serão bem aceitas atitudes tidas como sexistas ou machistas, nem tampouco descuidadas em relação ao meio ambiente. “Beijo roubado no carnaval não é inocente e nem vale por dois. Vale é cadeia”, avisa Renata Chamilet, produtora do Baianas Ozadas, que se tornou um dos maiores blocos de rua da cidade.

Nascido como um movimento de ocupação do espaço público, com os mesmos jovens politizados que foram às ruas protestar contra o aumento das passagens de ônibus, os blocos de rua de BH e seus organizadores se preocupam com o lado lúdico do carnaval da cidade, mas desde que haja respeito garantido a todos. “Com o aumento de foliões vindos de fora, estamos com o radar ligado. Será que esse pessoal está vindo para BH com a mesma energia boa de respeitar o bem maior, que são as pessoas participando da festa?”, questiona Renata. Segundo a produtora, a galera mineira é mais comedida, até pelo fato de o carnaval de BH ser em ritmo de matinê, devido ao horário imposto pela administração municipal.


No último fim de semana, tornou-se assunto dos mais comentados na internet a enquete feita por um site de Salvador, na Bahia, na qual se perguntava se “o beijo forçado no carnaval deve ser proibido”. A obviedade da proibição do gesto se tornou alvo de críticas dos jovens em todo o país. “Está incutido culturalmente que o carnaval é um momento de colocar as fantasias para fora e de se permitir um pouco mais. Não há problema algum nisso. Vamos beijar muito, mas com consentimento do outro. Em 2015, é totalmente descabido até conceber a ideia do beijo forçado”, frisa Renata.

No Tchanzinho da Zona Norte, os integrantes do bloco combinaram entre si, durante os ensaios, que haverá “esculacho” público para foliões com comportamentos inadequados, como atitudes homofóbicas. “Não sei se as campanhas deram certo, mas não tivemos qualquer problema nos ensaios”, diz o músico Rodrigo Heringer Costa, regente do bloco, que não chegou a fazer uso da tática de ridicularizar o folião que destoasse do restante. Ao tratar da festa, em vez de usar o artigo masculino ou feminino, o “x” deixa claro que a folia inclui o público LGBT. “Só vamos saber no dia o que vai acontecer. O ideal é que nosso carnaval mais politizado aumente de tamanho e que essa questão ajude a politizar mais jovens de outros lugares de Minas e do Brasil”, completa Rodrigo.

No Então, Brilha!, o regente e coordenador Cristiano Di Souza, de 25 anos, faz um único pedido: “Vou exigir responsabilidade prazerosa e que não se exclua ninguém da festa. Todo mundo tem direito de participar”. Segundo ele, o bloco nascido no baixo Centro, na Rua Guaicurus, sequer tem cordão de isolamento.
“Nosso cordão é o do amor. Temos um grupo de pessoas de braços dados que se oferece para proteger a bateria. Do meu ponto de vista, é representativo da forma como o bloco foi constituído, como uma construção coletiva. Acredito que as pessoas que estão vindo de fora vão entender a energia da nossa festa, que tem como lema o brilho”, diz. (SK)

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