Jornal Estado de Minas

Vandalismo, drogas e som alto voltam a atormentar o Bairro Mangabeiras

Depois de meses de trégua, moradores denunciam o retorno de arruaceiros ao cartão-postal de BH. Uso de drogas, som no último volume e pegas tiram o sono de vizinhos da Serra do Curral

Landercy Hemerson Paula Carolina
Apesar da recente troca de iluminação, várias lâmpadas já estão queimadas - Foto: Marcos Vieira/EM/DA Press


O que era bom durou apenas cinco meses para os moradores da Praça do Papa e da Avenida Agulhas Negras, no Bairro Mangabeiras, Região Centro-Sul de Belo Horizonte. O vandalismo, o tráfico e o uso de drogas, as festas barulhentas e os pegas, entre outros abusos que durante anos atormentaram a vizinhança até altas horas da madrugada, voltaram a ser um pesadelo. Desde dezembro, a partir das 22h de sexta-feira, o tão esperado fim de semana de quem mora diante da Serra do Curral, um dos cartões-postais de Belo Horizonte, se transforma em tormento. Até por volta das 3h da madrugada, motoristas e motociclistas abusam da velocidade, disputando corridas, muitos com os escapamentos adulterados para produzir ainda mais barulho. Eles fazem arrancadas cantando pneus, andam na contramão e executam outras manobras perigosas. “Querem adrenalina, mas se esquecem de que a avenida fica em um vale e que o barulho ecoa dentro das casas”, reclama o vice-presidente da associação dos moradores, o engenheiro de produção Sílvio André de Oliveira.


Na última sexta-feira, vizinhos da praça tiveram uma trégua, depois de temporal que atingiu a cidade e inibiu a ida de arruaceiros ao local. Outro fator que contribuiu para o clima mais tranquilo foi uma blitz da Polícia Militar, com uso de bafômetro, que teve entre os principais alvos os carros com sistema de som de alta potência. Sílvio André comemorou a operação policial, que, segundo disse, não ocorria desde o carnaval.

O engenheiro afirma que, durante o feriado, havia veículos com o som ligado no último volume até o dia amanhecer, em total desrespeito à Lei do Silêncio, e até quem mora distante da praça tinha a sensação de que a festa era dentro de casa. “Já medi o barulho da minha varanda e chegou aos 110 decibéis. É uma agressão absurda aos ouvidos, com danos irreparáveis à saúde. Há perda de sono, dor de ouvido constante e elevação da pressão arterial. Sem falar do desconforto causado aos animais, tanto domésticos quanto silvestres”, denuncia.

Na sexta houve blitz, mas vizinhança diz que basta a polícia virar as costas para que abusos recomecem - Foto: Marcos Vieira/EM/DA Press

Mas os abusos não ocorrem apenas à noite. Na tarde do último sábado, enquanto famílias faziam piquenique e crianças brincavam, carros com som em nível ensurdecedor contribuíam para quebrar o silêncio de uma tarde aparentemente tranquila. Estacionado em um dos pontos da praça, um Fiat Palio exibia no porta-malas toda a potência do seu equipamento. De longe, o motorista, acompanhado da esposa e com um bebê de colo, comandava a música por controle remoto. Coincidência ou não, desligava sempre que uma viatura da Polícia Militar ou da Guarda Municipal se aproximava. Em seguida, ligava novamente.

Veja flagras de abuso no Mangabeiras

 


A prática não é novidade. A Associação do Magabeiras cobra a presença da PM de forma mais permanente na Praça do Papa, especialmente à noite, extamente para abordar donos dos carros de som, motoristas e pilotos de motos barulhentas, pois, no caso de rondas eventuais, eles disfarçam apenas na presença da polícia. Em 11 de janeiro, o vice-presidente da Associação do Mangabeiras disse ter enviado pedido de audiência à Regional Centro-Sul da Prefeitura de BH, propondo a instalação imediata de lombada eletrônica e radar na avenida, para inibir abusos de velocidade e os riscos de acidente.

Vândalos deixam marcas em pichações nos muros do entorno da praça - Foto: Beto Novaes/EM/DA Press

A associação também solicitou a instalação de câmeras do Sistema Olho Vivo no final da Avenida Agulhas Negras e no início da praça, para identificação das placas dos carros mesmo quando a PM não estiver presente. Outro incômodo, segundo os moradores, é o barulho dos drift trikes, triciclos feitos em aço, com rodas de bike e kart, e carrinhos de rolimã.

“Parece barulho de turbina de avião. Os triciclos e carrinhos sobem a avenida rebocados por carros de passeio, com cordas e de outras formas irregulares e perigosas. Depois, descem em alta velocidade”, denuncia Sílvio André. Quem se arrisca também no entorno da praça são os skatistas, que muitas vezes cruzam a frente dos carros indiferentes ao perigo, como testemunhou a equipe do Estado de Minas no sábado.

Motoqueiros também são denunciados por excessos, inclusive devido ao barulho de escapamentos alterados - Foto: Beto Novaes/EM/DA Press

Abusos e sujeira O bancário aposentado Wilson Ferreira, de 89 anos, mora na Praça do Papa há 32 e conta que nunca houve tanto barulho como agora. “Aqui, dá 4h da manhã e a gente não consegue dormir. Minha nora mora do outro lado da praça, mais perto do barulho, e já chegou a telefonar oito vezes para a PM numa madrugada só, e ninguém apareceu”, reclama. Pela manhã, segundo Wilson Ferreira, o resultado da farra é uma enorme sujeira, com preservativos usados, garrafas e latas vazias espalhados.

Filha dele, a médica Denise Cristina Ferreira, de 47, conta que sai de casa às 5h para trabalhar em Contagem, na Grande BH, e que muitas vezes vê o dia amanhecer sem conseguir dormir. “O barulho é muito alto. A praça parece uma concha acústica e o som ecoa dentro das nossas casas. Tocam um funk da pesada e tem um grupo que ensaia tambor”, queixa-se.
Segundo ela, já houve casos de vândalos tentarem invadir casas, pulando as grades. Foi em uma festa organizada pelas redes sociais, segundo Denise. “Já teve dia em que eu não consegui sair de casa para buscar minha filha em uma festa de aniversário”, conta a médica. “Eles usam drogas e soltam a voz. Gritam tão alto de madrugada que a gente pensa que alguém está sendo violentado”, comentou.

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