O atropelamento de um cabo da Polícia Militar, arrastado por 10 metros por um motociclista que furou uma blitz de trânsito na Região de Venda Nova e a queda de uma caminhonete de uma altura de cerca de seis metros, do Anel Rodoviário sobre um táxi na Avenida Antônio Carlos, no Bairro São Francisco, Região da Pampulha, chamam a atenção para um comportamento de risco que tem aumentado em Belo Horizonte. Motoristas sem habilitação são flagrados cada vez com mais frequência conduzindo veículos na capital. Foi esse o caso nos dois acidentes, registrados na quinta-feira. No episódio envolvendo o militar, o motoqueiro Saulo da Silva Santos, de 21 anos, foi preso depois de tentar fugir da operação policial, por não ter carteira de motorista. Dias antes ele já havia sido detido por pilotar sem permissão. O motorista da caminhonete que despencou do Anel estava em situação semelhante: Leandro Figueiredo de Caires, de 23, alegou ter sido fechado por uma van. Como eles, no ano passado, 11.825 condutores foram multados por dirigir sem carteira na capital, número 7% maior do que o registrado em 2013. Além disso, tem aumentado proporcionalmente a participação de inabilitados em acidentes em vias como o Anel, onde, de todos os 5.472 envolvidos em ocorrências no ano passado, 72 não tinham habilitação.
No Anel Rodoviário, a situação pode ser ainda pior, segundo o tenente Geraldo Donizete, comandante do policiamento na rodovia, por onde passam diariamente cerca de 140 mil veículos. “O Anel já tem seus complicadores, que são a quantidade de veículos e os gargalos estruturais. Aquele motorista sem o conhecimento necessário está mais suscetível a ter problemas em um ambiente como esse”, diz o militar. O presidente do Sindicato dos Taxistas, Ricardo Faedda, condena a conduta de quem dirige sem permissão oficial. “Mesmo os motoristas habilitados enfrentam dificuldade no Anel, devido à mistura de características rodoviárias com trechos urbanos. Se para muitos com carteira já é difícil, imagina para quem se arrisca sem habilitação. É uma conduta que deveria ser criminalizada”, afirma o motorista profissional.
Na madrugada de 16 de abril do ano passado, o Anel foi palco de uma tragédia envolvendo um condutor sem carteira. O motorista Anderson Dias Gonzaga, de 35, invadiu com um Chevrolet Corsa um canteiro de obras demarcado por cones e atingiu em cheio a carroceria de uma carreta que estava estacionada, na altura do Bairro Olhos D’Água, Região Oeste da capital. Anderson morreu na hora. O desastre poderia ter sido ainda mais grave, já que muitos operários trabalhavam no recapeamento da via. Eles conseguiram escapar, mas a batida foi tão forte que o corpo do condutor precisou ser removido do veículo com ajuda de serras e equipamentos desencarceradores do Corpo de Bombeiros.
Outro complicador que autoridades e especialistas apontam nesse cenário é a punição branda para quem dirige sem a qualificação comprovada pelos órgãos de trânsito. No Brasil, o Código de Trânsito Brasileiro (CTB) prevê multa para quem for flagrado nessa situação. Também está prevista a apreensão do carro, só liberado mediante apresentação de alguém habilitado. Aquele que ceder o veículo a alguém sem carteira, também está sujeito a punições semelhantes. Porém, muitas vezes a multa nem chega ao condutor inabilitado, já que a infração acaba atrelada ao veículo e quem arca com o débito é o proprietário. “Acho que é necessário uma evolução nessa punição. Com medidas mais rígidas, certamente as pessoas iriam pensar duas vezes antes de dirigir sem carteira”, diz o tenente Waldomiro Mendes Ferreira, do setor operacional do Batalhão de Polícia Militar Rodoviária (BPMRv).
A delegada Cláudia Edna Calhau de Castro e Andrade, do Departamento Estadual de Trânsito de Minas Gerais (Detran-MG), concorda com a necessidade de penalidade mais rígida para aqueles que dirigem sem CNH. Mas ela alerta que, em caso de crime, o inabilitado responderá, independentemente das responsabilidades administrativas previstas no Código de Trânsito. “A consequência (da presença de inabilitados) para o trânsito e para a segurança é o aumento de infrações e acidentes constatados no estado. Quem está nessa situação não passou pelo treinamento devido e necessário. Por isso, todos aqueles que decidirem conduzir um veículo devem ter consciência da necessidade, e mais do que isso, da obrigatoriedade de ter a CNH”, afirma a delegada.
SOCORRO No acidente registrado na quinta-feira no Anel Rodoviário, tanto o condutor da caminhonete que caiu sobre a Avenida Antônio Carlos quanto o taxista André Damião de Oliveira Santos, de 26, motorista do veículo atingido, foram socorridos no Hospital de Pronto-Socorro João XXIII (HPS), onde permaneciam ontem em observação. Já o cabo da PM atropelado pelo motociclista sofreu fraturas nas duas pernas e em um dos dedos da mão, além de várias escoriações. O PM, Lúcio Cantelmo, também foi socorrido no HPS. A assessoria da unidade informou que, devido às fraturas nas pernas, o militar passou por cirurgia e segue internado no centro de tratamento intensivo (CTI), mas seu quadro é estável e ele não corre risco de morrer.
O motociclista Saulo da Silva também precisou de atendimento médico, já que na queda com a motocicleta sofreu escoriações nas pernas e braços. Segundo o sargento José Geraldo Rodrigues, do 49º Batalhão da PM, o motociclista pilotava uma Honda CB 300. “Ele se aproximou em alta velocidade, na contramão da via e empinando a moto. Ao chegar perto da equipe, desobedeceu a ordem de parada e passou acelerando, atingido o militar”, informou. “Em dezembro, esse rapaz atropelou uma criança de 6 anos, na porta de uma escola do Bairro Nova Pampulha, em Vespasiano. A vítima sofreu fraturas e escoriações nas pernas e no braço. Cinco dias atrás, ele havia sido abordado em outra blitz, pilotando sem carteira”, disse o militar.